França legisla por decreto com receio de chumbo no Parlamento

por Christopher Marques, RTP
Charles Platiau, Reuters

É uma lei que, defende o Governo francês, pretende impulsionar a criação de emprego e o desenvolvimento da economia francesa, mas gera controvérsia junto do próprio Partido Socialista. Sem a certeza de conseguir a aprovação da maioria dos deputados do Parlamento, Manuel Valls decidiu adotá-la por decreto. Um mecanismo que a Constituição coloca à disposição do primeiro-ministro mas que Hollande classificou no passado de “negação da democracia”.

Pretende ser uma das leis estrelas do Governo socialista. Tornou-se, sobretudo, numa lei controversa dentro do próprio partido. Apelidada de Lei Macron, a proposta para a liberalização de diferentes setores da economia é criticada pela oposição, mas também por diferentes personalidades do próprio Partido Socialista francês. Lei MacronÉ considerada uma proposta para a liberalização da economia, vista como parte da nova abordagem que Manuel Valls trouxe ao Governo francês e ao próprio Partido Socialista.

Inclui medidas como a possibilidade dos comércios abrirem 12 domingos por ano contra cinco atualmente. Serão ainda aprovadas zonas turísticas internacionais, onde os estabelecimentos comerciais poderão estar abertos todos os domingos.

A Lei Macron prevê ainda a liberalização das linhas de autocarro interurbanas, avança com a privatização de parte do capital dos aeroportos de Lyon e Nice e altera a legislação sobre o despedimento coletivo.
 


Com 40 deputados socialistas a apresentarem-se contra a lei, o Governo gaulês decidiu adotá-la por decreto, minutos antes da primeira votação na Assembleia francesa. Manuel Valls disse acreditar que a maioria dos deputados estaria a favor do texto, mas admitiu que a maioria era “incerta”.

“É a minha responsabilidade, não assumirei nenhum risco. Não vou assumir a responsabilidade pelo risco de chumbo de um projeto que considero ser fundamental para a nossa economia”, anunciou perante os deputados franceses, alguns segundos depois de anunciar que lei seria decretada, sem passar pela aprovação do Parlamento.

Para tal, o Governo francês recorreu ao artigo 49.3 da Constituição francesa. Necessitou da aprovação do Conselho de Ministros que reuniu de emergência já esta terça-feira, sob a presidência de François Hollande.

O artigo 49.3 da Constituição francesa atribui ao primeiro-ministro a possibilidade de “assumir a responsabilidade do Governo perante a Assembleia Nacional”, não necessitando o projeto de aprovação do Parlamento.

“Uma brutalidade”

O mecanismo tinha sido usado pela última vez em 2006, por decisão do então primeiro-ministro Dominique de Villepin, sob a presidência de Jacques Chirac. Na altura, o atual inquilino do Eliseu era o secretário-geral do Partido Socialista. A Assembleia francesa é composta por 577 deputados, 288 dos quais são do Partido Socialista. Com 40 socialistas a anunciarem o voto contra, tornava-se pouco provável a proposta ser aprovada, mesmo estando aberta a possibilidade de alguns deputados dos partidos mais à direita votarem a favor.

“O 49.3 é uma brutalidade, o 49.3 é uma negação da democracia. O 49.3 é uma forma de travar ou impedir o debate parlamentar”, assegurava então François Hollande, numa declaração agora recuperada pelo canal de televisão BFMTV. Em 2008, o PS tinha mesmo solicitado a supressão deste artigo, refere Le Figaro.

A decisão agora tomada por Manuel Valls, com o consentimento de François Hollande, tem sido criticada por todos os partidos da oposição e também por membros do Partido Socialista.

A lei é considerada adotada, exceto no caso em que os deputados votem a favor de uma moção de censura nas 24 horas seguintes. A UMP, partido do antigo Presidente Nicolas Sarkozy e principal partido da oposição, já anunciou que vai apresentar uma moção de censura que deverá ser votada na próxima quinta-feira. A Frente Nacional de Marine Le Pen já exigiu a demissão do Executivo.
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