Erdogan insiste na reintrodução da pena de morte na Turquia

por Sandra Salvado - RTP
Presidência turca - EPA

O Presidente turco não desiste da ideia de reintroduzir a pena de morte no país. Mesmo depois dos avisos da responsável das relações exteriores da União Europeia, Federica Mogherini, que deixou claro que a Turquia jamais se poderia tornar “Estado-membro da União Europeia se introduzir a pena de morte”. Em entrevista à CNN, Recep Tayyip Erdogan disse que, embora a decisão esteja nas mãos do Parlamento, esse deve ser o castigo a aplicar aos alegados autores da tentativa de golpe de Estado no país.

Recep Tayyip Erdogan afirmou que caberá ao Parlamento turco decidir sobre a eventual reintrodução da pena de morte ao país e que, se o Parlamento fizer essa opção, a medida terá a sua chancela.

“Existe um claro crime de traição e o pedido não pode ser rejeitado pelo Governo (…) Os líderes terão de se reunir e discutir essa medida. Se eles aceitarem fazê-lo, eu, enquanto Presidente, vou aprovar qualquer decisão que saia do Parlamento”, referiu Erdogan numa entrevista exclusiva à CNN.

A Turquia não executa ninguém desde 1984 e a pena de morte foi formalmente abolida do país em 2004.

Após a tentativa de golpe de Estado, na passada sexta-feira, Erdogan e os seus apoiantes voltaram a falar sobre a possibilidade de reintroduzir a pena capital no país.
“Hoje não existe pena de morte nos Estados Unidos? Na Rússia? Na China? Em países de todo o mundo? Só nos países da União Europeia é que não há pena de morte”, sustentou ainda Erdogan.
"Porquê mantê-los e alimentá-los nas prisões, anos a fio? Isso é o que as pessoas dizem”, sustentou Erdogan numa entrevista à cadeia televisiva norte-americana.

“As pessoas querem um fim rápido porque perderam familiares, vizinhos, crianças. Estão a sofrer e temos que agir de forma sensata e sensível", disse o líder turco.

Já antes Erdogan tinha afirmado que a questão da pena de morte seria discutida no Parlamento. E acrescentou: "Estes bandidos bombardearam a população, e acredito que os partidos tomarão a melhor decisão no Parlamento. E anuncio desde já a minha decisão de promulgar essa lei, caso seja aprovada".

As declarações acontecem mesmo depois de a responsável pelas relações externas da União Europeia, Federica Mogherini, ter avisado que a Turquia jamais se poderia tornar “Estado-membro da União Europeia se introduzir a pena de morte”.

Mogherini disse que uma eventual reintrodução da pena de morte seria uma clara violação dos estatutos da União Europeia e reduziria a zero as possibilidades de os turcos se virem a juntar ao clube dos 28 (27 com o Brexit).
“A Turquia é uma parte importante do Conselho da Europa e está ligada à Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que é muito clara relativamente à pena de morte”, lembrou a responsável das relações exteriores da União Europeia.
Frederica Mogherini insistiu que, se a Turquia avançar com essa medida, estaria a violar a Convenção Europeia dos Direitos e os estatutos do Conselho da Europa.

Na mesma entrevista à CNN, Erdogan confirmou ainda que decidiu avançar com um pedido formal de extradição do líder religioso Fethullah Gülen, acusado pelas forças governamentais turcas de ser o homem que orquestrou a tentativa falhada de golpe de Estado.

Fethullah Gülen, antigo aliado do Governo turco, já tinha negado as acusações e afirmou que a tentativa de golpe de Estado pode não passar de uma encenação do próprio Presidente turco. Gülen vive há 17 anos na Pensilvânia, nos Estados Unidos.

“Não conheço a natureza nem a veracidade das acusações, mas se foi um golpe de Estado também estou contra ele (…) Na verdade, no mais recente golpe, há uma pequena hipótese, uma probabilidade de ele ter sido encenado, a fim de motivar ulteriores associações e acusações”, disse Gülen.

Considerado um dos líderes religiosos mais admirados do mundo, Gülen chegou a ser aliado do Presidente turco, mas um escândalo de corrupção em 2013 afastou-os.

Erdogan acredita que, desde esse dia, Gulen não tem poupado esforços para tentar derrubar o regime turco, nomeadamente, o golpe de Estado falhado da semana passada.

“Nós temos um acordo mútuo de extradição de criminosos. Se tu, enquanto meu parceiro estratégico, me pedes para extraditar alguém, eu obedeço. Se não fizeres o mesmo então, claro, deverá existir reciprocidade neste tipo de coisas”, referiu Erdogan.
Processo já foi enviado
Já esta terça-feira o primeiro-ministro turco adiantou ter enviado para Washington o pedido de extradição de Gülen.

Citado pela agência France Presse, Binali Yildirim refere que Ancara enviou quatro dossiers. "Vamos apresentar mais provas do que aquelas que eles querem", disse Binali Yildirim no Parlamento.

Os turcos estão divididos entre os que apoiam o partido de Erdogan e os que se lhe opõem. Ainda assim, a Praça Taxim, em Istambul, tem sido palco de concentrações de milhares de pessoas que têm aderido ao apelo do Presidente para jornadas de vigilância democrática.

Ricardo Alexandre, David Araújo - RTP

De acordo com o último balanço turco, a tentativa falhada de golpe de Estado no país provocou 308 mortos e mais de 1.400 feridos.

Segundo o primeiro-ministro turco, mais de 7.500 pessoas foram detidas no âmbito do inquérito à tentativa de golpe de Estado, incluindo 6.038 militares, 755 magistrados e 100 agentes da polícia.

Cerca de 2.750 juízes e magistrados do Ministério Público foram, por sua vez, afastados das suas funções.
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