Panama Papers, perguntas e respostas sobre o escândalo de fortunas ocultas

por Cristina Sambado - RTP
Instalações da Mossack Fonseca em Hong Kong Alex Hofford - EPA

A Mossack Fonseca é a firma de advogados sediada no Panamá que surge envolvida no colossal dossier ontem desvendado. Foi fundada em 1977 e expandiu-se a mais de 40 países. Conta com mais de 600 trabalhadores espalhados pelos cinco continentes e é o quarto fornecedor mundial de serviços offshore.

Foi no início deste ano que a Mossack Fonseca começou a ser alvo de escrutínio, quando os procuradores brasileiros a associaram à operação Lava Jato e acusaram cinco elementos da firma no Brasil de participação no esquema de corrupção.

Este domingo reapareceu à cabeça dos resultados de uma gigantesca investigação jornalística. Em causa estão milhões de dados que sugerem um esquema internacional - transversal a líderes políticos, a vedetas do desporto e outras e até mesmo criminosos - utilizado durante décadas para a lavagem de dinheiro e evasão fiscal.

Ana Cardoso Fonseca, Guilherme Terra - RTP


Os documentos foram obtidos pelo jornal alemão Sueddeutsche Zeitung, que os partilhou com o International Consortium of Investigative Journalists (ICIJ), e deram origem a uma investigação que envolveu mais de 370 jornalistas de 76 países. Sendo o maior trabalho de cooperação que envolveu profissionais de vários países.
Criada em 1977
A Mossack Fonseca nasceu em 1977 pela mão de Jürgen Mossack, um imigrante alemão cujo pai procurou uma vida melhor no Panamá, depois de ter servido nas Waffen-SS de Hitler.
Os dois sócios fundadores da empresa são figuras bem conhecidas na sociedade e na política panamianas.
Também pela mão de Rámon Fonseca, um romancista premiado que nos últimos anos foi conselheiro do presidente do Panamá, que em março, depois de ver a sua empresa implicada no escândalo Lava Jato, tirou uma licença sem vencimento.

A empresa tem trabalhado de perto com grandes bancos e firmas de advogados em países como a Holanda, México, Estados Unidos e Suíça, ajudando os clientes a movimentar ou a reduzir impostos.
Perceber os Panama Papers
Os ficheiros listam mais de 15.600 empresas fictícias criadas por bancos para clientes que querem manter escondidas as suas posses, incluindo milhares de companhias criadas pelos gigantes da finanças internacional UBS e HSBC.

O que é a Mossack Fonseca?


É um escritório de advogados no Panamá, cujos serviços incluem a incorporação de empresas em jurisdições offshore, como as Ilhas Virgens Britânicas. Administra as empresas offshore com uma taxa anual. Presta ainda serviços em administração de património. A sua missão é dar apoio jurídico e ajudar a gerir fortunas.

Onde está sediada?


A empresa tem sede no Panamá, mas opera em todo o mundo. Segundo a página da internet da Mossack Fonseca, a empresa conta com mais de 600 trabalhadores em 42 países. Tem franchisados em todo o mundo, onde os filiados podem inscrever novos clientes com direitos exclusivos para usar a marca.

Opera em paraísos fiscais como a Suíça, Chipre, Ilha Virgens Britânicas e nas dependências reais da coroa britânica, Guernsey, Jersey e a ilha de Man.

E a dimensão?


A Mossack Fonseca é o quarto maior fornecedor mundial de serviços offshore. Atualmente trabalha para mais de 300 mil empresas.

Tem uma forte ligação ao Reino Unido, já que a maior parte das empresas está registada em paraísos fiscais britânicos.

Que quantidade de dados foi intercetada?

Muitos. Foram retirados do banco de dados interno da Mossack Fonseca mais de 11,5 milhões de documentos e 2,6 terabytes de informação alegadamente secreta.

É considerado o maior caso de fuga de dados. Maior do que os telegramas diplomáticos dos Estados Unidos, lançados pelo WikiLeaks em 2010, e os documentos de serviços secretos facultados em 2013 por Edward Snowden.

Quem usa os paraísos fiscais?

Usar estruturas offshore é totalmente legal e há muitas razões para o fazer.

Empresários da Rússia e da Ucrânia colocam os seus ativos em offshores para os defenderem de ataques criminosos e para contornar outras restrições decorrentes de políticas monetárias.

Outros usam os offshores por motivos de heranças e impostos sucessórios.

Os criminosos usam os offshores?

Sim. No ano passado, durante um discurso em Singapura, David Cameron, primeiro-ministro britânico, afirmava que "os corruptos, criminosos e os branqueadores de capitais" aproveitam as estruturas de sociedade anónima. E que o seu Executivo estava a tentar resolver a situação.

Desde junho - e pela primeira vez -, as empresas offshore estão obrigadas a revelar, no Reino Unidos, os maiores proprietários.

O que alega a Mossack Fonseca?


A empresa recusa-se a discutir casos específicos da alegada infiltração, desculpando-se com a confidencialidade dos clientes, defendendo, no entanto, a sua conduta.

A Mossack Fonseca garante que cumpre as leis anti-branqueamento de capitais e que leva a cabo cuidadosas diligências junto de todos os seus clientes. Lamenta ainda o uso indevido dos seus serviços.

A Mossack Fonseca garante que não pode ser culpada por falhas de intermediários, que incluem bancos, escritórios de advogados e contabilistas.
Os nomes já conhecidos
Os dados revelados pela investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação apontam para o envolvimento de 140 políticos e autoridades públicas em esquemas montados em paraísos fiscais.

Todavia, a lista completa das empresas e nomes envolvidos só será divulgada em maio.

No texto conhecido este domingo, o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação refere que, “ao todo, uma análise aos ficheiros da Mossack Fonseca identificou 58 membros de famílias e pessoas relacionadas com primeiros-ministros, presidentes e reis”.

Para já, sabe-se que há pelo menos 33 pessoas ou entidades que constam da "lista negra" dos Estados Unidos, como o Hezbollah ou nações como a Coreia do Norte e o Irão.

Os nomes incluem ainda 12 antigos e atuais líderes mundiais. Entre eles estão Sigmundur Davíð Gunnlaugsson, primeiro-ministro da Islândia, o primeiro-ministro do Paquistão, o Presidente da Ucrânia e o Rei da Arábia Saudita.No mundo do desporto, a investigação revela que o escritório de advogados de Juan Pedro Damiani, membro da comissão de ética da FIFA, tinha relações de negócios com três homens que foram indiciados no escândalo da organização.

Os documentos, segundo a investigação, revelam mais de dois mil milhões de dólares em transações "secretamente baralhadas" através de bancos e companhias de fachada, envolvendo presumíveis associados ao Presidente russo Vladimir Putin.

A investigação revela ainda que familiares de pelo menos oito atuais ou antigos membros do Comité Permanente do Politburo da China, o principal corpo dirigente do país, têm empresas offshore. Entre estes está o cunhado do Presidente Xi Jinping, que criou duas empresas nas Ilhas Virgens Britânicas em 2009.

O Presidente ucraniano Petro Poroshenko, que se apresenta como um reformador num país abalado por escândalos de corrupção, é outro dos nomes já divulgados.

Os documentos contêm também novos pormenores de negócios feitos pelo falecido pai do primeiro-ministro britânico, David Cameron.

Os clientes da Mossack Fonseca incluem burlões, reis da droga, gente em fuga ao fisco e pelo menos um condenado por crimes sexuais.

Também o futebolista Lionel Messi aparece nos documentos da Mossack Fonseca, que mostram que o internacional argentino e o pai eram donos de uma empresa do Panamá: Mega Star Enterprises Inc.
Nome português na lista
Idalécio Oliveira, dono das empresas Lusitania Group, terá vendido à Petrobras áreas de exploração de petróleo no Benim, em África. É o único nome português, conhecido até agora, relacionado com o processo Panama Papers.

Fátima Marques Faria, Virgílio Matos - RTP

Segundo o jornal brasileiro O Estado de São Paulo, Idalécio Oliveira terá aberto 14 empresas offshore meses antes de realizar a venda.

Os documentos divulgados agora pelos Panama Papers revelam que o português terá transferido 8.800 mil euros, através de uma empresa registada pela Mossack Fonseca, para uma conta na Suíça. Conta que é, alegadamente, gerida por dois nomes ligados ao PMDB, partido político do Brasil, que estão a ser investigados na Operação Lava Jato.

c/ agências e imprensa internacional
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