Material que substitui amianto nas escolas "é tóxico e altamente inflamável"

por RTP
Reuters

Materiais mais económicos, muitas vezes inflamáveis e menos duráveis estão a comprometer a segurança dos edifícios, nomeadamente das escolas. O alerta é da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza, que diz que as coberturas de amianto existentes nos estabelecimentos de ensino estão a ser substituídas por material "altamente inflamável" e até cancerígeno. O ministro da Educação já veio dizer que os regulamentos em vigor estão a ser respeitados.

A denúncia já tinha sido feita ao jornal Público pela coordenadora da Quercus. À RTP Carmen Lima disse que há escolas que estão a utilizar este tipo de material – o poliuretano – que é dos mais baratos do mercado e que tem impactos na saúde humana e no ambiente.A Quercus lembra que o que dita a qualidade construtiva de um edifício é o tipo de materiais utilizados e a forma como são especificados em soluções adequadas.


“Nós não conseguimos confirmar quais são as escolas que estão a ser substituídas por material poliuretano (…) Esse painel sanduiche possui no seu interior placas de poliuretano. A partir do momento em que o dono da obra, que é o ministério da Educação, optar pelo material mais barato, vai estar a optar por um material que possui placas de poliuretano, logo é altamente inflamável e também tem um grande impacto ambiental porque provém do petróleo”.

A Associação Nacional de Conservação da Natureza tem alertado para a necessidade do uso de materiais mais amigos do ambiente e que promovam a segurança e saúde dos seus utilizadores. “Para tal é necessário que estes estejam conscientes disso, caso contrário vamos continuar a assistir a outras tragédias”.

“Temos aqui uma substituição de um material como o amianto que tem impactos na saúde a longo prazo por uma substituição por um material que poderá vir a ter impacto a curto, médio prazo, uma vez que em termos de segurança não é um material resistente ao fogo. Se houver algum acidente, como foi o caso da coletividade de Tondela, a propagação do fogo vai existir de uma forma muito rápida”.

“As regras para utilização de materiais e as suas classes de reação ao fogo estão bem especificadas na regulamentação de Segurança Contra Incêndios em Edifícios (SCIE). Convém lembrar que estas exigências se referem às condições de aplicação final em obra e advém de diretivas Europeias, mas que se aplicam em geral, aos revestimentos interiores de tetos, de paredes e de pisos”, alerta a Quercus.

A associação ambientalista defende que a especificação de materiais em obra deve ser mais consciente e zeladora da saúde e segurança dos posteriores utilizadores. “Um material de construção mais económico pode significar um valor completamente inflacionado durante a utilização do edifício. Os materiais devem ser escolhidos tendo em consideração a sua durabilidade, a sua inocuidade à saúde (uma vez que muitos materiais libertam Compostos Orgânicos Voláteis ou outros poluentes), a sua reação ao fogo, a sua capacidade de reciclagem, a sua baixa manutenção, entre outros”.

No caso concreto do amianto, a Quercus considera que é positivo substituir este material por outros que não comprometam a salubridade do edifício. “No caso do já referido poliuretano, que deriva do petróleo e combustível, para além de que na sua fabricação e durante a sua utilização liberta gases tóxicos nocivos ao ambiente e à saúde”.

A coordenadora da Quercus considera “lamentável que em edifícios dedicados a crianças não esteja em primeiro plano a avaliação da qualidade dos materiais quer em termos de saúde quer em termos ambientais”.
Perigo dos fumos durante a queima
Para o investigador do Instituto Superior Técnico, João Bordado, especialista em materiais poliméricos, neste tipo de obras não se pode estar a comprar o mais barato mas o que cumpre as regras de segurança.

“Por questões de segurança não faz sentido estar a pôr uma quantidade de material inflamável em cima da cabeça das pessoas. Se aquilo começar a arder numa ponta vai por ali fora e como, ainda por cima, faz fumos pretos, as pessoas até podem ter dificuldade em encontrar a saída, além de o fumo ser muito tóxico”.

O investigador alerta ainda que há muitos tipos de poliuretano. “O fabricante do painel sanduíche pode usar um tipo de poliuretano que seja retardante de chama (...) mas são um bocadinho mais caros, 20 ou 30 por cento mais caros”.

“O que eu suspeito que acontece nestes casos é que o construtor civil que faz a execução, limita-se a comprar o poliuretano sem exigir que seja retardante de chama, e isso é que não pode ser”, revelou à RTP João Bordado.

O investigador alerta ainda para os perigos dos fumos durante a queima. “O que é perigoso são os fumos. Durante a queima, formam uma pequena quantidade de ácido cianídrico que é de facto tóxico”.
"Regulamentos estão a ser respeitados"
No Parlamento, o ministro da Educação reagiu entretanto à polémica para dizer que o Governo não poupa na segurança.

"O Governo não deu indicações, sugestões ou recomendações para se poupar em materiais que não estão na legislação, são perigosos ou que ponham em risco a saúde das nossas crianças, dos nossos docentes e todos os que trabalham nas escolas".

Tiago Brandão Rodrigues referiu ainda que os regulamentos em vigor estão a ser respeitados: "O poliuretano está classificado pela agência internacional de investigação da Organização Mundial de Saúde (OMS), no grupo III, e não existe nenhum tipo de indicação que tenha propriedades cancerígenas. A sua cancerigenidade não é apontada como preocupante".

Numa resposta remetida por email à RTP, o Ministério de Tiago Brandão Rodrigues explica que, "no que respeita ao material que está a ser utilizado para substituir as coberturas de fibrocimento, os materiais adotados variam consoante a solução construtiva pré-existente nos edifícios escolares a intervencionar".

"Na seleção dos materiais e soluções construtivas é cumprida a legislação e regulamentação aplicáveis", insiste a tutela.

"As intervenções em obras são devidamente fiscalizadas em todas as suas componentes, nomeadamente no que respeita à segurança contra incêndios", lê-se no mesmo texto.
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