Portugal recebe mais 68 refugiados

por Graça Andrade Ramos - RTP
Um homem brinca com um bebé, no campo de refugiados e migrantes improvisado em Idomeni, junto à fronteira grega com a Macedónia. Mais de 13.000 pessoas amontoam-se já no campo, sem as mínimas condições de vida. /Alexandros Avramidis - Reuters

Está tudo pronto para receber mais um grupo de refugiados que procuram a Europa para uma vida melhor. Depois de 37 cidadãos da Eritreia chegados há pouco dias, é agora a vez de sírios e iraquianos. Mais 50 pessoas deverão chegar nos próximos dias.

Portugal disponibilizou-se para acolher até 10.000 refugiados e migrantes, ao abrigo de um plano europeu, aliviando assim a pressão sobre os países mais afetados pelo fluxo migratório, em especial a Grécia e a Itália.

O país preparou várias iniciativas de acolhimento, desde casas e empregos até aulas de português, possibilitadas pela Universidade de Aveiro.

Foi igualmente formada uma Plataforma de Apoio aos Refugiados, que está de braços abertos para ajudar em tudo o que estes necessitarem.

A posição portuguesa tem sido contudo relativamente passiva na questão, já que o país não é afetado diretamente pela pressão migratória. Uma escolha criticada este domingo pela líder do Bloco de Esquerda. Catarina Martins quer as fronteiras europeias abertas e exige do Governo português uma ação mais proativa.

Até agora o plano europeu, que prevê distribuir 150.000 migrantes, tem sido implementado a conta gotas e é possivel que nem todos os deslocados para Portugal tencionem permanecer no país, apesar dos apoios.
Panela de pressãoEm 2014, um grupo de sírios munidos de passaportes falsos, detido na Guiné-Bissau e transferidos para Portugal, acabou por desaparecer sem deixar rasto, aproveitando as fronteiras abertas pelo acordo de Schengen.
Nos últimos 12 meses a situação na Europa face aos refugiados e migrantes mudou drasticamente, sob a pressão de 1,2 milhões de pessoas, chegadas apenas em 2015.

Desde janeiro, a tensão acentuou-se e, só nos primeiros dois meses de 2016, chegaram à Europa, sobretudo à Grécia, tantos refugiados como nos primeiros seis meses de 2015 e 30 vezes mais do que em idêntico período do ano passado.

O acordo de distribuição de 150.000 migrantes está largamente ultrapassado pela realidade. Só na Grécia - onde o fluxo começou a ser detido nas últimas semanas pelo encerramento das fronteiras dos países dos Balcãs e do centro da Europa - as agências internacionais esperam que se acumulem, dentro de poucos dias, mais de 100.000 pessoas.

Apesar dos riscos, os migrantes continuam a atravessar o Mar Egeu. Este fim de semana morreram mais 25 pessoas ao largo da costa turca, entre elas 10 crianças. Os 15 sobreviventes foram internados em estado de choque. Já ao largo de Lesbos, as autoridades costeiras salvaram pelo menos 300 pessoas.

O problema europeu é o que fazer com elas.Mais de 1,2 milhões de pessoas entraram na Europa em 2015, via rotas turcas e líbias. Desde janeiro pelo menos 135.000 migrantes chegaram à Grécia, o principal ponto de chegada na União Europeia, a maioria, 126.000, vindos da Turquia.

A Europa está à beira de ter dentro de portas uma crise humanitária sem precedentes. Mais de 13.000 pessoas amontoam-se já junto à fronteira grega com a Macedónia, e a situação de salubridade e de sobrevivência é cada vez mais precária.

Os apoios internacionais não chegam e o desespero está a instalar-se. Há uma semana, 300 refugiados tentaram quebrar as barreiras policiais. Foram rechaçados com gás lacrimogéneo mas uma segunda tentativa com mais pessoas, incluindo crianças, pode provocar feridos e até mortos.
Cimeira com Turquia
A urgência levou a União Europeia a convocar uma cimeira extraordinária em Bruxelas - em principio um almoço de trabalho - para tentar resolver a crise uma vez por todas. A Turquia, principal país de passagem da maioria dos refugiados na sua viagem para a União Europeia, irá igualmente participar dos trabalhos.

O consenso não será fácil. A Áustria tem sido a pior pedra no sapato alemão, tendo liderado nos últimos meses as exigências à Grécia para impedir que os refugiados a atravessem simplesmente e apoiando implicitaente os países dos Balcãs no erguer de barreiras e encerramento de fronteiras.

Viena deverá exigir esta segunda-feiraà chanceler Angela Merkel - que em meados de 2015 prometeu aceitar todos os refugiados que chegassem e cujo país já acolheu mais de um milhão de migrantes, para desagrado de muitos alemães -  que estabeleça um limite claro ao número de pedidos de asilo que está disposta a aceitar.

A Áustria acredita que esse limite poderá dissuadir muitos migrantes de tentarem chegar à Europa e leva-los a procurar novos destinos.

Tendas de refugiados e de migrantes em Idomeni, junto à fronteira grega com a Macedónia, em março de 2016 Foto: Reuters

Bruxelas deverá pedir ajuda à Turquia e apoios para a Grécia para fechar definitivamente a "rota dos balcãs".

"O fluxo de migrantes irregulares ao longo dos Balcãs ocidentais chega ao fim. Esta rota está, a partir de agora, fechada", lê-se no projeto de declaração final desta cimeira extraordinária da UE, de acordo com a agência noticiosa France Presse (AFP).

Os 28 deverão ainda debater a proposta do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, de aplicar as regras da livre circulação no espaço Schengen restringindo a entrada na Grécia aos requerentes de asilo.

Tusk visitou esta semana os Balcãs a Grécia e Turquia, e concluiu que, "pela primeira vez desde o início da crise dos migrantes, conseguia ver emergir um consenso europeu", especificamente "em torno de uma estratégia global que, se for aplicada com lealdade, pode ajudar a travar os fluxos" migratórios.

Os migrantes "económicos" seriam então expulsos para a Turquia que teria a responsabilidade de os repatriar. Uma responsabilidade que Ancara apoderá aceitar assumir a partir de 1 de junho próximo.
Turquia em Schengen?
Outro ângulo da reunião em Bruxelas será um novo acordo com a Turquia, para este país cumprir acordos firmados em novembro, de acolher mais refugiados com apoios reais e impedir a sua marcha para a Europa, a troco de auxílio financeiro calculado em três mil milhões de euros.Navios da NATO, deslocados para o Mar Egeu para vigiar e impedir o contrabando de pessoas têm tido a sua ação muito dificultada pelo Governo turco que não se resolve a autoriza-los a deslocarem-se nas suas águas.

O Presidente turco, Reccep Tayyip Erdogan, chegou a Bruxelas domingo à noite para preparar a cimeira, tendo-se reunido à porta fechada com a chanceler Angela Merkel.
 
Ancara tem dito que o montante disponibilizado pela UE é escasso para as necessidades e exige mais. Antes de partir para Bruxelas, Erdogan referiu que o seu país está a dar "passos importantes" para respeitar o "plano de ação", concluído em novembro com a UE.

Erdogan poderá tentar agora negociar promessas da União Europeia para num futuro próximo esta incluir a Turquia no acordo de livre circulação de Schengen, abrindo efetivamente as fronteiras a 75 milhões de turcos.

Uma perspetiva que deverá ser vivamente criticada, se chegar a ser implementada. Atualmente, o acordo de Schengen, uma das grandes vitórias do projeto europeu, está a soçobrar sob o tsunami de migrantes, com vários países da Europa central e do norte de fronteiras encerradas e barreiras de arame farpado erguidas a separar campos contíguos.
Europa: medo ou humanismo?
A Alemanha tem dito que pretende retomar Schengen o mais depressa possível e resolver a questão dos refugiados e migrantes sem beliscar os Direitos Humanos.

Apesar de toda a sua influência, e perante um projeto que em poucos meses mostrou todas as suas fragilidades, a potência alemã poderá no entanto ter de ceder à pressão dos que querem fechar a Europa.

Como referiu este domingo o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, ao apelar a Europa a recuperar o "sentido comum" e evitar extremismos que visam transformá-la numa "fortaleza", a Europa está num momento em que deve decidir se vence o "medo e o racismo" ou "a solidariedade e o humanismo."

O destino de milhares de pessoas -quem sabe, da própria União Europeia - dependem da resolução a tomar.
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