Autarcas não reelegíveis são menos despesistas

por RTP
José Manuel Ribeiro - Reuters

Os autarcas que não se podem recandidatar gastam menos dinheiro em ano de eleições. Um estudo da Universidade do Minho e editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos revela que os autarcas não reelegíveis tendem a registar, em média, despesas e receitas 6,6 por cento e 4,1 por cento, respetivamente, mais baixas do que os que podem recandidatar-se.

O estudo analisou o impacto do limite de renovação até três mandatos sucessivos dos presidentes das autarquias, introduzido em 2005 na lei, mas que apenas teve efeitos práticos nas autárquicas de 2013.

Há quatro anos estavam impedidos de se recandidatar à mesma autarquia 160 presidentes das 308 câmaras municipais e 884 presidentes de juntas de freguesia por terem três ou mais mandatos consecutivos.



Em relação às juntas de freguesia, o número não foi mais elevado porque a limitação de mandatos não se aplicou aos presidentes das mais de duas mil freguesias abrangidas pela reorganização administrativa do território (nestes casos a contagem dos mandatos voltou a zero).

"Os resultados sugerem que os presidentes de câmara impedidos de se recandidatar gerem as finanças municipais de forma menos eleitoralista do que os autarcas reelegíveis, gerando um menor aumento da despeO estudo acrescenta: "menores despesas por parte dos presidentes impedidos de se recandidatar podem resultar do facto de não estarem preocupados com a sua reeleição" e, "gastando menos, necessitam de menos receitas, o que pode ajudar a explicar por que estas também tendem a ser inferiores".sa e menores reduções das receitas fiscal em anos eleitorais", afirmou Linda Veiga, que coordenou o estudo com Francisco Veiga (ambos professores universitários e doutorados em economia).

Segundo os coordenadores do estudo, os municípios com presidentes de câmara impedidos de se recandidatar "tendem a registar totais de despesa e de receita por habitante menores do que os presididos por autarcas elegíveis".

Neste contexto, a única exceção são os municípios onde os presidentes se demitiram antes do final do mandato, "uma vez que foi nestes municípios que se verificou um maior grau de eleitoralismo", frisou.
Alteração no perfil dos autarcas
Em 2013, o primeiro ano em que a lei da limitação dos mandatos teve efeitos práticos, verificou-se também uma alteração no perfil dos candidatos, em relação às autárquicas de 2009.

Segundo Linda Veiga, o estudo conclui “que, com a limitação de mandatos, houve uma diminuição da idade [média] do autarca em cerca de três anos, um aumento da percentagem de autarcas com um curso superior e uma diminuição também do número de autarcas naturais do concelho a que presidem".

Como foi analisado apenas um período eleitoral, as conclusões do estudo pretendem ser indicativas e a equipa pretende continuar a investigar sobre este tema, tendo em vista já as eleições de 1 de outubro de 2017.

Em termos de renovação dos presidentes da câmara, já se sabe que o impacto será menor em 2017, altura em que apenas 41 autarcas estão impedidos de se recandidatar devido à lei da limitação de mandatos, indica a investigação.
Outros dados do estudo
O estudo "Limitação de mandatos: O impacto nas finanças locais e na participação eleitoral" é hoje apresentado numa conferência na Assembleia da República.

Dos 160 presidentes de câmara que não se puderam candidatar em 2013, 75 foram candidatos à presidência da assembleia municipal, três integraram uma lista para a câmara e 10 candidataram-se à presidência de outro município, tendo seis destes sido eleitos.

Por outro lado, 26 autarcas impedidos de se recandidatar ao município que presidiam não concluíram o seu mandato, tendo quatro deles deixado o cargo a poucos meses antes das eleições autárquicas de 2013.

Em 2017 não são reelegíveis 41 presidentes de câmara.

Caracterização dos autarcas

A média das idades dos autarcas afetados pela limitação de mandatos é superior em cerca de 8,1 anos à dos que se puderam recandidatar e superior em cerca de 7,3 anos à dos autarcas que os substituíram.

A percentagem de autarcas com um curso superior foi inferior entre os autarcas que não se puderam recandidatar (77,7 por cento) quando comparada à dos autarcas que puderam fazê-lo (85,5 por cento) e à dos autarcas que substituíram presidentes afetados pela lei da limitação de mandatos (87,8 por cento).

Antiguidade dos autarcas

A lei da limitação dos mandatos atingiu sobretudo autarcas com uma antiguidade entre os nove e os 20 anos, que representam cerca de 83 por cento dos autarcas afetados por esta lei, apesar de existirem municípios onde os presidentes da câmara estiveram no poder mais de 30 anos.

Mesquita Machado (PS), em Braga, e Jaime Marta Soares (PSD), em Vila Nova de Poiares, foram os presidentes de Câmara com mais mandatos consecutivos, ambos com 10.

Partidos

Cerca de metade dos presidentes de câmara (82 dos 160) e dos presidentes de junta (445 dos 884) impedidos de se recandidatar devido à limitação de mandatos eram do PPD-PSD.

Estiveram também impedidos de se recandidatar a câmaras 59 presidentes que representavam o PS, 13 o PCP-PEV, um o Bloco de Esquerda e cinco independentes.

Às juntas não se puderam recandidatar também 323 presidentes do PS, 66 independentes, 36 do PCP-PEV, nove do CDS-PP sem coligação e um do MPT.

Finanças e eleitoralismo


Os resultados apontam para a existência de ciclos político-orçamentais que representam uma gestão eleitoralista da política orçamental nos anos em que existem eleições autárquicas.

Nestes anos, os saldos orçamentais dos presidentes elegíveis foram reduzidos, em média, num montante de 77,7 euros por habitante, relativamente a anos não eleitorais.

Adicionalmente, a despesa total aumentou neste caso 9,9% e a receita total (excluindo passivos financeiros) aumentou apenas 3,1%, o que explica o resultado obtido para os saldos orçamentais.

Já os autarcas sujeitos à limitação de mandatos também tenderam a agravar os saldos orçamentais em anos de eleições, embora num montante ligeiramente mais baixo (76 euros por habitante), e, apesar de não terem alterado a despesa total, registaram maiores reduções nas receitas do que os autarcas elegíveis.

A maior parte dos vice-presidentes que substituíram um presidente demissionário candidataram-se à camara municipal e, como tinham menos capital político e menos tempo para demonstrar as suas capacidades, "podem ter sentido maior necessidade de sinalizar a sua competência (através de uma gestão eleitoralista das finanças locais) ", é salientado no estudo.

Despesas com pessoal

Os presidentes não reelegíveis reduziram, em ano de eleições, as despesas com pessoal em 4,3 por cento e receberam menos transferências do Estado não provenientes da participação nos impostos do Estado (decresceram 15,1 por cento).

Já os presidentes de câmara reelegíveis gastaram mais com pessoal (10,1 por cento) e aumentaram as despesas em investimento (14,5 por cento), relativamente a anos não eleitorais.

Adicionalmente, estes dirigentes diminuíram as receitas fiscais em 7,1 por cento, tendo esta descida sido compensada por um aumento de 9,6 por cento nas transferências do Estado não provenientes da participação nos impostos do Estado.

Participação eleitoral

A participação eleitoral é decrescente nas eleições autárquicas desde 2005 e os municípios cujos presidentes foram afetados pela limitação de mandatos já mantinham as menores taxas de participação eleitoral em comparação com os outros municípios.

No entanto, em 2013, "houve indícios de que a limitação de mandatos teve um impacto positivo na participação eleitoral" dos cidadãos, tendo existido uma menor abstenção nos municípios onde os presidentes não se puderam recandidatar, em comparação com as eleições anteriores e em relação aos municípios onde os presidentes são reelegíveis.

"O facto de o presidente da câmara ser candidato - e, em muitos casos, há vários mandatos - pode desmobilizar o eleitorado, que vê a eleição como uma mera formalidade para a reeleição do presidente", é constatado no estudo, no qual se conclui que "a limitação de mandatos incrementa a participação eleitoral por aumentar a competição eleitoral e eliminar a vantagem de quem detém o cargo".

Esta relação positiva é ainda maior no caso das freguesias com limitação de mandatos, onde houve maior participação eleitoral dos cidadãos em comparação com aquelas onde não havia limitação de mandatos.

Opinião quanto à limitação de mandatos

Durante o estudo foram inquiridos 20 presidentes de câmara, dos quais 16 revelaram ser a favor da limitação de mandatos e apenas quatro se mostraram contra. A renovação dos presidentes de câmara é a vantagem mais apontada pelos inquiridos.

Os dados não permitem verificar se os presidentes que estão impedidos de se recandidatar concordaram mais ou menos com a lei do que aqueles que se podem recandidatar.

C/Lusa
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