Operação Fizz. Orlando Figueira diz que "tinha que ser muito estúpido para ser corrompido assim"
O julgamento da Operação Fizz começou esta segunda-feira. Na primeira sessão, o antigo procurador do DCIAP reafirmou estar inocente e garantiu que nunca foi corrompido. O primeiro dia de julgamento ficou ainda marcado pela decisão do coletivo de juízes de aceitar o pedido da procuradora do Ministério Público de separar o processo do ex-vice-presidente de Angola.
O primeiro a prestar declarações foi o antigo procurador do Ministério Público. Orlando Figueira disse que “teria de ser muito estúpido para ser corrompido assim”. "Ninguém me comprou", garantiu o antigo procurador do DCIAP aos jornalistas, à saída do tribunal.
Reafirmou estar inocente e garantiu que a sua conduta no Ministério Público foi irrepreensível. O ex-procurador tentou rebater as acusações de que é alvo.
Figueira está detido há quase dois anos. Primeiro em prisão preventiva e, desde o verão de 2016, está com pulseira eletrónica em prisão domiciliária.
A operação Fizz investiga um alegado esquema de corrupção em que o procurador Orlando Figueira recebia contrapartidas para fechar investigações que envolviam altas figuras do Estado angolano. O procurador Orlando Figueira é precisamente acusado dos mesmos crimes que costumava investigar no Departamento Central de Investigação e Ação Penal: corrupção e branqueamento de capitais.
A acusação diz que recebeu cerca de 763 mil euros em dinheiro e contratos de trabalho como consultor jurídico no grupo BCP para arquivar dois processos de Manuel Vicente, numa altura em que este estava prestes a tornar-se vice-presidente de Angola. Manuel Vicente é a personagem central na investigação. O ex-vice-presidente de Angola e ex-líder da Sonangol é acusado de corromper o procurador português. Vicente é o motivo pelo qual este processo tem gelado as relações entre Luanda e Lisboa.
Vão ainda a julgamento duas figuras que serão responsáveis por fazer a ligação entre Orlando Figueira e Manuel Vicente: Paulo Amaral Blanco, advogado conhecido por representar o Estado angolano e figuras do regime e Armindo Pires, intermediário e grande amigo de Manuel Vicente.
Os três arguidos que continuam no processo desmentem qualquer acordo de corrupção para serem arquivados dois inquéritos a Manuel Vicente.
Tribunal aceita separação do processo de Manuel Vicente
A procuradora do Ministério Público Leonor Machado pediu a separação do processo do ex-vice-presidente de Angola. O pedido foi aceite pelo coletivo de juízes.
Manuel Vicente é o elemento central desta operação, sendo acusado de ter pago ao procurador Orlando Figueira para que fossem encerradas investigações contra ele. O pedido de separação de processos foi apresentado pela procuradora Leonor Machado, que substitui a partir desta segunda-feira o procurador José Gois na Operação Fizz por decisão do Ministério Público.
Apesar de o julgamento começar esta segunda-feira, Manuel Vicente não foi ainda notificado ou sequer constituído arguido. As autoridades portuguesas não conseguem chegar a ele e Luanda recusa colaborar com Lisboa, apesar das cartas rogatórias enviadas.
O processo contra Manuel Vicente será por isso separado para permitir o julgamento dos restantes arguidos. No pedido de separação do processo, a procuradora recordou que o arguido Orlando Figueira está há mais de dois anos em prisão domiciliária.
Angola tinha já pedido a separação do processo, pretendendo que o julgamento do ex-vice-presidente Manuel Vicente se realizasse em território angolano, ao abrigo das convenções assinadas no âmbito da CPLP. No entanto, as autoridades portuguesas recusam enviá-lo.
Na sessão desta manhã foi ainda divulgada a resposta de Luanda a uma carta rogatória enviada pela justiça portuguesa. A carta pedia que Manuel Vicente fosse constituído arguido e notificado de “todo o conteúdo da acusação proferida nos autos”. Luanda respondeu que não era possível notificar Manuel Vicente.
Esta manhã, à chegada ao Tribunal, o advogado de Manuel Vicente alegou que o ex-vice-presidente de Angola não pode comparecer em tribunal. “A imunidade não é vontade do próprio, não é privilégio do próprio, não é prerrogativa do próprio”, afirmou Rui Patrício.
Mudança de procurador
O Ministério Público substituiu o procurador José Gois por Leonor Machado no processo da Operação Fizz, que tem como arguidos o antigo vice-presidente angolano Manuel Vicente, o ex-procurador Orlando Figueira, o advogado Paulo Blanco e o empresário Armindo Pires.
O Ministério Público não deu qualquer justificação para a troca de procurador. A mudança ocorre depois de o procurador José Góis e a Procuradoria-Geral da República terem apresentado pontos de vista distintos quanto àquela que deveria ser a estratégia do Ministério Público.
A divergência aconteceu depois de, em dezembro, o arguido Orlando Figueira ter introduzido o vice-presidente do BCP Carlos José da Silva e o advogado Daniel Proença de Carvalho no processo.
O arguido alega que o corruptor ativo não é Manuel Vicente, mas sim Carlos José da Silva e que Proença de Carvalho atuava como intermediário.
O procurador José Gois defendeu na altura que estes novos dados não deveriam ser tidos em conta. Em sentido contrário, a Procuradoria-Geral da República afirmou que estes novos dados estavam a ser tidos em conta para que fosse aberto um inquérito autónomo.
O julgamento que começou esta segunda-feira vai levar a tribunal algumas das principais figuras da justiça portuguesa, como o juiz Carlos Alexandre e a ex-diretora do DCIAP Cândida Almeida. O Presidente da República e o deputado João Soares foram chamados para testemunhar a favor de Paulo Blanco, com quem trabalharam na câmara de Lisboa.
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