Retirada proposta para reposição de subvenções vitalícias a políticos

por Christopher Marques, RTP
Hugo Correia, Reuters

Esperava-se que o tema que mais controvérsia gerou no início do debate na especialidade da proposta de Orçamento do Estado para 2015 marcasse o segundo dia de trabalhos parlamentares. Mas a proposta acabou por ser retirada. “Em nome do bom senso”, nas palavras do deputado do PSD Couto dos Santos.

"Em nome do bom senso, os proponentes da proposta 524C pedem para que seja retirada", comunicou Couto dos Santos, anúncio que mereceu uma salva de palmas por parte da bancada laranja.
A proposta de reposição das subvenções vitalícias a antigos políticos tinha sido apresentada pelos deputados José Lello, do PS, e Couto dos Santos, do PSD.Esta quinta-feira, o Parlamento aprovou o artigo que mantém suspenso o pagamento das subvenções vitalícias, com os votos favoráveis do PSD e do CDS-PP. O Partido Socialista absteve-se. A norma tinha sido aprovada na quinta-feira com os votos a favor dos dois maiores partidos e os votos contra de PCP e Bloco de Esquerda. O CDS-PP absteve-se.

No entanto, o Bloco de Esquerda pediu a “avocação do artigo”. A norma teria assim de voltar a ser votada esta sexta-feira, desta vez em plenário. Antes de qualquer nova votação, foi anunciada a retirada do projeto.
"Foi uma vergonha"
"Foi uma vergonha que o bloco central de Pedro Passos Coelho e António Costa se tenham juntado nesta casa para repor pensões vitalícias a ex-políticos", afirmou a deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua.
"Se o Bloco de Esquerda não tivesse pedido a avocação dessa proposta a plenário, essa proposta tinha passado entre os pingos da chuva", continuou.

"Ainda bem que o Bloco de Esquerda obrigou os senhores deputados a dar a cara por esta proposta porque a verdade é que não conseguiram fazê-lo", declarou ainda Mariana Mortágua.
PCP propõe fim definitivo
No início da sessão plenária, também o PCP comentou a retirada da proposta dos deputados do PS e do PSD. João Oliveira relembrou que ainda iria a votação uma proposta dos deputados comunistas para que se acabe definitivamente com as subvenções vitalícias, proposta que foi chumbada.“Apresentamos esta proposta mantendo a nossa posição de princípio: as subvenções vitalícias nunca deveriam ter sido criadas e agora há que acabar com elas”, concluiu o deputado João Oliveira.

O PCP tinha feito uma proposta para revogar a atribuição destas verbas, mantendo-as apenas em casos de subsistência, mas a norma foi rejeitada.


A proposta que o PCP apresenta é idêntica à que apresentámos o ano passado. Revogam-se as subvenções vitalícias”, afirmou o deputado.

O partido quer que sejam tidas “em consideração” as situações em que da revogação do subsídio “possa ficar em causa a subsistência das pessoas ou delas possa resultar a insolvência”.

Também o Partido Ecologista “Os Verdes” propõe a revogação das subvenções vitalícias. O PEV lamenta que a proposta só tivesse sido retirada depois de ter sido pedida a avocação em plenário.

“Parece ter prevalecido o bom senso, ainda que tarde”, afirmou o deputado José Luís Ferreira, que considera que a proposta era “uma provocação”.
"Não foi a nossa proposta, mas íamos honrá-la"
Na reação do Partido Socialista à retirada da proposta 524C, Vieira da Silva começou por aludir àquelas que diz serem as principais propostas de alteração ao Orçamento do Estado feitas pelo partido: o aumento do abono de família, a reposição dos passes escolares e a prorrogação do subsídio social de desemprego.

“São propostas sérias e comportáveis no Orçamento do Estado. Não há nenhuma razão para que os deputados, em particular da maioria, não se possam associar a estas propostas”, considera o antigo ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.
“São essas e nenhuma outra as prioridades do Partido Socialista. O Partido Socialista tem orgulho na sua história, quando foi num governo do Partido Socialista que, no âmbito de uma revisão do sistema de pensões, foram mudadas as regras no acesso as subvenções vitalícias e outras formas de apoio a titulares de cargos públicos", afirmou Vieira da Silva.

No entanto, o deputado considera que não se devem "atingir retroativamente as pessoas, sejam elas quais forem". “Não foi a nossa proposta, mas íamos honrá-la" disse Vieira da Silva.
Montenegro assume responsabilidade
Luís Montenegro garantiu que a proposta que tinha sido apresentada não representava “a vontade política dos deputados do PSD”. O líder parlamentar social-democrata assume “integralmente a responsabilidade”, quer pela votação que ocorreu na quinta-feira na Comissão de Orçamento e Finanças, quer pela retirada da proposta.

“Assumindo esta responsabilidade, também quero assumir, em nome desta maioria, a responsabilidade de ter sido esta maioria a suspender o pagamento de subvenções políticas para quem tenha rendimentos acima dos 2000 euros”, afirmou ainda o líder parlamentar.

Também o CDS-PP assegurou que foi a atual maioria que suspendeu o pagamento das pensões vitalícias.

“Foi por esta maioria que as pensões foram suspensas, é por esta maioria que não serão repostas”, afirmou Nuno Magalhães.

O líder parlamentar do CDS-PP recordou que o partido não votou a proposta apresentada pelos deputados Couto dos Santos e José Lello, por acreditar que “não é altura para reposições”.Constitucional pode ser chamado
A retirada da proposta de alteração e a aprovação da manutenção da suspensão das subvenções vitalícias merece o desacordo de vários parlamentares. A socialista Isabel Moreira admite mesmo participar num pedido de fiscalização sucessiva junto do Tribunal Constitucional.

"Considero que essa norma é inconstitucional, ainda não falei com ninguém, mas estou absolutamente disponível", declarou a deputada à agência Lusa, uma hipótese também levantada por outros deputados, nomeadamente do PSD.

Isabel Moreira salientou que em 2013 já tinha manifestado a sua convicção de que a suspensão do pagamento das subvenções vitalícias superiores a dois mil euros mensais era inconstitucional.

"Só que no ano passado estávamos perante cortes violentíssimos e havia outras prioridades. Também entendo que mais grave do que esta questão é o conjunto de cortes aplicados a reformas de trabalhadores de empresas públicas como a Carris ou os cortes nas pensões", disse ainda a constitucionalista à Lusa.
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