Comissão Europeia rejeita orçamento de Itália para 2019

por Raquel Ramalho Lopes - RTP
Reuters

A Comissão Europeia rejeitou o plano orçamental de Itália para 2019 por considerar que este viola "de uma maneira sem precedentes" as regras europeias. Bruxelas deu ao Governo italiano três semanas para apresentar um novo orçamento. O vice-primeio-ministro italiano Matteo Salvini já veio reagir: a exigência de Bruxelas "não muda nada".

A Itália é o primeiro país a ver o seu projeto orçamental "chumbado" pela Comissão Europeia desde que, em 2013, no âmbito da crise da dívida soberana, implementou novas políticas económicas e orçamentais.

"Pela primeira vez, a Comissão vê-se obrigada a pedir a um país da zona euro para rever o seu plano orçamental. Não encontrámos outra alternativa senão pedir às autoridades italianas que o fizessem. Damos agora um prazo máximo de três semanas à Itália para apresentar uma nova proposta", anunciou o vice-presidente da Comissão Europeia e responsável pela pasta do Euro.

O Governo italiano respondeu, ontem, ao pedido de esclarecimentos que Bruxelas tinha feito na semana passada, reconhecendo que não estava a respeitar as regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento, com a necessidade de estimular o crescimento do país.

"Infelizmente" as explicações de Roma não foram "convincentes" para levar Bruxelas a mudar de opinião, continuando a considerar que a proposta orçamental italiana contém "uma derrapagem particularmente grave", disse Valdis Dombrovskis após a reunião do Colégio de Comissários. A Comissão publicou no seu site a avaliação da Direção-Geral de Economia e Finaças sobre o orçamento italiano.

O atual orçamento italiano vai aumentar o défice estrutural do país em 0,8 pontos, para 2,4 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), em vez de diminuir 0,6 pontos (para 1,8 por cento do PIB), conforme foi solicitado em julho pela Comissão.

"O Governo italiano está a ir, aberta e conscientemente. contra compromissos assumidos. A Europa é construída através da cooperação, a Zona Euro é baseada em laços de confiança. A Itália tem de jogar com as mesmas regras de todos. Se a confiança é quebrada, todos os Estados-membros sairão prejudicados, a nossa união será prejudicada", sublinhou Valdis Dombrovskis.

Dombrovskis notou que a Itália tem a segunda maior dívida em relação ao PIB da União Europeia, atingindo os 131,2 por cento em 2017. "As despesas com juros da Itália mantiveram-se em 2017 em cerca de 65,5 mil milhões de euros, ou 3,8 por cento do PIB, que era, em geral, o mesmo valor dos recursos públicos dedicados à educação", disse a Comissão.

O vice-presidente do executivo comunitário disse ainda que "quebrar as regras pode parecer tentador à primeira vista", assim como "tentar curar dívida com mais dívida", mas que, em determinado momento, esta pesará demasiado, especialmente num país que já tem "a segunda dívida pública mais elevada da União Europeia e uma das mais elevadas do mundo".
Braço-de-ferro mas com cuidado

Breuxelas não tem grande margem de manobra, entre a vontade de fazer a Itália respeitar as regras europeias, de modo a construir credibilidade, e a intenção de evitar um choque frontal com Roma, para não assustar os mercados.

"A bola está agora do lado do governo italiano. Sabemos que este é um ponto de partida para um diálogo de três semanas, que queremos feito num espírito construtivo", sublinhou Valdis Dombrovskis.

O comissário com responsabilidades pela moeda única vem, desta forma, dar seguimento ao aviso lançado esta segunda-feira pelo comissário europeu dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici.

Dombrovskis e Moscovici deram uma conferência de imprensa em conjunto, em Estrasburgo, para explicar os fundamentos da Comissão. Nas redes sociais, Moscovici reforçava a intenção de "diálogo construtivo".


Pierre Moscovici também considerou que a explicação de Roma foi insuficiente. "A carta que recebemos não respondia às três questões que colocámos: sobre o défice estrutural, a importância da dívida, e as perspetivas de crescimento", comentou aos jornalistas, ressalvando, contudo, que o caso de Itália não é "extremo".

A Itália arrisca a abertura de “um procedimento por défice excessivo” passível de sanções financeiras que, em teoria, correspondem a 0,2 por cento do PIB. Isto significa que Roma poderá ser chamada a pagar 3,4 mil milhões de euros, segundo os valores de 2017.
Roma "não muda nada" e não tem plano B
Enquanto o colégio dos comissários estava reunido, o primeiro-ministro italiano dava uma entrevista à agência Bloomberg para minimizar o impacto que pode advir do braço-de-ferro com Bruxelas.

Num tom conciliatório, Giuseppe Conte disse estar ansioso por explicar os contornos do plano a Bruxelas, mas admitiu que Roma "não tem plano B", uma vez que Bruxelas exige mudanças sem precedentes na exigência de cumprimento das regras europeias.

Numa primeira reação, o vice-primeiro-ministro italiano Matteo Salvini garantiu que a decisão de Bruxelas "não muda nada" nos planos italianos.

"Isso não muda nada, tenham disso certeza os senhores da especulação: não vamos voltar atrás", declarou o líder da Liga (extrema-direita), que governa em coligação com o Movimento 5 Estrelas (populista).

"Eles não vão atacar um governo, mas um povo. Estas são coisas que deixam os italianos ainda mais irritados e depois queixam-se de que a popularidade da União Europeia está no nível mais baixo" acrescentou.

O parceiro de coligação e igualmente vice-primeiro-ministro Luigi Di Maio disse no Twitter não estar admirado com a reação da Comissão.

"É o primeiro orçamento italiano que não agrada à União Europeia. Isso não me admira: é o primeiro orçamento italiano que foi feito em Roma e não em Bruxelas", escreveu.

"Vamos continuar a explicar à Comissão Europeia o que queremos fazer, com respeito. Mas o mesmo respeito impõe-se também ao povo italiano e ao Governo que atualmente o representa", acrescenta o líder do Movimento 5 Estrelas.

"As próximas semanas serão de grande diálogo com a Europa e os mercados", acrescentou Luigi di Maio.

O "orçamento do povo", conforme foi batizado pelo executivo italiano, inclui 37 mil milhões de euros de despesas extras e uma redução de impostos, para "cumprimento de promessas eleitorais", o que elevará o défice para 22 mil milhões de euros.

C/ agências
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