Direita anuncia inquérito à contratação, gestão e saída de Domingues da Caixa

por RTP
Rafael Marchante - Reuters

Apurar os contornos da contratação, da curta gestão e da saída do ex-presidente da Caixa Geral de Depósitos é o objetivo da nova comissão parlamentar de inquérito forçada por PSD e CDS-PP. O requerimento foi apresentado esta sexta-feira e o primeiro-ministro já garantiu que irá colaborar com os trabalhos.

São três as alíneas que os deputados de PSD e CDS-PP querem ver aclaradas, nos termos do requerimento agora submetido. Todas elas em redor da anterior administração do banco do Estado. Não há uma referência direta às comunicações entre o ministro das Finanças, Mário Centeno, e António Domingues.

Em conferência de imprensa, Luís Montenegro refere que o objeto desta comissão de inquérito, cujo requirimento deu entrada no Parlamento na última quarta-feira, inclui "os termos em que o Governo atuou com a nomeação e demissão de António Domingues da Caixa Geral de Depósitos", lembrando que os partidos da esquerda parlamentar "bloquearam" o acesso às comunicações. Para o social-democrata, apurar a verdade "não é uma bisbilhotice".

Também o deputado Nuno Magalhães considerou "inevitável" recorrer à nova comissão de inquérito, argumentando que é "essencial" apurar a veracidade das posições assumidas por um Governo ou por um ministro das Finanças: "Não é uma trica, não é uma coscuvilhice". O centrista diz que é "direito e dever"da oposição fiscalizar os atos de um executivo.

Um dever que, segundo os dois líderes de bancada, tem sido vedado por deputados a outros deputados, numa clara referência ao impedimento pela esquerda de impedir o acesso às comunicações entre Centeno e Domingues. Essa foi a questão na origem da demissão de José Matos Correia da presidência da comissão de inquérito.

“Não abdicamos da nossa intervenção. Não nos vão silenciar independentemente de qualquer estratagema", afirmou o deputado do PSD.
"Nuvem de inconstitucionalidade"
Questionado sobre a possibilidade de requerer acesso às mensagens trocadas entre o anterior gestor da Caixa e o ministro das Finanças, o deputado Luís Montenegro destaca que, a ser necessário, não se trata de "conversas privadas ou conversas de café", mas sim de "informação institucional", ou seja, os termos e condições em que o convite foi feito.

“Queremos apurar os termos e as condições evocadas para o convite e para a demissão de António Domingues, através de depoimento pessoal das pessoas que participaram nesses eventos, tal como da documentação", acrescentou Luís Montenegro.

A esse propósito, o deputado social-democrata estranha que o Governo e esquerda levantem "uma nuvem a propósito da constitucionalidade do acesso às comunicações", já que dados semelhantes foram escrutinados em anteriores comissões de inquérito.

"Do nosso ponto de vista, acho que é expectável que a comissão possa ter acesso ao que já acedeu o Presidente da República, a que já acedeu um conselheiro de Estado, a que já acederam vários órgãos de comunicação social e que já veio transcrito nas páginas dos jornais", completou.
Deputados admitem chamar Costa
"Era bom que não fosse preciso interpelar o primeiro-ministro, mas se for necessário não podemos excluir essa possibilidade". Luís Montenegro admite a hipótese de chamar à comissão o chefe do Governo, isto caso haja uma "falta de esclarecimento cabal" pelas audições presenciais e pela documentação entregue aos trabalhos dos deputados.

Ao início da tarde, pouco depois da apresentação do requerimento no Parlamento, o próprio primeiro-ministro respondeu aos dois líderes, garantindo que irá colaborar "com todas as comissões de inquérito, dando todos os elementos que sejam solicitados".

Em resposta aos jornalistas, António Costa diz lamentar a posição da direita num contexto de bons resultados económicos, com uma estratégia que "penaliza os interesses do país".
PSD e CDS descartam responsabilidades
Na apresentação do requerimento, os dois líderes parlamentares da oposição reiteraram que a comissão é de cariz constitucional e nada mais faz além de abordar um assunto que tem sido amplamente falado.

"Não fomos nós que faltámos à explicação de porque é que António Domingues se demitiu, ou porque é que a CGD teve três administrações num ano. Se a CGD tem andado na ordem do dia pelos piores motivos não é da responsabilidade de PSD ou CDS-PP", reiterou Luís Montenegro.

Os partidos da direita têm sido acusados pelo Governo e esquerda parlamentar de retomar constantemente o assunto do banco público de forma a complicar o processo de recapitalização.

Nuno Magalhães, que assume a mesma posição, admitindo "aferir todas as diligências necessárias" dentro dos quadros legal e constitucional. "A contratação pública de uma pessoa para um cargo de natureza pública não é matéria privada", diz o deputado centrista, que admite mesmo que "não teria problema" em revelar mensagens trocadas com outros parlamentares acerca da contratação de um gestor para um cargo de cariz público.

Ao seu lado, Montenegro informou que António Domingues já disponibilizou "um conjunto vasto de documentação ao Parlamento", cerca de 200 páginas que serão objeto da nova comissão.
Ferro Rodrigues foi "infeliz"
Sobre as declarações do presidente da Assembleia de República, Luís Montenegro considera que houve um comportamento "muito infeliz" a propósito da comissão de inquérito em curso.

Em causa as declarações de Ferro Rodrigues no início desta semana, quando considerou em entrevista ao Diário de Notícias e à TSF que seria "absurdo" acabar com a atual comissão de inquérito através de um "boicote" ao funcionamento da mesma, após criação de uma nova comissão sobre os e-mails e comunicações.

Para o deputado social-democrata, "barrar os direitos dos deputados" numa comissão parlamentar de inquérito "traduz-se em condenar à morte a capacidade investigatória da Assembleia da República" por via destas comissões.

“Nunca com o Presidente do Parlamento do PSD houve uma obstrução aos direitos da Assembleia”, acrescentou o deputado. Em resposta à pergunta direta colocada por um jornalista, o líder parlamentar do PSD diz não colocar a hipótese desta segunda comissão "poder ter qualquer tipo de rejeição do presidente da Assembleia da República".

Nuno Magalhães acrescenta apenas que vê com "estranheza" que um presidente do Parlamento "faça política com os grupos parlamentares".
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