Orgulhosamente sós

Numa das últimas conferências de imprensa, antes do final da Liga, lamentava-se Jorge Jesus que 80 pontos chegariam, noutros tempos, para a sua equipa se sagrar facilmente campeã nacional e que esta temporada esses números poderiam não ser suficientes para festejar o título. Tinha razão. No final, o Sporting fez 86 pontos e ficou no segundo lugar. Já o Benfica conseguiu números históricos ao sagrar-se tricampeão nacional com 88 pontos. Nunca uma equipa conseguiu tantos pontos no campeonato português, numa prova discutida por 18 equipas. Notável!

Se retirarmos desta análise aquilo que fez o FCPorto de André Vilas Boas em 2010/11, que num campeonato com 16 equipas chegou aos 84 pontos e deixou o segundo classificado a 21 pontos de distância - absolutamente extraordinário -, podemos chegar à conclusão que a diferença entre os habituais candidatos ao título e os outros tem atingido patamares impensáveis. Só a título de exemplo, em 2003/04, com um campeonato com 18 equipas, o FCPorto de José Mourinho foi campeão com 82 pontos e, no ano seguinte, o Benfica de Giovanni Trapattoni não foi além dos 65 pontos. Com estes números, esta época, os dragões do special one ficariam no terceiro lugar enquanto os encarnados da velha raposa não passariam do quarto posto.

Este devia ser um assunto absolutamente prioritário para os clubes das competições profissionais e para a Liga dos Clubes. Ninguém mais do que eles devia querer uma liga bem mais competitiva, com melhores jogadores e acima de tudo nivelada por cima e não por baixo como está atualmente e com tendência para piorar, principalmente depois dos contratos que os operadores de cabo fecharam com os clubes, nomeadamente com os chamados três grandes. A diferença de investimento entre Benfica, Sporting e FCPorto e as outras equipas é brutal. E se a isso juntarmos o dinheiro que conseguem captar dos patrocinadores, da presença nas competições europeias e das transações de jogadores não há mais conversa. A probabilidade de haver um outro campeão nacional que não um deles é simplesmente impossível.

Podem dizer que é o mercado a funcionar mas a existência de uma classe média pujante devia ser uma das principais preocupações de quem manda no futebol nacional. No entanto, depois dos últimos negócios em que a centralização dos direitos televisivos foi chutada para canto a toda a velocidade essa ideia deixou de existir. Nesta altura é cada um por si, com a MEO e a NOS a dividirem um bolo que deveria ser dividido, em primeiro lugar, pela Liga de Clubes e depois por todos os clubes, com regras em que a prestação desportiva e a importância social de cada um dos emblemas seriam fatores determinantes. Mas não. Todos continuam orgulhosamente sós como noutros tempos da nossa história.

Com estas diferenças entre os mais poderosos – cada vez mais ricos – e os mais pobres – cada vez mais debilitados – não pode espantar que os treinadores decidam fazer poupanças nos jogos em que defrontam os habituais candidatos ao título resguardando as suas principais unidades de cartões indesejados para poderem contar com eles em jogos onde a luta é mais igual. Também não espanta ninguém que as goleadas entre essas equipas e as outras se sucedam a uma velocidade estonteante. Com este pano de fundo a competitividade é uma palavra inexistente no nosso futebol e se ninguém fizer nada será ainda pior. Com as receitas de que dispõem, com os jogadores que têm, quase que me atrevo a dizer que o ideal para todos era fazer um campeonato apenas entre Benfica, Sporting e FCPorto a 10 voltas. Isso é que era uma coisa equilibrada, com mercado, interesse e muito público!

PS – Renato Sanches foi chamado à seleção para o Euro 2016. Acho que fazia mais falta na seleção olímpica mas isso sou eu a pensar alto. Ah era em Agosto, uma data FIFA e os alemães podiam não gostar. OK. Já percebi.

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