Portugal entre os melhores da Europa no combate ao VIH

por RTP
"Exemplar" é o adjetivo escolhido pelo coordenador do programa de Doenças Transmissíveis da OMS, Masoud Dara Mike Hutchings - Reuters

Portugal está no restrito grupo de países europeus que têm mais pessoas diagnosticadas com VIH e mais doentes em tratamento que deixaram de transmitir a infeção, revelou esta quinta-feira um responsável da Organização Mundial da Saúde (OMS). O secretário de Estado da Saúde aponta “um dia histórico”.

"Portugal tem feito um percurso exemplar na prevenção, deteção, tratamento e cuidados dos doentes com VIH", afirmou Masoud Dara em entrevista à Lusa, sublinhando que o país atingiu praticamente todos os objetivos estabelecidos no programa das Nações Unidas para o VIH/sida - ONUSIDA, conhecido como 90/90/90.Os resultados de Portugal no âmbito nas metas 90-90-90 do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o VIH/SIDA (ONUSIDA) são apresentados esta quinta-feira numa sessão promovida pela Direção-Geral de Saúde, presidida pelo secretário de Estado Adjunto da Saúde, Fernando Araújo.

O programa pretende que, até 2020, 90 por cento das pessoas com VIH/sida estejam diagnosticadas, que 90 por cento dos diagnosticados estejam em tratamento e que 90 por cento dos que estão em tratamento atinjam uma carga viral indetetável ao ponto de ser impossível transmitir a infeção.

"Exemplar" é o adjetivo escolhido pelo coordenador do programa de Doenças Transmissíveis da OMS, Masoud Dara, que coloca assim Portugal ao lado de países como a Dinamarca, a Islândia, a Suécia, a Grã-Bretanha e a Irlanda do Norte, que já alcançaram a meta dos 90-90-90.

No entanto, a média dos 53 países europeus que participam no programa revelam uma situação preocupante: apenas 69 por cento de doentes estão identificados, a maioria não está em tratamento (58 por cento) e apenas 36 por cento de doentes que estão em tratamento deixaram de ser uma ameaça na transmissão do vírus, segundo dados avançados à Lusa pelo responsável.

Masoud Dara aponta a situação vivida nos países da Europa de Leste como a principal razão para estas percentagens tão baixas, já que naquela região do globo a sida continua a ser um assunto tabu.A sessão de apresentação do relatório sobre Portugal inclui comunicações de especialistas sobre a estratégia da qualidade dos dados da infeção por VIH e as metas 90-90-90.

"Em 2016, havia 160 mil novos infetados na Europa, dos quais 80 por cento viviam em países de leste", lamentou, explicando que naquela região o número de novos doentes continua a aumentar, em parte por falta de prevenção e limitado acesso a tratamentos.

Resultado: no leste estão diagnosticados apenas 63 por cento dos doentes, só um em cada quatro (28 por cento) está em tratamento e 88 por cento dos doentes em tratamento continuam a ser um perigo em termos de transmissão do vírus.
“Dia histórico” na luta contra o VIH
Em Portugal, mais de 90 por cento das pessoas com VIH estão diagnosticados e mais de 90 por cento das que estão em tratamento já não transmitem a infeção, anunciou o secretário de Estado da Saúde em entrevista à Lusa, considerando que se trata de um “dia histórico”.

Antena 1

Portugal tinha até 2020 para conseguir atingir aqueles dois objetivos definidos pelo programa das Nações Unidas para o VIH/sida (ONUSIDA), conhecido como 90-90-90.

"Hoje é um dia histórico em que Portugal alcançou dois dos três" objetivos estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), afirmou o secretário de Estado da Saúde, Fernando Araújo. Nos finais dos anos 1980 e inícios dos anos 1990, Portugal era um dos países europeus onde surgiam mais novos casos de infeção, uma realidade que veio a diminuir ano após ano.

Segundo o governante, “com a identificação dos doentes, será mais fácil para os serviços de saúde conseguirem encaminhar as pessoas para os tratamentos”.

Ter 90 por cento dos doentes diagnosticados em tratamento é precisamente o objetivo do programa que falta a Portugal, mas Fernando Araújo acredita que tal poderá acontecer ainda este ano.

É que os dados agora revelados dizem respeito a 2016, altura em que havia já 87 por cento dos doentes diagnosticados e Fernando Araújo lembro que foi precisamente nesse ano que se começou a generalizar o uso da terapêutica anti retrovírica para todos os infetados.

"A nossa espectativa é que, eventualmente, em 2017 ou em 2018 podemos vir seguramente a atingir este 90 e ser um dos países mais avançados nesta área", frisou.

Portugal surge como um caso de sucesso, até porque começou o programa com números assustadores: "Parimos com uma base desfavorável e temos vindo ao longo dos anos a construir respostas adequadas para atingir esses objetivos".

Nos últimos anos, equipas do Ministério da Saúde fizeram uma recolha de dados a nível nacional, tendo voltado a notificar todos os casos para perceber o que se passava.

No final, perceberam que muitos tinham morrido, outros estavam hospitalizados, outros tinham regressado, explicou o governante.
Toxicodependentes: 1,5% dos novos casos

Portugal atingiu a taxa mais baixa de sempre de novas infeções de VIH entre pessoas com comportamentos aditivos e dependências, que atualmente representam apenas 1,5 por cento dos novos casos de sida, anunciou o secretário de Estado da Saúde.

Dez anos após ter sido identificado o primeiro caso de VIH no país, foi criado o programa de troca de seringas, com o objetivo de prevenir as infeções entre as pessoas que utilizam drogas injetáveis.O programa de troca de seringas serve para prevenir infeções pelo VIH, mas também pelos vírus das hepatites B e C e começou limitado às farmácias comunitárias, tendo posteriormente sido assegurado pelos centros de saúde e postos móveis.

Assim, numa altura em que mais de metade dos novos casos de sida era de pessoas com comportamentos aditivos, começou a distribuição de material esterilizado e da recolha e destruição das seringas usadas.

No ano passado, apenas 1,5 por cento dos novos casos dizem respeito a esta população, disse o secretário de Estado da saúde, Fernando Araújo.

"O nível de novos casos reduziu-se de forma muito significativa, o que significa que estamos a ter um sucesso dos melhores a nível europeu", salientou o secretário de Estado Adjunto da Saúde.

"A luta no combate ao aparecimento de novos casos continua, independentemente de se tratar ou não de um grupo de risco, e este ano o Governo arrancou com um novo programa: a profilaxia pré-exposição" (PrEP), que permite proteger as pessoas de infeções através da toma de medicamentos, avançou.

"Estamos a começar agora nos hospitais do país", contou Fernando Araújo, sublinhando que o ministério quer "agarrar todos os tratamentos para evitar novos casos".
Testes feitos em casa
Os portugueses vão poder fazer em casa testes de despiste do VIH, anunciou o secretário de Estado da Saúde, que espera que esta opção seja uma realidade ainda este ano.

Fernando Araújo revelou que o Governo vai começar a trabalhar para alterar a legislação em vigor, que impede a realização de testes de VIH em casa.Com a iniciativa o Ministério da Saúde espera conseguir reduzir os casos de deteção tardia de pessoas infetadas com sida.

"Vamos mudar a lei para que, até ao final do ano, os portugueses que quiserem possam comprar o teste na farmácia e fazer em casa", afirmou.

No caso de os testes serem positivos, os doentes podem marcar uma consulta num hospital "para repetirem o teste e serem reorientados", acrescentou.

Segundo Fernando Araújo, quem opta por este sistema são pessoas que não recorrem a outros serviços de saúde e os países onde esta possibilidade já existe revelam que a medida é um sucesso.

"Em geral, impede novas transmissões. As pessoas ao saberem que estão infetadas tendem a proteger-se para evitar a disseminação", acrescentou, frisando que esta será apenas mais uma alternativa às já existentes.Também as farmácias devem começar a realizar testes rápidos de rastreio ao VIH/sida e hepatites B e C já em agosto, acrescentou o governante, explicando que o processo de formação dos profissionais está a terminar.

Diagnosticar cada vez mais cedo para evitar novos contágios é um dos desafios da tutela que reconhece que em Portugal há uma "elevada taxa" de diagnósticos tardios, acrescentou.

O secretário de Estado lembrou que atualmente é possível realizar testes de despiste nos centros de saúde e hospitais, assim como em muitas ONG (Organizações Não Governamentais) "que fazem um trabalho espetacular em Portugal".

Junto da comunidade prisional, mas também com as grávidas, já existe um trabalho de deteção, mas o secretário de Estado considerou insuficiente.

"Temos um sistema montado, mas achamos que não é suficiente. Apesar de termos esse acesso muito facilitado, continuamos a ter infeções tardias", lamentou.
Alargado o tratamento em farmácias
O secretário de Estado da Saúde anunciou ainda que o projeto-piloto que permite aos doentes com VIH fazer os tratamentos em farmácias mais próximas poderá ser alargado a todo o país.
A medida, que ainda está a ser testada apenas em Lisboa, veio permitir aos utentes escolher se queriam continuar a receber os tratamentos no hospital ou numa farmácia próxima de casa ou do trabalho.
Na entrevista à agência Lusa, o secretário de Estado da Saúde, afirmou que o projeto-piloto de dispensa de medicamentos hospitalares nas farmácias comunitárias, que começou no ano passado, "está a correr bem".

"O objetivo é abrir este projeto ao país todo e, de forma faseada e progressiva, outras farmácias hospitalares vão poder trabalhar com farmácias comunitárias", anunciou.

Mas primeiro será necessário avançar com a formação de mais farmacêuticos para garantir que o alargamento do projeto é feito com toda a segurança, observou o governante.Segundo números avançados pelo responsável, muito em breve, mais de trezentas pessoas estarão a beneficiar desta medida, que será alvo de avaliação em setembro.

Segundo o Fernando Araújo, "as pessoas estão confiantes", houve um aumento de aderentes ao projeto e "os tratamentos estão a correr como esperado".

O governante disse que optar por uma farmácia comunitária "é tão eficaz como fazer (o tratamento) no hospital" e, por isso, o Ministério da Saúde está empenhado em "continuar este percurso e alargar a todo o país".

"Queremos iniciar nos grandes hospitais, no norte e no centro, e depoisdisseminar no resto do país", revelou, acrescentando que no último trimestre será alargado a outras regiões do país.

O projeto foi criado para garantir que as pessoas não interrompiam a medicação, o que por vezes acontece, principalmente entre os utentes com mais dificuldades económicas, que por vezes deixam de se deslocar à farmácia hospitalar, explicou.

Esta é mais uma medida que poderá aumentar a percentagem de doentes em tratamento.

c/ Lusa
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