Somos todos Pompeia

Andando por uma semana que aponta futuros, entre tragédias políticas e novas Lisboas cheias de gente, calha-nos a morte como poesia. Leonard Cohen que se refugia no infinito e nós que nos mantemos tão violentos com o planeta.

São alturas de desgraças, impotências humanas perante a violência de fumo e de fogo que, quando acorda, não perdoa. Subir ao topo, olhar em distâncias o mundo por baixo e perceber que os vasos e os sangues não sobrevivem ao sopro do Vesúvio.

Numa viagem ao sul de Itália, tornou-se imprevista a visita ao vulcão e a subida à cratera por mais de uma hora, de apoios nas mãos, para que o esforço ainda ditasse da sua grandeza. Lá de cima, os campos e as vilas, de mar ao longe e um resto de movimentos subtis, a anunciar vida. A experiência pessoal é mais do que um ponto nas rotas turísticas. É uma caminhada que se faz em peregrinação mental, sem palavras porque nos confrontamos com tamanhos silêncios.

A intensidade de Vesúvio está nas ruínas de Pompeia. Ao descer o monte e aí sim, marcar o ponto nas rotas turísticas, percebe-se como pó, fogo e cinzas são muito mais poderosos que todas as nossas arrogâncias. Há dias, a RTP emitiu o documentário “Before the Flood”, em que Leonardo Di Caprio nos alerta para o que aí vem, se continuarmos a usar o automóvel a gasolina, se a carne se mantiver nos nossos menus, se a água potável não for poupada. Vamos todos morrer. E será como em Pompeia: de repente e de aviso feito, por uma Natureza sábia e cautelosa que anda a enviar sinais de fumo.

“Somos todos Pompeia” porque vamos morrer. Como Cohen, em profunda melancolia, por não nos conseguirmos salvar.
 
Entretanto, Susan Sontag, a escritora e ensaísta norte-americana, que se fosse viva, tinha morrido com a vitória de Trump, escreveu o maravilhoso “O Amante do Vulcão”. Livro que para além de extraordinário relato histórico do século XVIII napolitano, tem por lá a força das erupções vulcânicas e como isso é também fator de mudança humana. Ainda vamos a tempo.

Ah, e por lá há uma Leonor. Personagem real que a escritora resgata para a lembrar assim:
(…)ardente, veemente, que não compreendia o cinismo, queria que as coisas fossem melhores para mais do que uns poucos.”

Também conheço uma assim. Cheia de vontade de fazer deste mundo um sítio melhor. E não é que os avisos estão já à vista? Género, fumo de Vesúvios.

Before the Flood, documentário da televisão National Geografic, numa produção de Leonardo Di Caprio

O Amante do Vulcão, livro de Susan Sontag, Editora Quetzal

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