Um estudo em que participou a neurocientista portuguesa Hanna Damásio sugere que a habituação à nicotina está ligada a uma parte precisa do cérebro, a Ínsula, uma zona que tem um papel chave nas emoções.
Segundo as conclusões do estudo, hoje publicado pela revista Science, as pessoas que têm aquela zona danificada deixam de sentir o desejo irresistível de fumar.
A equipa de investigadores da Universidade do Sul da Califórnia estudou 69 antigos fumadores que sofreram danos cerebrais, 19 dos quais na Ínsula.
Neste grupo, 13 (68,4%) deixaram de fumar, 12 dos quais de forma fácil e rápida, sem que tenham voltado a sentir necessidade premente de acender um cigarro.
"Um dos problemas mais difíceis em toda a forma de habituação é parar o desejo irresistível de fumar, comer ou consumir uma droga", afirmam os autores do estudo, que sublinham terem identificado "um novo alvo de investigação no cérebro".
Apesar de ser interessante, a produção de medicamentos que tenham por alvo a Ínsula e possam ajudar os fumadores a deixar o hábito não está num horizonte próximo, advertem os cientistas.
Mas a mais curto prazo, acrescentam, será talvez possível avaliar o êxito das terapias antitabágicas actuais através da medição da actividade desta região do cérebro.
O estudo foi em grande parte inspirado pelo caso de um paciente que fumava dois maços de cigarros por dia até sofrer um ataque cerebral que lhe danificou a Ínsula.
Segundo os investigadores, parou imediatamente de fumar e deixou de sentir desejo de o fazer.
A Ínsula recebe informações vindas de outras partes do cérebro e parece desempenhar um papel importante na manifestação de diversas sensações como a fome, a dor, o desejo de fumar ou de tomar drogas.
Em comparação com outras regiões cerebrais, a Ínsula tem merecido pouca atenção da investigação sobre toxicodependência.
Todavia, outros estudos sobre imagiologia do cérebro mostraram que esta zona é estimulada por imagens de pessoas a drogar-se ou por objectos associados ao consumo de drogas.
Hanna Damásio, a autora do primeiro atlas do cérebro, elaborado a partir de imagens obtidas por ressonância magnética, tem desenvolvido importantes estudos sobre cartografia cerebral.
Leccionou como professora adjunta na Universidade de Iowa, Estados Unidos, e foi, entre 1982 e 2004, directora do Laboratório de Neuroimagem e Neuroanatomia do Departamento de Neurologia daquela universidade, bem como vice-directora da Divisão das Neurociências Cognitivas, entre 1985 a 2004.
Em 1995, a cientista foi eleita membro da Associação Americana de Neurologia e dois anos mais tarde para a Academia Americana de Artes e Ciências.
Em 2001, foi-lhe atribuído o "Doctor Honoris Causa" pela Universidade de Lisboa e, em 2002, o mesmo título pela universidade norte-americana de Aachen.
A cientista foi galardoada com diversas distinções, entre elas, o recente Prémio Signoret para as Neurociências Cognitivas.
Em 1992 recebeu o Prémio Pessoa pela sua actividade de investigação.
Estes prémios foram recebidos conjuntamente com o seu marido, o neurocirurgião António Damásio.