Governo remete TGV para a próxima legislatura

por RTP
O investimento estimado para o projecto de alta velocidade ferroviária em Portugal totaliza 7,5 mil milhões de euros Inácio Rosa, Lusa

O concurso para a construção do primeiro segmento do projecto de alta velocidade ferroviária, entre Poceirão e Caia, está em "fase final de apreciação", mas o Governo inscreve na próxima legislatura a luz verde para as obras, indicou esta terça-feira o ministro das Obras Públicas. A posição do Executivo foi confirmada depois de a líder do PSD ter dito que "ninguém consegue defender" o TGV.

O relatório resultante da avaliação das propostas apresentadas pelos dois consórcios na corrida à construção do troço Poceirão-Caia, encabeçados pela parceria entre a Brisa e a Soares da Costa e pela Mota-Engil, "estará pronto em Julho". Contudo, a assinatura do contrato de concessão da primeira fase da alta velocidade ferroviária em Portugal só terá lugar após as eleições legislativas, no Outono. Isto porque o Governo socialista "não pode nem quer ultrapassar datas", argumenta agora o ministro das Obras Públicas.

"O andar normal das coisas leva a que só na próxima legislatura, lá para Outubro, haja condições, nunca antes, para assinar o contrato de concessão", sustentou Mário Lino à margem da abertura de portas da Agência Europeia de Segurança Marítima, em Lisboa.

"Não é plausível nem possível" avançar com o projecto do comboio de alta velocidade até às eleições legislativas. Na base da posição do Governo está a ideia de que a concessão do primeiro troço está condicionada a um conjunto de etapas que impediriam uma decisão final antes do escrutínio de Outubro: a notificação do desfecho do concurso aos consórcios concorrentes; a decisão do Governo relativa à adjudicação; a aprovação em Conselho de Ministros dos princípios da concessão; a promulgação pelo Presidente da República; por último, "preparar com os bancos tudo o que é necessário para fechar o esquema de financiamento".

Lino quer "bom-senso" após as legislativas

Quanto ao cenário de uma derrota dos socialistas nas próximas legislativas, Mário Lino mostra-se cauteloso e diz não querer acreditar que o projecto não vá por diante.

"Espero que haja bom-senso e que se perceba que não temos aqui nenhuma ave rara. Os espanhóis e os franceses decidiram antecipar os seus projectos, os Estados Unidos deram prioridade à rede de alta velocidade e o Brasil também. Se isso é importante para a Europa, é ainda mais importante para os países da periferia", sublinhou o governante, num aparente recado à liderança do PSD, que pugna pelo adiamento do TGV em época de crise.

A rede de alta velocidade ferroviária em Portugal esteve em debate durante um colóquio organizado na segunda-feira pela Assembleia da República. O tema fracturou as opiniões dos especialistas convocados para o evento, que se dividiram na defesa de diferentes soluções para o traçado e na avaliação dos custos da obra, mas a contestação às opções de base do Executivo foi um foco de unanimidade.

TGV "é um bom tema para a decisão dos portugueses"

Com o calendário eleitoral em mente, Manuela Ferreira Leite voltou ontem a classificar o projecto do comboio de alta velocidade como "um bom tema para a decisão dos portugueses".

"Pelo facto de ser uma decisão tão polémica, não é possível de ser tomada a dois meses ou três das eleições. Quem ganhar as eleições tomará essas decisões e até é um bom tema para a decisão dos portugueses, saber afinal quem defende esse tipo de projectos, esse tipo de decisões futuras", afirmou a presidente do PSD após uma reunião com o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.

"É uma decisão altamente polémica. Neste momento não vejo ninguém, para além dos membros do Governo, que a defenda, tanto a sociedade civil como os políticos, como os economistas, todos estão contra esta decisão pelos encargos extremamente pesados para as gerações futuras, que o país com dificuldade suportará", insistiu Manuela Ferreira Leite, recuperando um dos pilares da estratégia política dos sociais-democratas no caminho para as legislativas.

Num preâmbulo das declarações de Mário Lino, a líder social-democrata considerou ser "impossível avançar" com o projecto na actual conjuntura, pelo que "a primeira coisa" a fazer "é adiar".

"Neste preciso momento, mesmo que isso fosse algo de muito importante, dada a situação de crise, ninguém consegue defendê-lo, portanto, no mínimo, havia que suspender", frisou.

Comissão Europeia demarca-se da agenda eleitoral

Para Bruxelas, "é importante" que Portugal "avance para a alta velocidade" em 2010. A posição do executivo comunitário foi sublinhada esta terça-feira, em Lisboa, pelo comissário europeu dos Transportes. António Tajani assinala, porém, que "o timing não é um problema" da Comissão Europeia, antes do poder político português.

Se a posição de Lisboa sofrer alterações, após as legislativas, "é possível" que Bruxelas venha a renegociar os termos dos apoios comunitários. Por enquanto, vincou Tajani, o executivo comunitário tem "uma posição": "A campanha eleitoral é um problema interno, não é um problema da Comissão Europeia".

O projecto da rede portuguesa de alta velocidade ferroviária assenta num financiamento comunitário de 383,38 milhões de euros, a outorgar no quadro de um subprograma do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN).

O investimento estimado para o projecto ascende a 7,5 mil milhões de euros - 19 por cento de fundos comunitários, 36 por cento de fundos do Estado português e 45 por cento de futuras receitas -, mas pode totalizar 8,9 milhões, caso as contas abarquem a reabilitação da malha ferroviária convencional e a componente rodoviária da terceira travessia do Rio Tejo, que irá ligar Chelas ao Barreiro.

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