Johnny Depp e Joel Edgerton — desvendando um perverso sistema de poder


joao lopes
9 Out 2015 16:16

Scott Cooper, actor, argumentista e cineasta, não será um dos nomes sonantes da actual produção americana. Em todo o caso, os seus dois títulos anteriores como realizador — "Crazy Heart" (2009) e "Para Além das Cinzas" (2013) — envolvem uma atitude que importa sublinhar. Para além das histórias, através delas, ele é alguém que se apoia de forma decisiva no trabalho dos actores, valorizando-os de forma muito especial — recorde-se que o papel principal de "Crazy Heart" (um desencantado cantor "country") valeu um Oscar a Jeff Bridges.

Daí que valha a pena "corrigir" uma certa imagem de marca que se gerou em torno de "Jogo Sujo" (título original: "Black Mass"), um retrato íntimo e perturbante de James ‘Whitey’ Bulger, gangster que abalou a cidade de Boston nos anos 70/80. De facto, a composição de Johnny Depp na figura de Bulger, ainda que reflectindo a notável capacidade de transfiguração do actor, não é um fim em si mesmo. À boa maneira clássica, este é um filme que se constrói a partir da densidade de uma rede de personagens em que a presença dominante é tão importante quanto a mais remota figura secundária.
Por isso mesmo, vale a pena sublinhar que, para além de Depp (tentando recuperar do desastre artístico e financeiro de "O Excêntrico Mortdecai"), "Jogo Sujo" conta com um invulgar elenco que inclui ainda, entre outros, Joel Edgerton ("O Grande Gatsby"), Benedict Cumberbatch, Dakota Johnson, Kevin Bacon e Peter Sarsgaard.
Para o misto de realismo e tragédia que perpassa em todos os momentos de "Jogo Sujo" não será estranho, por certo, o facto de este ser um filme baseado num livro com importantes componentes jornalísticas (já existe edição portuguesa com chancela da Editorial Presença). De facto, o trabalho de investigação de Dick Lehr e Gerard O’Neill constitui uma base decisiva para a intensidade dos detalhes (psicológicos, cenográficos, simbólicos) do próprio filme.
Nesta perspectiva, podemos também dizer que a mise en scène de Cooper se afirma como legítima herdeira de todo um património narrativo de Hollywood fundado na aliança entre uma certa literatura de investigação e o desenvolvimento do filme noir. Símbolo exemplar de tal património poderá ser "A Sangue Frio" (1967), de Richard Brooks, baseado no livro homónimo de Truman Capote — trata-se, afinal, de expor os mecanismos mais ocultos das formas mais perversas de poder.

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