George Floyd. Forças policiais em Minneapolis protegidas por sindicatos e tribunais?

por RTP
Erin Scott - Reuters

São aos milhares os manifestantes que exigem a condenação dos polícias envolvidos na morte de George Floyd. Mas, muito antes do assassinato deste afro-americano, já se tentava introduzir reformas na polícia de Minneapolis e pôr fim à tolerância para com os atos de violência e racismo. Até agora, sem sucesso.

A luta por uma revisão e uma mudança no tipo de policiamento na cidade de Minneapolis já é antiga, mas perante um poderoso sindicato de polícias, com cerca de 800 membros que defendem táticas policiais de estilo militar, os esforços têm sido em vão.

O compromisso existente entre o sindicato dos polícias e o governo da cidade é um obstáculo para quem pretende justiça depois de abordagens mais violentas por parte das autoridades. A verdade é que raramente os agentes da polícia são punidos ou sancionados.

Derek Chauvin, o polícia incriminado pela morte de George Floyd, foi acusado de homicídio em terceiro grau e, depois, de homicídio em segundo grau, sendo ainda demitido das suas funções. Os outros três agentes envolvidos foram despedidos e só mais tarde acusados.

O vídeo de Chauvin ajoelhado no pescoço de Floyd por quase nove minutos, até este morrer, parece aos olhos da maioria muito claro, tornando-se dificil conseguir desculpar tais ações. Mas com o historial de tolerância e imunidade das forças policiais naquela cidade norte-americana, já há quem receie que o caso seja esquecido e não haja qualquer sanção jurídica para Derek Chauvin.

Uma análise feita pela Reuters às denúncias contra polícias de Minneapolis, nos últimos oito anos, revela que nove em cada dez acusações por má conduta ou violência foram resolvidas sem que os agentes enfrentassem qualquer tipo de punição. Das cerca de três mil reclamações que a Reuters investigou, apenas cinco oficiais foram despedidos.
George Floyd, um criminoso violento"
Esta semana, o presidente do sindicato dos polícias de Minneapolis, Bob Kroll, descreveu George Floyd como um "criminoso violento". Numa carta dirigida aos sindicalistas, Kroll chamou ainda "terrorista" a todos os que se têm manifestado contra o homicídio de Floyd e criticou os líderes políticos de Minneapolis por impedirem o uso de força para impedir os tumultos.

"O que não referem é o violento historial criminal de George Floyd. Os media não falam disso", escreveu Kroll.

George Floyd, de facto, já tinha cumprido uma pena de prisão por roubo, mas Derek Chauvin não sabia disso quando o deteve a 25 de maio. Além disso, as imagens do vídeo mostram que Floyd não teve qualquer ato de violência durante a detenção, não estava armado e não era suspeito de nenhum crime violento.

Kroll acrescentou ainda na carta que tem estado a trabalhar com os advogados dos quatro polícias envolvidos no assassinato de Floyd para que estes não percam os empregos.

Para o presidente do sindicato dos polícias, os protestos diários que têm agitado várias cidades dos Estados Unidos são organizados por terroristas.

"Esse movimento terrorista que está a decorrer agora foi preparado durante um longo período", disse ainda.

Uma antiga chefe da polícia de Minneapolis, Janeé Harteau, repudiou a carta de Bob Kroll, considerando que o documento não era adequado para um agente de autoridade.

"Uma vergonha para o distintivo! Esta é a guerra contra a qual eu e outros lutamos. Bob Kroll entregue o seu distintivo", escreveu Harteau no Twitter.



Harteau já anteriormente tinha estado contra Kroll numa tentativa de reformar um departamento com historial de abusos raciais. No entanto, a ex-chefe da Polícia admitiu ao Guardian que o presidente do sindicato conseguia ter mais poder na cidade do que o próprio chefe da Polícia.

"O sindicato dos polícias historicamente teve sempre mais influência sobre a cultura policial do que qualquer chefe de polícia jamais conseguiu", disse Harteau, explicando que é essa influência e poder do sindicato que tem impedido a reforma nos departamentos da Polícia de Minneapolis, mantendo-se, por isso, as táticas "da velha escola", os abusos por parte dos agentes da polícia e a desresponsabilização pela má conduta.
O que impede a mudança?
O autarca de Minneapolis, Jacob Frey, foi eleito com a promessa de reformar o departamento de polícia, nomeadamente na área do policiamento comunitário. Mas Frey considera que o maior obstáculo a qualquer mudança é Bob Kroll e a sua liderança do sindicato.

O presidente do sindicato acusa, na carta, o autarca da cidade e o governador do Estado do Minnesota de não reconhecerem o trabalho do Departamento da Polícia de Minneapolis e de culparem as forças policiais pela violência.

"É um comportamento desprezível. Como a nossa equipa de comando pode tolerar e viver com isto, eu não sei", escreveu Bob Kroll.

À lista das vozes críticas a Bob Kroll, junta-se também a atual chefe da Polícia de Minneapolis, Medaria Arrandondo, que é afro-americana e demitiu Chauvin e os três outros policias.

A verdade é que para muitos, a nomeação de uma chefe da Polícia afro-americana, para suceder  a Harteau em 2017, foi um claro sinal de progresso. No entanto, nos últimos anos, o esforço para mudar algumas táticas policias foi dificultado pelo aumento da militarização da polícia em todo o país.

Os polícias em Minneapolis ainda estão protegidos por uma lei que lhes confere imunidade qualificada, criada e reforçada pelo Supremo Tribunal Federal, e que protege os agentes de qualquer responsabilidade civil. Com a morte de George Floyd, surgem questões quanto à possível responsabilização e punição dos autores deste assassinato.
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