Partido Socialista, "o Stradivarius" que chegou ao poder

Quinta-feira santa, 19 de abril de 1973. Eram 18h00, diz a última linha da ata da fundação do Partido Socialista (PS), assinada por 27 militantes. Apesar de alguma oposição dos núcleos de Lisboa, Coimbra e Porto, devido aos riscos acrescidos de constituir um partido, o PS foi fundado naquela data, em Bad Münstereifel, Alemanha, na Fundação Friedrich Ebert. O motivo? Criar um instrumento - “o Stradivarius” - para ser poder em Portugal.

Foi em dia santo, mais propriamente na quinta-feira santa de 1973, que nasceu o PS. Uma ironia de quem sempre se disse “Socialista, Republicano e Laico”.

A Revolução dos Cravos viria a acontecer um ano e uma semana depois.

“No dia dezanove de abril de mil novecentos e setenta e três, o Congresso da Ação Socialista Portuguesa (ASP) reunido, por motivos de segurança, na República Federal da Alemanha (…) deliberou transformar a ASP em Partido Socialista”, pode ler-se na ata da fundação.
Os clandestinos

"Fundámos aqui o Partido Socialista com clandestinos vindos de Portugal e vindos de várias partes do mundo e da Europa, em especial. Encontrámo-nos aqui para transformar aquilo que era a ação socialista portuguesa (...) graças à ajuda do Partido Social Democrata alemão e também a ajuda da Fundação Ebert", disse Mário Soares, em conversa com Clara Ferreira Alves, para o programa “A democracia e os partidos”, em 2008.


Programa RTP “A democracia e os partidos” - 28/5/2008 – Mário Soares entrevistado por Clara Ferreira Alves

Na Alemanha, durante três dias, discutiu-se a fundação do PS. A resolução viria a ser tomada por 20 votos a favor e sete contra, “estes com a declaração de que, embora de acordo com o princípio, apenas discordavam da oportunidade da data”.


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"Foi aqui que nós estivemos três dias a discutir e fundámos realmente o Partido Socialista, com alguma controvérsia, e com alguns votos contra, entre eles o da minha própria mulher", aliás a única mulher presente no Congresso.

Mário Soares, como secretário-geral, sabia que era necessário criar um instrumento, a que chamava “o nosso Stradivarius”, para poder ser poder em Portugal.

"O nosso argumento era que estávamos nas vésperas da revolução e nós sabíamos que ia acontecer, mais mês menos mês, e nós percebíamos que tínhamos que criar um instrumento para podermos ser poder em Portugal", disse Soares à jornalista Clara Ferreira Alves.

E acrescentou: "Nós, [Mário Soares, Ramos da Costa e Tito de Morais], depois da Guerra Fria, começámos a perceber que a unidade anti-fascista, longe de ser útil para nós, era prejudicial. E era prejudicial porquê? Porque o Salazar dizia: a oposição é toda comunista. São todos comunistas. Eles dizem-se anti-fascistas, mas são todos comunistas e nós começámos a procurar contactos no estrangeiro para afirmar que nós éramos democratas e não éramos comunistas".
O caminho do poder
"Então, os três fundámos a Ação Socialista em 64 e a certa altura resolvemos transformar a Ação Socialista num Partido Socialista. Eu chamava a isso o nosso Stradivarius. Quando vier a Liberdade, nós precisamos de tocar, precisamos de chegar ao poder, e para ser poder e para tocar, precisamos de um instrumento. O nosso Stradivarius, que nos vai fazer tocar uma área que é percebida por toda a gente, há-se chamar-se Partido Socialista", concluiu Mário Soares.

O histórico do PS justificou ainda a escolha do local para a fundação do partido, referindo que quem mais os auxiliou foram os sociais-democratas alemães, em especial Willy Brandt, ex-chanceler da Alemanha.

                                               
Primeiro símbolo utilizado pelo Partido Socialista (agosto de 1973). Oferecido por Enzo Brunori, militante do Partido Socialista Italiano
"Perdi muito tempo com a política, talvez demasiado"

Mário Soares entrevistado pelo jornalista Vítor Gonçalves - 07-12-2004

Em entrevista ao jornalista Vítor Gonçalves e, em jeito de balanço, Mário Soares
afirmou em dezembro de 2004 que exerceu muitas funções que não esperava e que perdeu demasiado tempo com a política.