Eleições nos Açores. Depois de coligação de direita, PS tenta recuperar liderança açoriana

Os açorianos são este domingo chamados às urnas para eleger a composição da nova Assembleia Legislativa Regional. Pouco mais de três anos depois das eleições que mudaram o panorama político nos Açores, o Partido Socialista volta a ter esperança de assumir a liderança governativa. A coligação de direita que estava atualmente no Executivo não conseguiu terminar o mandato, mas PSD, CDS e PPM juntam-se de novo e concorrem como uma aliança, na expectativa de serem reeleitos. Olhamos as 11 forças políticas que se apresentam na corrida para o Governo Regional dos Açores.

No contexto nacional e político, as eleições deste domingo são as primeiras de 2024. Este ano, os portugueses vão ser chamados às urnas para votar, pelo menos, nas eleições nos Açores, nas Legislativas e para as Europeias. Mas este domingo os olhos estão postos nos eleitores açorianos. E apesar de o arquipélago ter um Governo Regional autónomo, estas eleições podem ter impacto no continente.

Depois de três anos com o PSD, o CDS-PP e PPM na liderança a interromper duas décadas de domínio socialista, estas eleições podem ser consideradas um teste. O PS quer recuperar o Executivo açoriano, mas a direita pode voltar a chegar a acordo com o Chega e conseguir formar Governo, caso os socialistas voltem a ter vantagem mas não a maioria.

Se se assemelhar às eleições de 2020, o PS pode também tentar acordo com os partidos da esquerda, como o BE ou a CDU, por exemplo.

Todos os cenários são possíveis e tanto a direita como a esquerda podem alcançar maioria no Parlamento, consoante os acordos. O objetivo comum de ambos os lados é ter o maior número de deputados eleitos.

Os partidos nos Açores alinham entendimentos para cenários pós-eleitorais com o PS ou com o PSD. A Iniciativa Liberal, por exemplo, disse que só pensa em acordos depois das eleições, mas Bloco de Esquerda e PAN anunciaram que já estão disponíveis para conversar.

Para além de se aproximarem as Eleições Legislativas no continente, há ainda um outro fator que pode influenciar os votos nos Açores: a crise política na Madeira que eclodiu em plena campanha.

Habitação, transportes, pobreza, turismo, saúde, ensino, agricultura e pescas estiveram entre os temas das ações de campanha para as eleições de domingo, com críticas à atual governação PSD/CDS-PP/PPM, mas também à anterior gestão socialista (no poder por 24 anos, 20 dos quais com maioria absoluta), e muitos dedos a apontar a necessidade de mais apoios aos diferentes setores por parte do Governo Regional.

A campanha eleitoral para as legislativas regionais dos Açores acabou na sexta-feira, com a participação de 11 forças políticas - oito partidos e três coligações. Mas o que distingue os candidatos que vão disputar os 57 lugares da Assembleia Legislativa?
PSD quer reeleição e estabilidade governativa

A experiência governativa do PSD, que rompeu 20 anos de liderança socialista, foi marcada por uma constante instabilidade, principalmente no que toca a apoio parlamentar, depois de o Chega e o IL terem quebrado o acordo de aliança. Instabilidade e perda de maioria que acabaram por conduzir à dissolução do Governo e à marcação destas eleições antecipadas.

Mas a coligação PSD, CDS e PPM volta a concorrer, encabeçada pelo líder social-democrata, e não nega que o objetivo é a maioria parlamentar, uma meta pode ser só alcançada com o apoio pós-eleitoral do Chega.

O próprio presidente do PSD, Luís Montenegro, numa visita ao arquipélago no início de janeiro, admitiu possíveis acordos de governação com o Chega.
Já para José Manuel Bolieiro as eleições deste domingo são, de uma forma simplista, uma escolha entre o atual projeto de governação e um "regresso ao passado": à governação socialista.

Apesar de ter afirmado mais do que uma vez que não está em cima da mesa uma coligação com o Chega, o lider do PSD/Açores também não nega essa possibilidade.
Durante a campanha, Bolieiro apelou ao voto útil para "continuar a governar bem os Açores" por mais quatro anos.

Sem nunca referir uma aliança ao Chega, o líder social-democrata quer ser reeleito e acredita que "é de interesse para os Açores uma maioria de estabilidade na coligação PSD/CDS-PP/PPM”.

Entre as medidas que a coligação de direita propõe destaca-se a criação de um fundo de garantia para os produtores de leite e a implementação do “Preço Açores” - uma “medida de caráter transitório” que visa regular o preço do cabaz de bens alimentares essenciais, cujo objetivo é poder aplicar, mediante determinadas condições, um desconto até 20 por cento nos produtos da região.

A coligação PSD/CDS-PP/PPM promete ainda dar continuidade a medidas como a Tarifa Açores, que permite a residentes no arquipélago viajar de avião entre ilhas por um valor máximo de 60 euros, ida e volta.
PS quer recuperar liderança e "combater extrema-direita"

O Partido Socialista tem em jogo o regresso ao Governo Regional, novamente sob a liderança de Vasco Cordeiro, que também pretende manter a Tarifa Açores, propondo retomar o transporte marítimo de passageiros e viaturas, além da privatização da Azores Airlines.

O candidato socialista tem uma missão muito clara para estas eleições: afastar a direita do poder, principalmente com acordos com o Chega.


Ainda por altura do Congresso Nacional do PS, Cordeiro comentou que o acordo do Chega com o PSD nos Açores era "um exemplo" do que as coligações de direita podiam fazer ao país.

"Quando aqui também se ouve que nunca o PSD se aliará ao Chega, olhem para aquilo que aconteceu nos Açores e têm a antevisão daquilo que acontecerá no país"
, declarou numa intervenção do encontro socialista.

O candidato do PS alertou mesmo, ao longo da campanha, que a região açoriana corre o risco de ser a primeira do país onde a extrema-direita entra para um governo.
O voto no PS, segundo Vasco Cordeiro, "permite afastar o Chega do Governo Regional".

O líder socialista acusou mesmo o PSD de "esconder os aliados da vergonha".

Sobre coligações à esquerda, caso não consiga a maioria absoluta, Cordeiro não adiantou nem negou a possibilidade de formar uma aliança com os partidos mais à esquerda, mas pediu aos eleitores uma “grande coligação de açorianos” em defesa da democracia e da tolerância. Quanto a cenários pós-eleitorais, o líder regional socialista reiterou que “o PS falará com todos os partidos democráticos, democratas, autonomistas e que partilhem” com os socialistas “valores de respeito e tolerância”, excluindo Chega e ADN.

De recordar que em 2020 o PS venceu as eleições, mas perdeu a maioria absoluta, dando possibilidade a que a direita formasse governo em coligação, num acordo que incluía o Chega e o Iniciativa Liberal.
Chega: acordos e desacordos sobre coligações

O Chega estreou-se na últimas eleições nos Açores, não tem um passado político histórico como o PS ou o PSD. Mas uma coisa é certa: à esquerda e à direita o nome do partido liderado por André Ventura tem sido mencionado pelos vários candidatos ao Governo Regional dos Açores.

À esquerda critica-se a formação de um Executivo com apoio parlamentar do Chega. À direita não se pronuncia certeza alguma sobre acordos pós-eleitorais. Contudo, se os resultados se repetirem, a coligação encabeçada pelo PSD, pode só conseguir formar novo Governo com um acordo do Chega.

Bolieiro não tem sido muito claro em dizer se considera o Chega para formar Governo, mas o próprio André Ventura já disse que, agora, não quer acordos de incidência parlamentar e admitiu discutir uma posição no governo da região. Durante a campanha, o Chega afirmou que o único acordo existente é “com o povo açoriano”, mas também a afirmação de que o objetivo é integrar um governo de direita, desde que sejam assumidos compromissos para uma estabilidade política, económica e social.

Em respostas às criticas dos opositores, André Ventura disse, numa visita ao arquipélago, que o partido quer trabalhar “para haver uma mudança a sério”.

O Chega, lembrou, “não é um partido de protesto”, mas “um partido de governo”, com propostas para diferentes áreas, e não quer repetir a experiência de entendimento assinado em 2020 com a coligação de direita, até porque esse governo se “portou mal” com o partido, sem cumprir os compromissos assumidos.

André Ventura não tem dúvidas de que as eleições nos Açores vão ser a grande inspiração para as legislativas nacionais.
No último comício em São Miguel, o presidente do Chega insistiu que o partido vai ter um grande resultado na região.

André Ventura afasta também responsabilidades pela crise política nos Açores e acrescenta que José Manuel Bolieiro vai ser julgado nas urnas por não ter apresentado um novo orçamento.
BE quer afastar toda a direita do poder

O Bloco de Esquerda dos Açores tem como primeiro objetivo manter os deputados que conquistou nas eleições de 2020. E como objetivo seguinte afastar a direita do poder legislativo da região.

“Votar no BE é o voto que é seguro, o voto numa esquerda que é de confiança que, no dia a seguir às eleições, servirá sempre para mudar de política e mudar de governo, para afastar o Chega e toda a direita que só criou pobreza e instabilidade”, afirmou o coordenador do BE/Açores e candidato às eleições, António Lima.

Frisando que o BE quer afastar o Chega e toda a direita do poder, criticou as “sucessivas maiorias absolutas, do PSD, do PS e agora esta maioria, esta coligação de todas as direitas, mantiveram os Açores na cauda de quase todos os indicadores sociais”. O bloquista não tem dúvidas de que a mudança de executivo, em 2020, deixou os Açores ainda piores do que estavam.

“A aliança entre a direita de José Manuel Bolieiro [PSD], o CDS de Artur Lima, o PPM de Paulo Estêvão, o Chega e a Iniciativa Liberal só trouxe aumento da pobreza e da desigualdade”, assim como o “aumento do nepotismo, das nomeações políticas para tudo e mais alguma coisa, dos negócios para amigos”.

Na luta para combater a direita, António Lima desafiou o cadidato do PS a "olhar para a sua esquerda" e para o diálogo "à esquerda" para que se possa "romper com a política de empobrecimento" no arquipélago.

Embora não haja histórico de uma "geringonça" da esquerda nos Açores, o BE manifetou, ao longo da campanha, estar disponível "para o diálogo", alegando ter um "programa eleitoral inteiro".

Aproveitando a crise política na Madeira, também Mariana Mortágua considerou que os Açores são "um exemplo dos problemas" que resultam do voto na direita para responder ao PS, lamentando que o arquipélago tenha aprendido "muito rápido com o exemplo da direita na Madeira".
Nas palavras da coordenadora do BE, a direita está a "oferecer um triste espetáculo" nas regiões autónomas.

A nível de programa eleitoral, o Bloco destaca a criação de um plano regional de habitação para “analisar o estado do setor e criar soluções para o futuro” e propõe que se comece a “regular e criar limites” ao alojamento local.

“Temos que atualizar toda a legislação regional sobre habitação, criar um plano regional de habitação, que permita analisar o estado do setor e criar soluções para o futuro, para além de medidas de emergência, como atualizar apoios ao arrendamento",
declarou durante a campanha António Lima.

Entre apelos ao voto útil para afastar a direita, o candidato também defendeu uma mudança de executivo: “Nós temos que quebrar com esta política que levou à falta de respostas para a habitação e que levou ao empobrecimento dos Açores, levou a que os Açores fossem uma região mais desigual hoje do que eram em 2020”.

Quando os açorianos forem às urnas, insistiu, é preciso “impedir que o Chega chegue ao Governo” e “garantir que não há um novo Governo de direita”.
IL acredita na reeleição de deputado

O deputado único do Iniciativa Liberal e candidato às eleições legislativas regionais tem apelado ao voto útil e pedido aos eleitores que “revejam o trabalho que foi feito”

“O apelo que eu faço [aos eleitores] é que revejam o trabalho que nós fizemos nos últimos três anos e meio. Com um deputado único, fizemos um trabalho que eu considero notável”, disse aos jornalistas Nuno Barata, numa sessão de campanha.

Pedindo aos cidadãos que "votem em consciência", Nuno Barata manifestou a disponibilidade do partido para "apresentar soluções de futuro", sem no entanto referir-se a novas coligações com o PSD.

“Falou-se muito do passado. Fala-se sempre muito das responsabilidades dos outros e apresentam-se poucas soluções”.

Nuno Barata espera ser reeleito para trabalhar “com o mesmo sentido de responsabilidade, com o mesmo empenho, com a mesma dedicação e sempre com o olho no futuro dos açorianos”. Em relação a resultados eleitorais, disse esperar que o partido possa manter a representação parlamentar e “eleger, pelo menos, mais um deputado”.

Recorde-se que em 2023, o deputado único do IL decidiu romper o acordo com a coligação que assumiu o poder na região e, quando o Orçamento foi chumbado, foi alvo de críticas, considerando que com a sua saída deixou de haver maioria parlamentar.
CDU quer "estabilidade política"

A CDU (a coligação do PCP e PEV), que em São Miguel concorre com Rui Teixeira, quer regressar ao hemiciclo depois de uma campanha em que defendeu a necessidade de haver estabilidade política, mas não “a qualquer custo”. A meta é regressar à assembleia regional.

Para o candidato comunista, “muito mais importante do que ter maiorias absolutas é ter quem na Assembleia lute por propostas para levar a região para a frente”.

E sobre a estabilidade política, que a CDU exige, diz que "esta só tem efeitos práticos se a vida dos cidadãos melhorar, o que não temos visto, mas sim instabilidade e pioria, tal como se viu nas maiorias absolutas anteriores”.

Aumentar salários, promover o direito à habitação para todos, valorizar a saúde, garantir mais transportes tanto da SATA, pública, como transportes terrestres, são as principais propostas da CDU, que está convicta de que vai eleger pelo menos um deputado para o parlamento regional, voltando assim ao hemicíclo, “crescendo em número de votos”.

Também Paulo Raimundo se manifestou confiante em conseguir pelo menos recuperar o deputado que perdeu em 2020.
Quanto ao acordo que vigorou nos últimos anos no arquipélago, o secretário-geral do PCP disse que o resultado final mostrou como este não servia o interesse dos açorianos.

Para a coligação que junta PCP e PEV, o PS “não é alternativa à coligação PSD/CDS-PP/PPM” nem vice-versa, uma vez que ambos se identificam com as "mesmas soluções”.

A CDU foi a única força política que se apresentou às eleições sem que o seu líder, Marco Varela, concorra por um círculo eleitoral. No maior círculo eleitoral, São Miguel, a opção foi pelo dirigente Rui Teixeira, surgindo pela compensação Paula Decq Mota, filha de um antigo líder regional e deputado, José Decq Mota.
PAN quer ser partido de oposição

O PAN conquistou um lugar na Assembleia Legislativa nas últimas eleições. Agora quer reeleger pelo menos um deputado e garante que pretende "ser oposição".

Numa ação de rua na baixa de Ponta Delgada, o candidato Pedro Neves manifestou-se contra qualquer solução governativa que inclua o Chega e deixou claro que o partido não quer ser governo, uma vez que "o PAN é um partido de oposição".

"Pedimos que haja mais confiança dos açorianos para que tenhamos um grupo parlamentar, analisando o partido pelo trabalho que foi realizado nos últimos três anos, tendo sido o partido com mais iniciativas aprovadas", afirmou dirigindo-se aos eleitores.

Também a coordenadora do partido, Inês Sousa Real, considerou que é "fundamental garantir a manutenção da representação parlamentar, aumentando sempre aquela que é a sua expressão".

Para o PAN, o Chega "é uma linha vermelha" e não pode haver negociações uma vez que o partido não negoceia com "forças antidemocráticas que põem em causa o Estado de Direito".

Vão ainda a eleições o Livre, o JPP e a coligação Alternativa 21, formada pelo Aliança e o Partido da Terra, que viram a candidatura rejeitada e só concorrem em Santa MariaEncabeçado por José Azevedo, o Livre prometeu que “fará a diferença” se conseguir entrar no Parlamento.

Carlos Furtado, eleito pelo Chega mas que se desvinculou do partido em menos de um ano, mantendo o seu apoio ao Governo Regional, é agora do JPP. O partido nascido na Madeira afirma-se entusiasmado com a estreia nos Açores e espera obter um dos 57 assentos parlamentares.

Já a Alternativa 21 (MPT/Aliança), que viu validada apenas a lista do círculo de Santa Maria, não anunciou qualquer iniciativa de campanha.