Fonte dos Panama Papers quebra o silêncio: “Chegou a hora de agir”

por Christopher Marques - RTP
Carlos Jasso - Reuters

A fonte que divulgou os documentos da Mossack Fonseca quebrou o silêncio. Num manifesto publicado no jornal alemão Süddeutsche Zeitung, a fonte volta a recorrer ao pseudónimo John Doe para manter o anonimato mas mostra-se disposta a cooperar com as autoridades. John Doe garante que não é um agente secreto ao serviço de um Governo e afirma que vários órgãos de comunicação social não quiseram receber os documentos.

Tinha-se mantido em silêncio até agora e pouco se sabia sobre a pessoa que permitiu a investigação Panama Papers. Agora, mantém-se o segredo quanto à sua identidade, mas percebe-se quais os seus objetivos e a forma como se tem desenvolvido a investigação.

Num texto publicado no jornal alemão Süddeutsche Zeitung, a fonte volta a identificar-se como “John Doe”. Garante que não trabalha para nenhum Governo ou agência secreta e explica as suas motivações.

“Decidi denunciar a Mossack Fonseca porque considero que os seus fundadores, empregados e clientes devem ser confrontados com o seu papel nestes crimes”, escreve, salientando que só alguns dos crimes foram revelados pela investigação até ao momento.
"Corrupção massiva e generalizada"
No manifesto, o whistleblower começa por referir que a desigualdade na distribuição de rendimentos é uma das características desta era, questionando o porquê. John Doe encontra a resposta na “corrupção massiva e generalizada” que expõe nos documentos do Panamá.

“Mais do que um mero componente da máquina de gestão de fortunas, a Mossack Fonseca utilizou a sua influência para escrever e distorcer leis em todo o mundo em favor de interesses criminosos durante décadas”, escreve.

John Doe relembra que as empresas offshore não são ilegais mas sublinha que estão associadas a um grande conjunto de crimes, que ultrapassam a evasão fiscal.

Traçado o quadro, John Doe considera que “chegou a hora de agir verdadeiramente”, pedindo à Comissão Europeia, ao Parlamento britânico, ao Congresso norte-americano e às restantes nações que tomem medidas para porem "fim aos abusos dos registos de comércio”.

O whistleblower critica ainda os bancos, reguladores e autoridades fiscais, acusando-os de ter falhado. “As decisões tomadas tomaram como alvo os cidadãos de baixo e médio rendimento, deixando de fora os mais ricos”, acusa.
Media "controlados por milionários"
O ataque é também dirigido aos órgãos de comunicação social. John Doe garante que não foi só o Süddeutsche Zeitung e o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação que tiveram acesso aos documentos.

“A triste verdade é que nenhum dos órgãos de comunicação mais importantes e competentes do mundo mostrou interesse nesta história”, escreve. Para Doe, os grandes grupos de informação são atualmente meras “caricaturas” daquilo que já foram.

John Doe fala mesmo em órgãos controlados por “milionários privados que parecem ver a posse de um jornal como um mero hobby, limitando a cobertura de assuntos graves onde estão implicados os mais ricos”. Doe escreve ainda que também o Wikileaks de Julian Assange rejeitou os documentos.
"Escravatura económica"
O olhar crítico de John Doe termina com uma conclusão forte: “Os falhanços e a erosão total dos princípios deontológicos conduziram-nos a um novo sistema que continuamos a chamar de capitalismo, mas que se aproxima da escravatura económica”.

“Neste sistema – o nosso sistema – os escravos não fazem ideia do seu próprio estatuto nem do estatuto dos seus mestres, que evoluem num mundo à parte onde as cadeias invisíveis são cuidadosamente dissimuladas entre páginas e páginas de jargão jurídico inacessível”.

John Doe afirma estar pronto a cooperar com a justiça, acreditando que os documentos poderão motivar milhares de processos caso sejam entregues às autoridades competentes.

Para cooperar, John Doe pede imunidade, recordando os problemas com a justiça que enfrentam atualmente Edward Snowden e Antoine Deltour, responsáveis pela divulgação do escândalo da NSA e do Luxleaks.
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