22 Mai 2022 11:59

"Frère et Soeur" foi o primeiro filme francês apresentado na corrida à Palma de Ouro na edição deste ano do Festival de Cannes. O realizador, Arnaud Desplechin, confessou à AFP qual é a sua inesgotável fonte de inspiração: a família e os seus traumas. No entanto, acrescenta: "Felizmente, tenho uma vida mais aborrecida do que as minhas personagens".

Depois de "Reis e Rainha" e "Um Conto de Natal", o cineasta regressa a Roubaix e à família Vuillard, no coração da sua filmografia, com um irmão, Louis, e uma irmã, Alice, interpretados por Marion Cotillard e Melvil Poupaud, que têm um ódio sem limites, um pelo outro.

Ele é um escritor tardio, que acertou contas com a família nos seus livros e se retirou do mundo após a morte do filho. Ela é uma actriz famosa, tão zangada com o irmão que é fisicamente incapaz de estar na mesma sala que ele.

Até ao dia em que se dá a morte acidental dos seus pais.

Arnaud Desplechin vem de uma família criativa, com uma irmã escritora, Marie, e uma autora de guiões, Raphaëlle. "Temos relações normais", afirma enquanto reconhece que as relações entre irmãos e irmãs são por natureza "sempre complicadas". "Sou bastante aborrecido, vivo como um urso. Tenho uma família perfeitamente normal. Devo arrepender-me? Não, sou feliz assim", continua.

No entanto, é no seio da família que este especialista em amor e família retira parte da sua inspiração: "quando vais fundo das tuas memórias, lembras-te da raiva que terás tido aos cinco anos de idade contra um irmão ou irmã".

Como um pesadelo

"No fundo, dentro de mim, penso ‘se tivesse realmente sentimentos terríveis em relação às minhas irmãs, o que aconteceria? Assim, acrescentam-se camadas e depois obtém-se as personagens maiores do que a vida. Mas receio que eu seja do tamanho da vida".

Num filme que é "assombrado por um luto muito sombrio" e onde, "mais do que nunca" Desplechin admite ter exorcizado os seus medos, é a morte dos pais que precipita os acontecimentos, forçando as personagens interpretadas por Marion Cotillard e Melvil Poupaud a confrontarem-se mutuamente.

"Fiquei horrivelmente infeliz ao filmar isto", diz Arnaud Desplechin sobre a cena do acidente de viação. "Tenho sorte, com a minha idade (61 anos), de ainda ter os meus pais vivos. Mas disse a mim próprio, neste filme, tenho de enfrentar coisas que me aterrorizam. Tenho de aprender na ficção como é perder os meus pais.

Inspirado por estes medos e experiências, Desplechin tentou transmitir este estado de espírito aos seus actores, algo confirmado por Marion Cotillard e Melvil Poupaud.

"Arnaud sabe colocar as pessoas num determinado estado", confessa este último: "Fiquei muito entusiasmado com a ideia de filmar com a Marion, mas senti no cenário, mesmo nos bastidores, que se passava algo que estava para além de nós, actores".

"Geralmente, quando filmamos, podemos ter uma proximidade entre actores, falar de tudo e de nada… Mas aí, a ideia era distanciar, não entrar num registo familiar", acrescenta Marion Cotillard. No final, tive de dizer ao Melvil que gostava muito dele e que a distância e a frieza que consegui colocar, era algo necessário" apenas para o filme, insiste Marion Cotillard.

  • AFP
  • 22 Mai 2022 11:59

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