Causas e consequências

A bomba explode. É o início do horror, o tempo da carnificina, dos corpos inertes, dos gemidos... E em minutos, a reacção, a luta pela vida: sirenes, hospitais... Procura-se ordenar o caos. Em simulâneo, a caça ao homem, aos homens... Há notícias em catadupa, o frenesim de tentar compreender o incompreensível. E chega então a dor colectiva. Até ao próximo atentado.

Reage-se aos efeitos do terrorismo. Há palavras tensas, declarações de intenção. É preciso "penas mais duras", diz o primeiro -ministro francês. É preciso "usar a tortura", diz um candidato à presidência dos Estados Unidos da América. E as palavras ficarão suspensas... Até ao próximo atentado.

Nos últimos quatro meses, Europa, Ásia, África e América foram alvo de atentados. Morreram mais de quinhentas pessoas. Os autores foram "AlQaeda", "Estado Islâmico", "Al Shabab", "Boko Haram". Em comum a mesma ideologia, a mesma matriz: islão sunita. Sabe-se que nos últimos anos grandes doadores individuais e organizações humanitárias sauditas têm sido financiadores dessas e outras organizações radicais e terroristas. Sabe-se que nas últimas décadas o reino tem usado os seus recursos para financiar escolas, mesquitas, orfanatos. E em todos eles se ensina esse mesmo Islão extremo, uma prática rigorosa da religião.

Mas continuamos a premiar quem nos vende o petróleo, quem nos compra armas, quem sabe usar o poder da sua riqueza para "comprar" o nosso silêncio face às execuções, à ausência de democracia, à ausência de liberdade, à ausência de um mínimo de dignidade para a mulher, à ausência de mínimos no respeito pelos direitos humanos. Sinal destes tempos, o ministro do interior saudita recebeu há dias a "Legião de Honra", atribuída pela presidência francesa.

É evidente que não podemos escamotear outras causas para o terrorismo com a marca do Islão sunita. E também por culpa nossa. Abandonamos partes das nossas cidades ao comunitarismo, criamos amálgamas por causa de um nome, por causa de um apelido. E deixamos que as nossas prisões se tornem lugar de proselitismo. Merah, Kouachi, Coulibaly, el-Bakraoui, todos eles com uma maior ou menor ligação ao banditismo, descobriram na prisão uma espécie de redenção através do terrorismo jihadista. E dele se tornaram "mártires".

Mas há mais, e no campo da segurança. Escutamos tudo e todos mas somos incapazes de tratar todos esses oceanos de dados. Com trabalho muitos atentados têm sido evitados, mas casos houve de pura sorte. Foi assim no ataque falhado a uma igreja em França, em Abril do ano passado. Ou nesse outro cenário de massacre em curso num comboio de alta-velocidade entre Amsterdão e a capital francesa, meses mais tarde. É uma guerra. Até ao próximo atentado.

Mas nesta guerra nada se compara à nossa complacência quando está em jogo o poder que apenas o dinheiro consegue ter. E assim vai ser. Até ao próximo atentado.

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