Biógrafo de Mouzinho de Albuquerque questiona tese do suicídio

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Lisboa, 12 Ago (Lusa) - O diplomata António Mascarenhas Gaivão estreia-se editorialmente com uma obra sobre Mouzinho de Albuquerque, militar cujo perfil admira mas reconhece que hoje "seria muito mal compreendido".

Intitulada "Mouzinho de Albuquerque", a obra, dada à estampa pela Oficina do Livro, retoma as dúvidas quanto à tese de suicídio, sublinha a actividade diplomática do militar e interroga-se sobre a veracidade de uma carta por este enviada à Rainha D.ª Amélia.

"Não tendo provas, questiono um conjunto de factos, nomeadamente a tese de suicídio", disse à Lusa o autor.

Joaquim Mouzinho de Albuquerque, governador de Moçambique, capturou o régulo Gungunhana na batalha de Chaimite, que o Imperador Guilherme II da Alemanha considerou "o feito militar de maior audácia do século XIX", por isso o tendo condecorado com a Águia Vermelha.

O militar ter-se-á suicidado numa carruagem alugada, quando seguia na estrada das Laranjeiras, em Lisboa, a 08 de Janeiro de 1902.

A questão suscita dúvidas a Mascarenhas Gaivão, que reconstituiu as últimas horas, concluindo que "os actos corriqueiros que fez não indiciam a atitude dramática que tomaria poucas horas depois".

"Almoçou com a Família Real, pediu uma fotografia a D. Carlos, foi ao clube, foi buscar livros que tinha mandado encadernar na Ferin, onde comprou um livro que não apareceu depois junto ao corpo, foi ao oftalmologista porque tinha um derrame, cumprimentou entusiasticamente o irmão do Rei nos Restauradores, além das suas profundas convicções religiosas", disse o diplomata.

A este factos, Mascarenhas Gaivão acrescentou outros, nomeadamente o de o cadáver de Mouzinho ter duas balas na cabeça, pertencentes a uma arma "Bulldog" de calibre 45 quando habitualmente usava revólver, e o de o seu corpo ter sido encontrado caído para a frente quando deveria estar reclinado para trás.

António Mascarenhas Gaivão sustenta que "Mouzinho incomodava muita gente, não só os republicanos e carbonários, como elementos dos próprios partidos monárquicos. Tinha muitos inimigos em Lisboa".

Mesmo hoje, observa, seria um homem "difícil de compreender pelo seu patriotismo exacerbado, pela adoração sem limites à Família Real e pela escola militarista que perfilhava. À luz do pensamento de hoje, Mouzinho não era uma personalidade politicamente correcta".

Além do militar e estratega, Mascarenhas Gaivão dá especial ênfase ao papel de diplomata de Mouzinho, defendendo, tal como o historiador António Telo, que o seu périplo pelas capitais europeias, "mais do que para ser condecorado, tinha um segundo propósito: o de escutar as respectivas sensibilidades, caso o Rei decidisse suspender o regime parlamentarista, como veio a acontecer anos depois".

Outra questão que levanta dúvidas ao autor é a relacionada com uma carta atribuída a Mouzinho dirigida à Rainha D.ª Amélia em que lhe pede perdão por ir cometer suicídio e que reze por si.

Gaivão sublinha ter esta carta aparecido na Torre do Tombo "bastante mais tarde", o que lhe levanta "dúvidas", nunca por si resolvidas completamente porque não chegou a efectuar qualquer comparação de caligrafias.

O livro tem origem num trabalho académico de preparação para a carreira diplomática, o que não permitiu ao autor "certas pesquisas", nomeadamente num arquivo "muito desorganizado, que se encontra numa casa de família, em Estômbar".

António Mascarenhas Gaivão, 34 anos, licenciado em Economia e actualmente na carreira diplomática, salienta que "há que compreender Mouzinho na sua época" e recusa a ideia de que este livro é uma "reabilitação", embora reconhecendo que "o seu prestígio está esquecido".

"Se vivesse naquele tempo, por certo partilharia dos seus ideais", afirmou Mascarenhas Gaivão, que ainda é familiar do militar, colonialista e diplomata.

"A mulher de Mouzinho de Albuquerque, que morreu em 1950, na Rua das Trinas em Lisboa, era minha tia-bisavó", revelou o autor.

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