Seca. Agricultores defendem plano de emergência nacional e ajudas extraordinárias

por Sandra Salvado - RTP
José Manuel Ribeiro - Reuters

A Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) considera que a atual situação de seca é “uma catástrofe” e quer que seja adotado em “plano de emergência nacional, envolvendo vários ministérios”. Diz que as linhas de crédito não resolvem o problema por serem “insuficientes e pouco adaptáveis a situações de emergência”. O Governo lembra que têm sido adotadas várias medidas e destaca o plano nacional de regadios que criará 90 mil hectares de novos regadios até 2021.

A área de cultivo de cereais de outono/inverno registou um mínimo histórico devido à seca em Portugal. Previsões do Instituto Nacional de Estatística (INE) que refletem uma redução da área, pelo quinto ano consecutivo e posicionam a campanha como a pior dos últimos 100 anos.

Em entrevista ao Jornal de Negócios, o presidente da CAP não se mostrou surpreendido com as previsões do INE e diz que a tendência é para se agravar. “É uma catástrofe e tem de ser combatida com um plano de emergência nacional envolvendo vários ministérios”.



Eduardo Oliveira e Sousa explicou ainda que “mais do que um agravamento da situação, o que se está a passar já se trata de um desastre, uma catástrofe, sobretudo no interior do país, que está a afetar não só a agricultura, mas também a pecuária, as reservas de água e está a matar a floresta”.

À Antena 1, o presidente da CAP disse que a situação é muito grave e que a seca está a criar muitas dificuldades a quem vive da terra. Oliveira e Sousa deixa ainda críticas ao ministério da Agricultura por tentar resolver o problema com medidas avulsas.

Oliveira e Sousa lamenta que o país ainda não tenha uma estratégia para enfrentar este problema. "Deveria haver um grupo de especialistas debruçados sobre esta questão de uma forma permanente para que o enfrentar estas alterações climáticas seja objeto de medidas de curto, médio e longo prazo".
"A terra está a morrer"
O responsável da CAP diz que o ministério da Agricultura tem estado a trabalhar sobre este problema "um pouco em cima da hora, reagindo ao dia-a-dia". E explica porquê: "As medidas que foram anunciadas a semana passada de mitigação dos efeitos da seca são parcas, são muito pouco significativas. Precisamos de mais. Precisamos de ajudas efetivas. Tem que haver uma medida de emergência, tal como houve para a região dos incêndios. Há toda uma economia de uma vastíssima região que está na eminência de entrar em rutura".

Oliveira e Sousa considera que as regiões que são beneficiadas pela água das barragens é que têm razão para ter alguma esperança. "Toda a outra região está em agonia. A torneira dos agricultores são as barragens. A torneira dos agricultores é a chuva. Se não há chuva, senão há barragens, o que é que os agricultores fazem? Vão morrer? Os animais vão morrer. As árvores vão morrer. A terra está a morrer".

Já o ministro da Agricultura acusa a CAP de estar a criar alarmismo em relação à redução da área de cultivo de cereais. Capoulas Santos disse à Antena 1 que reconhece a situação difícil em setores como a pecuária ou os cereais mas que há setores da agricultura que até estão a crescer.
"Não podemos ser alarmistas"
Capoulas Santos dá exemplos de medidas tomadas pelo Governo: ajudas para enfrentar a seca e a falta de água para os animais mas que os agricultores não estão a usar.

"Obviamente não podemos ser alarmistas. Temos de analisar com rigor a situação. Como é que se pode dizer que a situação é de uma catástrofe generalizada quando em setores tão importantes como a vinha, como o olival, como a horticultura e a fruticultura os resultados da época passada foram superiores ao expectável e as exportações aumentaram. Agora que existe uma situação muito difícil no setor da pecuária, no setor dos cereais, isso é verdade", explicou Capoulas Santos.

O ministro disse ainda que o Governo "adotou duas medidas relevantes, uma para apoiar a captação e transporte de água para abeberamento nas explorações, onde tal não existe e disponibilizámos 15 milhões de euros e aprovámos 1.600 candidaturas, que estão neste momento a pagamento mas só apareceram comprovativos de despesas de um milhão".

Capoulas adiantou ainda que o Governo abriu uma linha de crédito de cinco milhões de euros para a alimentação animal mas "neste momento, não está sequer utilizada um milhão".

Questionado antes pela Lusa sobre se o Governo estaria disposto a avançar com um plano de emergência nacional, o Ministério da Agricultura disse que têm sido adotadas, desde o ano passado, várias medidas no âmbito da situação de seca que o país atravessa como por exemplo a criação de uma linha crédito, de um Plano Nacional de Regadios e de um Plano de Prevenção, Monitorização e Contingência para Situações de Seca.
País em seca severa

"Tendo em conta que as alterações climáticas são determinantes para o futuro da agricultura, o Governo adotou um Plano Nacional de Regadios que criará 90 mil hectares de novos regadios até 2021. Trata-se de um investimento no montante de 534 milhões de euros, dos quais 150 milhões estão já em execução", destacou o ministério da Agricultura.

De acordo com os dados divulgados pelo INE, 56 por cento do território continental ainda se encontra em seca severa, em especial a sul do Tejo e nas regiões do interior Norte e Centro.

“A escassa precipitação ocorrida ao longo do mês [de janeiro] não foi suficiente para se registarem aumentos significativos das reservas hídricas nem, em muitos casos, para garantir teores de água nos solos próximos dos valores habituais”, revela ainda o INE.


Explorações esgotam reservas
Outro dado preocupante é que a grande maioria das explorações agropecuárias já esgotou as reservas de palhas e fenos, prevendo-se que tenham de continuar a recorrer a alimentos adquiridos.

“A instalação dos cereais de outono/inverno decorreu em pleno período de seca meteorológica e com perspetivas de manutenção do quadro de escassez de precipitação, com teores de humidade dos solos muito baixos. Este panorama conduziu a uma diminuição generalizada das áreas destas culturas face à campanha anterior, que se estima de cinco por cento no centeio e na aveia, de dez por cento no trigo mole, no triticale e na cevada e de 15 por cento no trigo duro.

A falta de chuva durante o mês de janeiro fez com que as reservas de água em nove barragens baixassem. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) fala em situação muito preocupante. A meteorologista Ângela Lourenço explicou à Antena 1 que quase todo o país está em situação de seca.

A 15 de fevereiro nove por cento do país estava já em seca extrema. Não há chuva prevista para esta semana e as temperaturas vão continuar a subir.

De acordo com o índice meteorológico de seca PDSI, no final do mês de janeiro verificou-se, em relação a 15 de janeiro, um aumento da área em situação de seca severa, em particular nas regiões do interior norte e centro.

"No final deste mês cerca de 56 por cento do território estava em seca severa, 40 por cento em seca moderada e quatro por cento em seca fraca", revelam os dados do IPMA.
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