A rejeição

Quem é o outro? Quem é esse outro que tem uma cor de pele diferente da minha? Que pessoa é essa que pensa de modo diferente do meu? Que estranho é esse que venera um Deus que desconheço? Que ser é esse que sente o que eu não sinto? Quero entender o que ele é ou ficar seguro apenas no que eu sou?

Na nossa sociedade actual, a ideia do "homo economicus" parece ter superado todas as outras que constituem a diversidade daquilo que faz a dimensão humana. Caímos num quase absoluto individualismo. Pensa-se sobretudo no próprio interesse ou no interesse de grupo. É a herança do capitalismo liberal e da sua fórmula simplista que faz corresponder o aumento do bem-estar individual e colectivo ao simples aumento do PIB (Produto Interno Bruto).

A maior parte das vezes, a disponibilidade para olhar para o outro, viva ele em África, no Médio Oriente ou na América latina, é apenas numa perspectiva utilitária, isto é, em proveito próprio. Seja para explorar as suas riquezas ou para explorar o seu trabalho.

O egocentrismo faz parte dos traços que constituem o ser humano. Tanto como o altruísmo. Mas esta faceta, o estar disponível para o outro, é pouco, quase nada estimulada. E assim se chega ao paradoxo actual nos EUA, um país onde a maioria da população é estrangeira, porque de origem outra que não local. Ou em França, país que desde o final do século dezanove precisou do contributo de outros, de muita e variada imigração (e foram até mais os imigrantes de diversas origens que reconstruíram o país após a segunda guerra mundial do que propriamente os chamados franceses de origem).

Hoje, há quem pretenda falar em nome do povo, seja ele francês ou norte-americano, como se esse povo não fosse essa amálgama de gente de diversas origens. 

Talvez um dia se perceba que somos todos pretos, brancos, amarelos ou mistos; que somos todos hindus, cristãos, judeus, muçulmanos ou ateus; que somos todos homossexuais, heterossexuais ou transsexuais. Talvez um dia se perceba que "restringir o nosso egoísmo e libertar os nossos sentimentos à benevolência constitui a perfeição da natureza humana", como escreveu - pasme-se ( e sim, estamos cheios de preconceitos) - Adam Smith. 

Afinal, somos todos... o outro.

pub