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Morreu o escritor Urbano Tavares Rodrigues

por RTP
O escritor rodeado de livros em sua casa. Mário Galego/Antena 1


Morreu esta sexta-feira, aos 89 anos, Urbano Tavares Rodrigues - militante comunista e professor de Literatura, o escritor encontrava-se internado há três dias no Hospital dos Capuchos, em Lisboa. O seu derradeiro livro, Escutando o rumor da vida seguido de solidão em brasa, fora editado há perto de um ano.

Nessa altura, entrevistado pelo Ípsilon, suplemento do jornal Público, Urbano Tavares Rodrigues diria: "Sinto que não vou viver muito. Um dos meus médicos diz-me, meio a brincar, que é um milagre eu estar vivo".

No final de 2012, numa conversa com o jornalista da Antena 1 Mário Galego, o grande romancista do Alentejo, brilhante novelista e professor, contou a vida que teve, os livros que escreveu e ainda estava a escrever, falou sobre as opções que tomou na vida.

Nascido em dezembro de 1923, Urbano Tavares Rodrigues iria fazer 90 anos. Filho do também escritor Urbano Rodrigues, a sua escrita revela fortemente a influência do campo alentejano e das suas gentes, recebida durante a infância passada em Moura, onde nasceu no seio de uma família de grandes proprietários agrícolas.

Autor de dezenas de romances e novelas, considerava ter sido influenciado pelo existencialismo francês da década de 50.
Uma vida cheia
Como repórter, Urbano Tavares Rodrigues viajou pelo mundo inteiro, tendo reunido as suas crónicas nos volumes Santiago de Compostela (1949), Jornadas no Oriente (1956) e Jornadas na Europa (1958).

Escreveu ainda em jornais e revistas como o Bulletin des Études Portugaises, a Colóquio-Letras, o Jornal de Letras, Vértice, Nouvel Observateur, entre outros, tendo sido ainda diretor da revista Europa e crítico de teatro nos jornais O Século e Diário de Lisboa.

De educação católica tradicional, virou as costas à religião durante a adolescência, por questões de coerência moral. Considerando-se um  "comunista heterodoxo", Urbano Tavares Rodrigues assumiu igualmente, por diversas vezes, críticas ferozes ao estalinismo.
"Uma vez chateei-me com um tipo do partido que queria que eu pusesse mais sangue, mais vermelho naquilo que escrevia. Eu disse-lhe que punha o vermelho que entendesse" - Urbano Tavares Rodrigues
Apesar de ter pertencido à direção intelectual do PC, recusou sempre tornar as suas obras um instrumento de combate, embora reconhecesse que a ideologia que professava se refletia na escrita.

A sua independência intelectual trouxe-lhe aliás problemas dentro do Partido Comunista, embora nunca tivesse abandonado a militância.

Pagou ainda outro preço: impedido de lecionar em Portugal, foi leitor de português nas universidades de Montpellier, Aix e Paris, entre os anos de 1949 e 1955.
Sobre a obra
Preso em Caxias durante o salazarismo, Urbano Tavares Rodrigues tornou-se autor da literatura de resistência, seguindo-se, após o regresso a Portugal com o 25 de Abril, um período menos negro. A sua obra reflete sempre a preocupação com a consciência do indivíduo face a si mesmo e aos outros. "A minha função não é julgar. É trabalhar sobre os sentimentos, sobre a palavra", disse Urbano Tavares Rodrigues em 2012 ao Ípsilon.

"Não consigo escrever qualquer coisa que seja completamente nova, mas consigo escrever de uma maneira nova e cada vez mais olho o amor como uma necessidade absoluta do mundo."

"Uso a palavra amor no sentido mais lato, não só sexual. A grande lição para o mundo futuro é uma grande dose de amor, de compreensão dos outros. Não sei se nota isso nos meus livros."
"Merecia o Prémio Camões"
Um dos autores portugueses mais prolíficos da segundam metade do séc. XX, Urbano Tavares Rodrigues recebeu vários galardões literários, nomeadamente o Prémio Ricardo Malheiros, com a obra Uma Pedrada no Charco, o Prémio da Associação Internacional de Críticos Literários, o Prémio da Imprensa Cultural, o Prémio Vida Literária da Associação Portuguesa de Escritores e o Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco.

Mas ao Ípsilon, na mesma entrevista, confessava-se desiludido por nunca ter recebido o Prémio Camões, facto que atribua às suas convicções políticas.

"Ainda não tive o prémio Camões porque soube recentemente que há membros do júri que dizem: esse comunista não terá o Prémio Camões", acusou, revoltado.

"Mereço amplamente o Prémio Camões. Não é pelas honrarias, que já tive muitas. Até em França já me deram a Legião de Honra, mas isto é asqueroso".
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