Eduardo Cabrita ouvido no Parlamento sobre festejos do título do Sporting

por RTP
António Pedro Santos - Lusa

O ministro da Administração Interna foi ouvido, esta quarta-feira, no Parlamento no âmbito do inquérito da Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) relativo aos festejos do Sporting quando se sagrou campeão nacional de futebol em maio. A audição parlamentar foi requerida pelo Partido Social Democrata, que acusa Eduardo Cabrita de ter lavado "as mãos como Pilatos" das responsabilidades relacionadas com a organização do evento - acusação que o ministro nega, alegando que não cabe ao MAI o planeamento de eventos do género.

Após os festejos do Sporting em Lisboa, no passado mês de maio, Eduardo Cabrita terá argumentado que "não cabia ao ministro da Administração Interna organizar festejos de clubes de futebol" – o que Duarte Marques concorda, acusando, contudo, Eduardo Cabrita de ter as "suas responsabilidades". Os festejos decorreram, recorde-se, após o Conselho de Ministros aprovar uma resolução com medidas excecionais e ter prolongado o estado de Calamidade devido à pandemia. A decisão e implementação destas medidas eram, como referiu Duarte Marques, da responsabilidade do Ministério da Administração Interna, como garantir distanciamento social ou proibir os ajuntamentos.

O PSD, que pediu a audição parlamentar, deu início à audição acusando o ministro de fugir à responsabilidade quanto às decisões tomadas a 11 de maio. Os sociais-democratas apontam o dedo a Cabrita por não se ter oposto às celebrações dos adeptos leoninos, desaconselhadas tanto pela PSP como pela Direção-Geral da Saúde.

"Fica a sensação que o senhor ministro lava as mão como Pilatos desta responsabilidade, atribuindo à Câmara de Lisboa as responsabilidades pela organização do evento e impedindo a PSP de cumprir a sua missão"
, afirmou o deputado do PSD.

De acordo com o relatório do IGAI, que cita o despacho assinado por Eduardo Cabrita, o MAI ordenou que se cumprisse "o acordado entre a Câmara de Lisboa e o Sporting". Neste sentido, Duarte Marques questionou o ministro da Administração Interna se sabia o que estava acordado entre estas duas entidades, e voltou a acusar Cabrita de lavar "as mãos como Pilatos", de dizer à PSP para obedecer à Câmara e de permitir que se fizesse o que "a Câmara de Lisboa e o Sporting quisessem".

O deputado social-democrata acusou mesmo Eduardo Cabrita de atirar as responsabilidades à Câmara de Lisboa.

Segundo a RTP apurou, no programa "Sexta às 9", a PSP tentou impedir aquele modelo de festejo e propôs outras alternativas, mas o ministro da Administração Interna terá respondido que as forças policiais deviam obedecer à Câmara de Lisboa – informação desmentida por Cabrita.

O jornal Público publicou que, no despacho publicado em julho deste ano, o ministro validou na véspera da conquista do campeonato de futebol pelo Sporting os festejos dos leões nos modos em que estes vieram a ocorrer.

"O senhor ignorou os avisos da PSP, ignorou os avisos da DGS e preferiu deixar continuar a festa sem controlo – e depois ainda acusou a PSP de não ter cumprido o seu papel".


Em resposta a Duarte Marques, o ministro da Administração Interna começou por dizer que a realização desta audição parlamentar "prova o desespero do PSD e a ausência de justificação para esta audição verdadeiramente da época passada". Eduardo Cabrita acusou ainda o deputado do PSD de pretender enunciar "uma ideia de ausência de responsabilidade para o escrutínio parlamentar", que é "totalmente infirmada e absurda".

"Esta audição só pode existir porque, relativamente a uma matéria que é designada no pedido como ‘festejos do SCP’, o ministro da Administração Interna determinou, face às dúvidas no espaço público, determinou no dia 12 de maio a realização de um inquérito pela IGAI e no dia 16 de julho foi apresentado o relatório desse inquérito e foi apresentado o despacho sobre o mesmo, por mim próprio", defendeu Cabrita, recusando que "não tem qualquer sentido" falar em ausência de escrutínio.

O ministro da Administração Interna continuou e respondeu que, "relativamente à organização dos ditos festejos, é a entidade que festeja que deve determinar o quadro da sua realização". Além disso, "consta do relatório que cabe à autarquia – Lisboa ou qualquer outra –determinar a utilização do espaço público".

Cabe ainda "à PSP, ao Ministério da Administração Interna, manter as condições de ordem pública adequada às características" do evento.

"Em condições muito difíceis, olhando para festejos similares, como a final do campeonato europeu de futebol, em qualquer dos principais campeonatos europeus, a forma como as forças de segurança (…) responderam a situações particularmente difícil é assinalável e reconhecida", recordou Eduardo Cabrita.

Quanto ao despacho, que o PSD acusa Cabrita de ocultar e não permitir o acesso ao público, o ministro garantiu que não tem "nada a esconder", visto que está divulgado no relatório da IGAI, tratando-se apenas de "um despacho interno".

Para Cabrita, "este é um coelho tirado da cartola" pelo PSD, em "desespero".

"Não cabe ao Ministério da Administração Interna organizar o 1º Maio, a Festa do Avante nem a rentrée do PSD".

Eduardo Cabrita relembrou ainda em Parlamento que foi o ministro "que mais vezes esteve em debate, sempre disponível para corresponder a toda a disponibilidade de qualquer tema".

"Estive em 19 debates em plenário e oito audições em comissão parlamentar", recordando a sessão passada.
PSD acusa Governo de "desvalorizar coisa importantes"
Voltando a falar, na audição parlamentar, Duarte Marques acusou Eduardo Cabrita, o deputado do PS presente na sessão e o Governo de "desvalorizar coisas importantes", como o estado de Calamidade.

"O senhor ministro não respondeu à maioria das perguntas que eu coloquei", declarou o deputado do PSD. "O senhor ministro diz que este despacho está transcrito no relatório. Mas à comunicação social o senhor ministro desmente a existência deste despacho".

"A política deste Governo é de meias palavras e de meias verdades"
, continou.

Quanto à organização dos festejos do Sporting, o deputado do PSD acusou ainda o ministro de ter desautorizado a PSP e de atirar as responsabilidades à autarquia e a Fernando Medina.

"A PSP foi desautorizada pelo senhor ministro", sublinha Duarte Marques. "A responsabilidade não é só sua, o seu despacho foi uma forma e passar a responsabilidade para a Câmara de Lisboa e impedir a PSP de agir".

O  PSD acusou, novamente, Eduardo Cabrita de não responder nem, pelo menos, divulgar o despacho em questão.

"O facto de vir cá muitas vezes não é sinal de respeito à democracia, o senhor ministro raramente responde (...) não devia ficar orgulhoso de vir cá tantas vezes, é sinal de que é muito pouco competente", acrescenta.

Já o Bloco de Esquerda questionou "como é que é possível" que tenha sido feito um festejo daquela natureza usando a figura do direito à manifestação.

"Como é que não houve uma entidade a determinar a inaplicabilidade daquela situação ao direito à manifestação?", perguntou José Manuel Pureza, considerando a situação epidemiológica do país e, em particular, da região da Grande Lisboa.

Segundo o deputado bloquista, o impacto na saúde pública "era previsível" e "não houve deliberação que estivesse à altura dessas responsabilidades".

Também Diogo Pacheco de Amorim, do Chega, afirou estar "perplexo" e não compreender como tudo se fez, bebeu-se, juntou-se milhares, tudo em plena pandemia e "de repente nada acontece, de repente ninguém é responsável".

"Isto demonstra que qualquer coisa está mal", sublinhou.

Em resposta, Eduardo Cabrita afirmou que "numa avaliação com um sentido para o futuro, se considero que foi positiva a forma como decorreram estas celebrações enquanto sinal para o País, não, não considero".

"Penso que ninguém o poderá fazer", continuou Eduardo Cabrita. acrescentando que "o que diz o relatório é que todas as entidades que participaram nos contactos que foram feitos entendiam que era essencial fazer tudo o que fosse possível, designadamente envolvendo os que estavam diretamente mobilizados para a realização destas celebrações para que elas fossem tão enquadradas quanto possível".

A ausência de enquadramento, continuou, "seria propulsor de celebrações desordenadas". Mas "é extremamente fácil comentar, à segunda-feira, o jogo que aconteceu no domingo".

"Quanto à intervenção da PSP, não cabe à PSP definir o modelo das celebrações", afirma defendendo que a esta autoridade cabe garantir que tudo corre em segurança e que nesse sentido a PSP "fê-lo, com grande profissionalismo, sentido de missão e grande contenção".

"É um desafio muito difícil mas fez tudo o que era adequado num quadro de acontecimentos particularmente difíceis", justifica. "Aquilo que foi falado é que foram discutidos vários modelos e que a PSP preferia outro".

"Não é competência da PSP, mas também não é da Administração Interna" decidir onde poderá decorrer um evento como o Avante ou 1º Maio, por exemplo, "sublinho que isso é responsabilidade de quem festeja e que à PSP e MAI cabe garantir a ordem pública".

"A PSP não pode dizer que o 1.º de Maio não é na Alameda, é noutro sítio qualquer, ou que o Avante! não é no Seixal, é noutra localidade qualquer".
MAI compara festejos do Sporting a celebrações em Madrid, Itália e Paris
O ministro assinalou que esta intervenção policial "não teve os resultados dramáticos como a morte que se verificou nos festejos do Atlético de Madrid, igualmente em maio, dos vários mortos que houve em Itália nos festejos do campeonato europeu de futebol, ou a dimensão do que se passou em Paris com a derrota do Paris-Saint Germain na final da Liga dos Campeões".

"Isto não justifica nada, mas não vale a pena virem aqui como carpideiras, vários meses depois", atirou Eduardo Cabrita, dirigindo-se à oposição.

Cabrita defendeu que o que é realmente importante para a Assembleia da República é atualizar a matéria sobre o direito à manifestação nos novos tempos. O ministro sublinhou ainda que não houve nenhuma reunião sobre a manifestação e que são "inverdades" as acusações do PSD. A única reunião realizada no MAI foi anterior à da Juventude Leonina.

O governante acrescentou que o seu Ministério pediu ao Conselho Consultivo da PGR para se pronunciar sobre "em que termos era possível apreciar, não digo condicionar, os fundamentos da realização de uma manifestação em que manifestamente a forma de exercício não me parece ser condicente com as formas múltiplas (políticas, religiosas, etc) e assumir o compromisso de revisão do quadro legal aplicável".

O ministro declarou também que já foi feita uma outra averiguação sobre a atuação da PSP relativamente à "zona envolvente do Estádio de Alvalade" (e não aos festejos, ao cortejo, em si mesmo).

"Esse relatório foi-me entregue no início desta semana e está neste momento a ser apreciado e terá rapidamente o despacho sobre o mesmo – que será publicitado, julgo eu, qualquer reserva sobre essa matéria".
pub