Uma curiosidade. Posse de bola no Atlético de Madrid - Barcelona: 29%-71%. Resultado final: 2-0. Apurado o Atlético. Posse de bola no Benfica - Bayern: 32%-68%. Resultado final: 2-2. Apurado o Bayern. Uma grande equipa europeia não precisa de ter sempre a bola. Precisa de jogar MUITO BEM, quando defende e ataca. Não foi o caso do Benfica contra os alemães.

Apesar de ter sido eliminado, o Benfica acabou o jogo de quarta-feira, na Luz, frente ao Bayern, sob uma forte ovação vinda das bancadas. Antes, os adeptos já tinham comemorado o golo de Talisca como se se tivesse tratado da passagem às meias-finais. Percebe-se. Os jogadores deram o litro, o adversário era uma das melhores equipas do universo e arredores, o Benfica não foi esmagado – como os vizinhos da Segunda Circular ou os grandes rivais do Norte, e sabemos como isso, quando se sonha pequeno, já é uma vitória – e os adeptos o que querem é mesmo o tri.

O Benfica caiu, portanto, com honra e de cabeça erguida. Mas isso é uma coisa. Outra é pôr nos píncaros uma equipa que, na realidade, nunca discutiu verdadeiramente a eliminatória com os bávaros. Vimos, ouvimos e lemos coisas de bradar aos céus. Rui Vitória: “Recordámos grandes noites europeias!” A Bola: “Foi um admirável adeus!” Record: “Águia foi gigante e fez tremer o colosso bávaro!”. Todos juntos: “Eliminatória equilibrada!”.

Enfim, são as habituais excitações de jornais e adeptos – e sabemos como os jornais, em concreto, com a crise que grassa nos media, desesperam cada vez mais por vender papel. Mas, convenhamos, conseguir não perder por muitos com o Bayern é bom mas não chega para dizer que o Benfica foi gigante. Lamentavelmente, não foi. Os alemães tiveram a eliminatória controlada do primeiro ao último minuto. O Benfica apenas fez cócegas aos comandados de Pep Guardiola. Na verdade, a eliminatória ficou resolvida ainda antes do intervalo do jogo na Luz, quando Arturo Vidal fez o empate. E portanto não houve “eliminatória equilibrada”, nem discussão “em cada palmo de terreno”, nem “luta olhos nos olhos”. Tudo conversa.

Os factos. Entre a oportunidade falhada por Jiménez, que daria o 2-0, aos 30 minutos, e o golo de Talisca, aos 76, o Benfica não fez nada. Zero. Houve um disparo do meio da rua de André Almeida e foi tudo. Foram quarenta e tal minutos a ver o Bayern a trocar a bola e a dar a volta ao resultado. Muito pouco para se poder falar na “dimensão enorme deste Benfica”, como disse Rui Vitória. Depois do empate, a equipa estrebuchou, mas numa altura em que os alemães praticamente tinham “fechado a loja”, e já ninguém, em boa verdade, acreditava no sonho de seguir em frente.

Mais. Uma equipa “enorme”, “gigante”, não sofre golos como aqueles que vimos na Luz. Mesmo (ou sobretudo) contra o Bayern. Vidal fez o empate da mesma maneira que Pedro Nuno marcou, pela Académica, em Coimbra. Solto de marcação, à entrada da área, com Renato a ver. E Müller fez o 2-1 com a defesa inteira a dormir. Ninguém saltou, ninguém se mexeu.

Compare-se agora com aquilo que o Atlético de Madrid foi capaz de fazer diante do Barcelona. A equipa de Simeone teve ainda menos bola, no Vicente Calderón, do que o Benfica na Luz. Mas os “colchoneros”, eles sim, foram “gigantes”. “Enormes” quando tiveram a bola e nos largos períodos em que não a tiveram. Os catalães acabaram com 71% de posse de bola, mas fizeram o primeiro remate à baliza só depois dos 40 minutos. O Atlético fez mais remates e teve mais ocasiões de golo. Quem viu o resumo, parecia que “só tinha dado” Atlético. Isso é uma equipa “enorme”.

Dirão alguns, em defesa da “dimensão europeia” deste Benfica: Rui Vitória já foi este ano capaz de vencer no Vicente Calderón. E muito bem! Mas aí teve um grande Gaitán, um futebolista que seria absolutamente fundamental que tivesse chegado fisicamente bem a esta eliminatória, para o Benfica poder efetivamente sonhar, e não apenas “sonhar” nas capas dos jornais. Acontece que Rui Vitória não salvaguardou a condição física de Gaitán para a eliminatória com o Bayern. Não quis facilitar, não o dispensou dos últimos jogos para o campeonato, e o argentino estoirou.

As opções de Vitória são respeitáveis. Claro que a prioridade – até porque os adeptos assim o exigem – é garantir o título de tri-campeão nacional, ainda mais nas circunstâncias em que a Liga tem sido disputada, com toda a polémica à volta de Jesus e de Bruno de Carvalho. Mas encher o peito para quê? Para vender jornais, sim. Para motivar, ok. Para nos sentirmos melhor na derrota, sim senhor. No entanto, a realidade é que o Benfica não foi gigante e não mostrou dimensão europeia contra o Bayern. Correr muito atrás da bola e deixar a vida em campo nos 90 minutos não chega para dizer que uma equipa foi enorme e que houve equilíbrio na eliminatória.

Na verdade, foi fácil demais para os bávaros. Se houve ocasiões em que o Benfica disputou realmente até ao último minuto uns quartos-de-final da Champions não foi esta. Foi em 2006, quando uma equipa muito bem trabalhada defensivamente por Ronald Koeman quase eliminava o Barcelona em Camp Nou. E foi em 2012, quando o Benfica de Jorge Jesus esteve muito perto de chegar às meias-finais e a jogar toda a segunda parte com dez contra o Chelsea, em Londres. Este Benfica, que defrontou o Bayern, limitou-se a ser um Benfica lutador. O que, sendo apreciável – ainda mais se pensarmos nas baixas expetativas relativamente a Rui Vitória, no início da época –, é pouco para embandeirar em arco na Europa.

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