NASA encontra vestígios de água fluida em Marte

por RTP
As longas linhas negras chamadas fluxos sazonais que descem ao longo das encostas de Marte serão prova da existência de água líquida no planeta. A cor azul nos montículos acima não terá relação mas será proveniente de um mineral, piroxene. A imagem é produzida pela sobreposição de uma imagem obtida através uma foto de infravermelhos com cores retificadas noutra de um Modelo Terraformado Digital, obtida através da Experiência com Imagens de alta Resolução da Universidade Estatal do Arizona. Nasa

Cientistas da NASA afirmam que, nos meses de verão de Marte a água corre ao longo de canhões e das paredes das crateras. A possibilidade de existir vida no planeta "vermelho" é agora mais elevada, acrescentam.

A ser encontrada, a vida em Marte, o planeta mais parecido com a Terra em todo o Sistema Solar, seria provavelmente microbiana.

Os cientistas referem ter detetado sais, que só se formam na presença de água, em pequenos canais esculpidos ao longo das encostas de montes e de crateras na região equatorial do planeta.

De acordo com declarações ao jornal The Guardian, estes sinais serão evidência da presença de água corrente.

"Existe hoje água líquida na superfície de Marte", afirmou Michael Meyer, o cientista que dirige o programa de exploração de Marte da NASA, ao jornal britânico.

"Por causa disto, suspeitamos que é, pelo menos, possível a existência hoje de um ambiente habitável", acrescentou.

De acordo com imagens obtidas a partir da órbita de Marte, as encostas e paredes a pique de vales, de canyons e de crateras, estão sulcadas por longas linhas escuras que, nos locais de maior atividade, formam padrões intricados em forma de leque.

A análise destas imagens permitiu identificar formações de sais minerais hidratados, prova da existência de líquido salgado.

As correntes de água poderiam levar a NASA e outras agências espaciais até aos locais onde será mais provável encontrar vida em Marte e onde futuras missões humanas possam coletar água a partir de fontes naturais.

Encosta da Cratera de Newton, em Marte Foto: Wikicommons, Universidade Estatal do ArizonaUm oceano em Marte
Apesar das fontes e das características químicas desta água serem ainda desconhecidas, a descoberta pode modificar a forma de pensar em Marte.

As encostas onde foram detetados os vestígios foram primeiro referidas em 4 de agosto de 2011. As linhas foram chamadas fluxos sazonais por só ocorrerem durante os meses quentes da primavera e do verão marcianos, desaparecendo quando as temperaturas descem.

Na altura, estes fluxos foram considerados provas da existência de água fluida em Marte. Acreditava-se que fosse salgada devido à demora em congelar.

Com uma cor escura, por causas desconhecidas, os fluxos recorrentes de água surgem no início da primavera e vão diminuindo ao longo do verão.

Os cientistas avançam as hipóteses desta água surgir de aquíferos ou de mantos de gelo subterrâneos salgados, ou, pelo contrário, se condensar a partir da atmosfera rarefeita de Marte.

Algumas das primeiras missões a Marte revelaram que o planeta "vermelho" teve água em tempos recuados.

Imagens recolhidas no início dos anos 70 mostravam uma superfície sulcada de rios secos e planícies em tempos ocultas sob vastos lagos.

Linhas de fluxo sazonais descem pelas paredes da cratera Garni, em Marte Foto: NASA, Universidade Estatal do Arizona

No início deste ano a NASA mostrou provas de que há 4,5 mil milhões de anos um oceano cobriu metade do hemisfério norte do planeta, constituindo actualmente um depósito subterrâneo de água ou de gelo.
Prudência
A equipa responsável pela análise dos vestígios é, apesar de tudo, mais prudente do que a NASA.

"Não dizemos que encontrámos... provas de água fluida. Encontramos sais", afirmou à agência Reuters Lujendra Ojha, uma estudante de mestrado do Instituto de Tecnologia da Georgia e autora principal de um artigo publicado esta semana no jornal Nature Geoscience.

Desde que foram identificados os sulcos em 2011 que os cientistas tentavam analisar a sua proveniência e características. Mas esbarravam em diversas dificuldades técnicas.

A sonda Mars Reconnaicence Orbiter, da NASA, faz as suas medições apenas durante as alturas mais quentes do dia marciano. Os pesquisadores acreditavam por isso que quaisquer traços de água, ou restos de minerais hidratados, se evaporavam.

Outra dificuldade dos analistas era a largura dos sulcos, geralmente inferior a cinco metros, demasiado pequena para os equipamentos de deteção química da sonda orbital obterem detalhes.

Ojha e os seus colegas criaram um programa de computador que analisa separadamente cada um dos píxeis que compõem as imagens. Os dados assim obtidos foram então correlacionados com imagens de alta-resolução dos sulcos.

Os cientistas concentraram-se nos sulcos mais largos e descobriram uma coincidência absoluta entre os locais analisados e a deteção de hidratos.

O planeta Marte mostrando a Terra Meridianis numa foto sem data da NASA
Muitos mistérios
Ojha diz que o anúncio da NASA é um pouco demasiado otimista. "há ainda muitos mistérios a resolver" sobre os sulcos de Marte, diz. Outros cientistas são igualmente prudentes.

A descoberta "confirma que a água tem um papel nestas características" marcianas, afirmou Alfred McEwen, cientista planetário da Universidade Estatal do Arizona. "Não sabemos se vem à tona vinda de baixo da superfície. Poderia vir da atmosfera."

Muito falta ainda analisar sobre a composição química da água antes de se avançar com projetos quanto à habitabilidade de Marte.

"Não é necessariamente habitável só pela água - pelo menos para organismos terrestres", afirmou McEwen.
Um passado conturbado
A Mars Rover Curiosity, também da NASA, já tinha encontrado provas de que, no seu passado distante, Marte teve todos os ingredientes e habitats necessários à ocorrência de vida microbiana.

Os cientistas têm tentado perceber como é que Marte se transformou, de um planeta primordialmente quente, molhado e semelhante à Terra, no deserto frio que é hoje.

Há milhares de milhões de anos, Marte terá perdido muita da sua atmosfera provavelmente por falta de um campo magnético protetor global.

Diversos estudos tentam determinar quanta da água primitiva permanecerá no planeta, provavelmente em campos de gelo ou reservatórios subterrâneos.
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