Estreias
Quando o cinema acredita nos actores
Inspirando-se na experiência real de David Sheff e Nic Sheff (pai e filho), "Beautiful Boy" é um invulgar retrato íntimo de um caso de toxicodependência — Timothée Chalamet e Steve Carell são os brilhantes intérpretes principais.
Timothée Chalamet no papel de Nic Sheff — memórias da toxicodependência
Trailer/Cartaz/Sinopse:
Beautiful Boy
“Beautiful Boy” é o retrato profundamente comovente do amor inabalável de uma família e o compromisso entre si face ao vício do filho e às tentativas de reabilitação. Baseado em duas biografias, a do aclamado jornalista David Sheff e a do filho, Nic Sheff. Após várias recaídas de Nic, os Sheff são confrontados com a dura realidade de que o vício é uma doença que não descrimina e que pode atingir ...
Claro que os filmes não se definem pela nacionalidade de quem os assina — sabemos bem que a história do cinema é também a história de muitos cruzamentos geográficos e culturais.
Em qualquer caso, não deixa de ser curioso assinalar que um filme tão especial como "Beautiful Boy", objecto em tudo e por tudo visceralmente americano, seja realizado por Felix van Groeningen, um belga (o seu "Ciclo Interrompido" chegou à nomeação para o Oscar de melhor filme estrangeiro, em 2013).
Dizer que a importância de "Beautiful Boy" decorre da sua temática central — a toxicodependência — corre o risco de atrair um imenso equívoco. De facto, os temas não funcionam como caução do que quer que seja, sendo perfeitamente possível depararmos com filmes medíocres a cujos temas reconhecemos evidente importância social ou política.
Acontece que a saga das muitas dependências de Nic Sheff nos é contada para além de qualquer banal valor "simbólico". Trata-se, aliás, de uma narrativa centrada na sua relação com o pai, David Sheff, num processo em que ambos procuram encontrar um sistema de equilíbrio que possa ajudar Nic a enfrentar os seus dramáticos problemas, preservando os laços afectivos pai/filho (o filme parte, aliás, de livros escritos por pai e filho).
Há outra maneira de dizer isto: assistimos à revalorização de um cinema que não tem preconceitos de ser psicológico, afinal expondo os enigmas e contradições dos laços aparentemente mais naturais. Daí a crença fulcral no trabalho dos actores: interpretados pelos magníficos Timothée Chalamet e Steve Carell, Nic e David são, em última instância, dois seres à procura de um sentido para a sua própria relação.
É bem provável que "Beautiful Boy" surja com algum destaque nas nomeações para os Oscars, em particular através de Chalamet e Carell. Seja como for, há uma verdade rudimentar que importa (voltar a) sublinhar: mesmo as mais requintadas manipulações digitais não conseguem, nem de perto, nem de longe, gerar algo que se pareça com a verdade carnal destes intérpretes — um filme não é um videojogo...
Dizer que a importância de "Beautiful Boy" decorre da sua temática central — a toxicodependência — corre o risco de atrair um imenso equívoco. De facto, os temas não funcionam como caução do que quer que seja, sendo perfeitamente possível depararmos com filmes medíocres a cujos temas reconhecemos evidente importância social ou política.
Acontece que a saga das muitas dependências de Nic Sheff nos é contada para além de qualquer banal valor "simbólico". Trata-se, aliás, de uma narrativa centrada na sua relação com o pai, David Sheff, num processo em que ambos procuram encontrar um sistema de equilíbrio que possa ajudar Nic a enfrentar os seus dramáticos problemas, preservando os laços afectivos pai/filho (o filme parte, aliás, de livros escritos por pai e filho).
Há outra maneira de dizer isto: assistimos à revalorização de um cinema que não tem preconceitos de ser psicológico, afinal expondo os enigmas e contradições dos laços aparentemente mais naturais. Daí a crença fulcral no trabalho dos actores: interpretados pelos magníficos Timothée Chalamet e Steve Carell, Nic e David são, em última instância, dois seres à procura de um sentido para a sua própria relação.
É bem provável que "Beautiful Boy" surja com algum destaque nas nomeações para os Oscars, em particular através de Chalamet e Carell. Seja como for, há uma verdade rudimentar que importa (voltar a) sublinhar: mesmo as mais requintadas manipulações digitais não conseguem, nem de perto, nem de longe, gerar algo que se pareça com a verdade carnal destes intérpretes — um filme não é um videojogo...
Crítica de João Lopes
publicado 19:55 - 29 novembro '18