José Sócrates abandona liderança do PS

por RTP
“Deixarei a primeira linha da atividade política e não pretendo ocupar qualquer cargo político” Mário Cruz, Lusa

O secretário-geral do Partido Socialista (PS) e candidato a primeiro-ministro anunciou o pedido de demissão na sequência dos resultados eleitorais. O PS teve 28,05 por cento dos votos, elegendo 73 deputados à Assembleia da República. José Sócrates assumiu a responsabilidade pela derrota e considerou ter chegado o momento para abrir um novo ciclo no partido.

“Esta derrota eleitoral é minha e quero assumi-la por inteiro esta noite. Entendo, por isso, que é chegado o momento de abrir um novo ciclo político na liderança do Partido Socialista, que seja capaz de cumprir aquele que é, a partir de hoje, o principal dever do PS: preparar uma alternativa consistente, credível e mobilizadora para voltar a governar Portugal”, disse José Sócrates aos militantes.

José Sócrates anunciou que já pediu ao presidente do PS, Almeida Santos, para desencadear o processo que vai eleger a nova direção do PS. “Pela minha parte, encerro hoje mais uma etapa de um longo percurso de 23 anos de exercício das mais diversas funções políticas”, acrescentou, revelando que regressa “à honrosa condição de militante de base do PS”.

Abstenção recorde em legislativas desde 1976:
A abstenção em processo eleitoral para a Assembleia da República atingiu a taxa mais elevada de sempre: 41,1 por cento. Estavam inscritos 9.429.024 eleitores, tendo votado 5.554.002, de acordo com os dados da Comissão Nacional de Eleitores.

Com 226 dos 230 mandatos atribuídos, a afluência registada em território nacional foi de 58,9 por cento. Faltam apenas apurar os quatro deputados eleitos pelos círculos Europa e Fora da Europa, conhecidos dia 15. Já nas legislativas de 2009, a taxa de abstencionistas fora elevada: 40,32 por cento.

O quadro completo dos resultados é o seguinte:

- PSD 38.63 por cento - 105 deputados;
- PS 28,05 por cento - 73 mandatos;
- CDS-PP 11,74 por cento - 24 mandatos;
- Coligação PCP-PEV 7,94 por cento - 16 mandatos;
- Bloco de Esquerda 5,19 por cento - 8 mandatos
 - Abstenção - 41.1 por cento;
- Votos Brancos 2,67 por cento:
 -Votos Nulos 1,36 por cento.

Com o intuito de não condicionar a futura liderança do partido, Sócrates comunicou que vai deixar “a primeira linha da atividade política e não pretendo ocupar qualquer cargo político”. No entanto, o primeiro-ministro demissionário deixa a porta aberta para a intervenção pública, uma vez que a condição de cidadão implica uma participação ativa no debate político.

Sócrates reivindica medidas difíceis apesar do preço da impopularidade
Previamente, Sócrates disse ter felicitado o presidente do PSD pela vitória nas legislativas e desejou sucesso para o mandato. “Nunca o país precisou tanto de diálogo, entendimento e concertação como agora”, disse o primeiro-ministro demissionário.

Sócrates apontou o contexto nacional e internacional “extraordinariamente difícil” que, na sua perspetiva, não permite avaliar a evolução da qualidade de vida em Portugal nos últimos seis anos.

Depois, notou que os resultados obtidos dignificam o partido e destacou a solidariedade no PS. Sócrates considera que a sua governação enfrentou “tempos tão difíceis como os que têm de ser estudados nos livros de História, tal como hoje se estudam outras grandes crises do passado”. “Tomámos medidas difíceis a pensar no futuro do país e aceitando correr os riscos partidários da impopularidade”, acrescentou.

A campanha eleitoral, que classificou de “forte, com entusiasmo e dedicação”, foi outro dos temas do discurso de José Sócrates, que disse não saber “o que mais poderíamos ter feito para ganhar estas eleições”. Sem especificar nomes, o líder demissionário agradeceu a dirigentes, autarcas e aos membros do Governo que o acompanharam.

"Não levo nem ressentimentos nem amarguras. Não são essas companhias que quero para os dias felizes que tenho à minha frente", declarou José Sócrates, na parte final do seu discurso aos militantes.

“O meu coração está preenchido, não há nele outro sentimento que não seja o amor ao meu país, amor aos meus compatriotas e gratidão - uma profunda gratidão por os portugueses me terem dado uma extraordinária oportunidade e a suprema honra de como primeiro-ministro poder servir o meu país, esse país que é Portugal", concluiu.

Justiça e política
Quando questionado se receia que a derrota eleitoral permita a evolução de processos judiciais ou acelere outros em que o nome de José Sócrates chegou a ser mencionado, o ex-primeiro-ministro preferiu apontar o princípio de separação de poderes do Estado de Direito.

"Eu não consigo compreender essa pergunta, pela simples razão de que a justiça nada tem a ver com a política. E o que eu desejo é viver num país em que essa separação esteja absolutamente ao serviço do Estado de Direito", disse, sem responder diretamente à questão. “É melhor passarmos a outra pergunta", afirmou José Sócrates.

Em relação à necessidade de compromissos e entendimentos defendida durante a campanha eleitoral, José Sócrates faz agora uma inflexão. “A partir do momento em que o PS entrar num novo ciclo político, a tarefa principal do PS será servir o seu país na oposição e construir uma alternativa credível, forte e mobilizadora para voltar a governar”, notou.

No período de respostas aos jornalistas, cujas perguntas mereceram vaias dos militantes socialistas, José Sócrates explicou porque abandona todos os cargos políticos.

O antigo primeiro-ministro e ministro do Ambiente sublinhou que a sua decisão de afastamento “tem apenas a ver com a intenção de não querer condicionar a próxima liderança socialista”, garantindo que o seu “amor ao país nada tem a ver com o exercício dos cargos políticos”.

O deputado do PS António José Seguro declarou que pretende refletir "com calma e serenidade" sobre a possibilidade de protagonizar uma candidatura à liderança, prometendo para "muito brevemente" uma posição sobre o assunto. Sobre a sua participação pública, Sócrates apenas reiterou que não tem qualquer intenção de ocupar um cargo político nos próximos anos, guardando um sentimento de “dever cumprido”.

José Sócrates também não respondeu à questão sobre quem considerava como o mais provável sucessor na liderança do PS, apenas dizendo que a escolha dos militantes será feita “muito em breve”.
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