Sintra: o concelho que é "um mini-país" numa luta renhida a três

Joana Carvalho Reis /

Fotos: Joana Carvalho Reis

Tem uma vila Património da Humanidade, duas cidades e subúrbios que crescem à volta da linha de comboio, zonas industriais importantes, praias famosas e aldeias pacatas. Com mais de 400 mil habitantes, Sintra é um concelho com muitas realidades diferentes. Nestas Autárquicas vai eleger um novo presidente da câmara e as sondagens mostram um empate técnico entre três candidatos.“Olhe para elas, como são lindas”, aponta Angelina Sandinha. Com cuidado, segura entre as mãos uma maçã, ainda na árvore. Os olhos brilham de orgulho. É grande, verde salpicada por manchas castanhas, brilhante aos raios de sol. Esta variedade é especial - é maçã reineta de Sintra. Só é produzida na região de Fontanelas.

Angelina vai avançando pelo pomar com uma energia que lhe esconde a idade. Sobe pelo terreno e vai apontando as árvores carregadas, quase prontas para a colheita. Aos 79 anos, é das poucas produtoras que resiste e teme que, mais tarde ou mais cedo, esta maçã típica acabe por desaparecer.

“Andar no campo faz doer as costas”, diz, “antigamente aqui toda a gente tinha [maçã], mas muitos deixaram de cultivar. As pessoas vão ficando mais velhas, vão deixando. Os filhos são empregados, têm a vida deles…”. No caso de Angelina, mesmo tendo outros empregos a família tem conseguido manter a produção. Em particular o filho. “Ele ajuda no trabalho. O negócio é meu, sou eu que o faço”, garante.

Os tempos agora são outros, lamenta. Mesmo em Fontanelas, onde nasceu e cresceu, a vida é agora diferente. “Isto era uma aldeia em que a gente conhecia todas as pessoas. Íamos à mercearia e encontrava uma, encontrava outra…Mas agora já não está quase ninguém que nascesse cá. É tudo pessoas que a gente nem conhece”.

Angelina explica que esta gente desconhecida veio especialmente de Lisboa. “É a falta das casas. Agora não há casas! E aqui também é uma zona que as pessoas gostam. Está perto das praias…” É um sítio bom para se viver, garante. “É uma zona com bons ares. Mas fria, um bocadinho húmida. Uma pessoa aqui tem sempre muitas dores nas articulações”.

Em breve, o trabalho vai aumentar. A época da apanha está a chegar. Vão ser duas semanas intensas, de manhã cedo até à noitinha, para não deixar a maçã estragar-se. Todos os anos, tira aproximadamente 20 toneladas de fruta dos terrenos que tem. Grande parte da colheita será vendida no Festival da Maçã Reineta que todos os anos acontece na União Recreativa e Desportiva de Fontanelas e Gouveia. “Vem gente de todo o concelho e às vezes até de Lisboa”, explica. O festival uma forma de promover um produto da região e tentar que não se perca. Angelina não tem grandes esperanças. “Isto vai acabar. É uma grande pena”.

Enquanto viver, ela vai ter maçã. E este ano as árvores estão carregadas e a fruta tem bom tamanho. “Vai ser uma colheita bonita”.
Uma linha de comboio com um concelho à volta
A pouco mais de 20 quilómetros do pomar de Angelina, o despertador fez Isabel Barreto saltar da cama bem cedo. Às 6h30 já saiu de casa e começou a caminhada até à estação de comboio. Todos os dias vai a pé de casa, em Massamá, até à estação de Monte Abraão. São 15 minutos que servem como exercício a quem passa o dia sentado no trabalho.

Isabel vive em Massamá desde criança. Por alguns anos morou em Lisboa, mas acabou por voltar. “Aqui tenho tudo o que preciso. Lisboa é uma confusão! Aqui a vida é mais calma”, diz. O emprego continua a ser na capital e, para lá chegar, o comboio é sempre a opção. “É rápido e é uma grande poupança. O passe custa 40 euros e posso andar o mês todo em qualquer transporte”.

A redução do preço do passe teve um grande impacto na linha de Sintra e Isabel garante que isso se percebe diariamente. “Antes desta alteração, não havia tantas pessoas. Os comboios vão cheios”. Ainda assim, explica que a oferta é muita; em hora de ponta, passam de 10 em 10 minutos. O maior problema é quando não chegam a horas. “Quando falha algum comboio, quando há greves… aí a CP falha a 100%”.

No comboio que sai às 7h04 de Monte Abraão já não há lugares sentados. A cada estação enche um bocadinho mais. As pessoas vão entrando e ajeitam-se às folgas - como um tetris em composição. O resto da viagem é feito numa dança lenta até ao destino. São 15 minutos até Sete Rios. Isabel diz que tem sorte. “O comboio é uma bênção para mim”.
O concelho “mini-país” dividido no votoCom mais de 400 mil habitantes, o segundo concelho mais populoso do país tem muitas realidades diferentes. Entre a zona urbana mais junto à linha de comboio, as áreas industriais espalhadas pelo território, a zona rural, as praias, a serra e a vila Património da Humanidade, há muitas Sintras.

O atual presidente da câmara, Basílio Horta, está de saída depois de esgotar o número de mandatos. Resta saber quem lhe vai suceder, numa altura em que as sondagens publicadas mostram em empate técnico entre três candidatos – Ana Mendes Godinho, Marco Almeida e Rita Matias.

Ana Mendes Godinho chama-lhe “um mini-país”. A antiga ministra do Trabalho e da Segurança Social do PS aceitou o desafio de se candidatar à autarquia. Garante que conhece bem o concelho, os seus problemas e desafios e o potencial que tem. Anda desde fevereiro nas ruas “a ouvir as pessoas” e quer posicionar Sintra “como um dos grandes motores do crescimento do país e como líder na Área Metropolitana de Lisboa”. Nestas Autárquicas, o PS vai a votos em coligação com o Livre.

Marco Almeida apresenta-se na corrida à câmara de Sintra pela terceira vez. Já concorreu pelo PSD, já foi rosto de um movimento independente quando o partido lhe falhou e agora, feitas as pazes, volta a aparecer com o apoio social-democrata. Fez parte do executivo de Fernando Seara, que agora chamou para liderar a lista à Assembleia Municipal. Assegura que são muitos os que reconhecem a dedicação que tem a Sintra. “A minha convicção foi sempre servir os sintrenses”, assegura. Diz que Sintra foi abandonada pelo PS. Afirma que não tem linhas vermelhas com nenhum partido, mas avisa que quer governar Sintra com os competentes. Nestas Autárquicas, os social-democratas avançam sem o antigo parceiro CDS. Marco Almeida é o candidato da coligação PSD / Iniciativa Liberal / PAN.

Rita Matias admite que não tinha nos planos candidatar-se à câmara de Sintra. Foi o líder do Chega que lhe apresentou o plano e agora garante que está a 100% neste projeto. Diz que “é uma honra estar a jogar na Champions das Eleições Autárquicas”. Se vencer as eleições, assegura que vai trocar os corredores do Parlamento pelos Paços de Concelho. Acredita que os resultados do Chega no concelho nas últimas Legislativas (foi o partido mais votado, com 26% dos votos) são um bom prenúncio para as eleições de 12 de outubro.

Pedro Ventura volta a ser o candidato da CDU a Sintra. Tenta manter o lugar de vereador que ocupa. Atualmente tem os pelouros da Reabilitação Urbana e da Sustentabilidade e Transição Energética, mas chegou a ser vereador também com o anterior presidente, Fernando Seara. Para além disso, faz parte do Conselho de Administração dos SMAS. Considera que deu provas do trabalho feito e confia que os sintrenses reconhecem esse trabalho e vão reforçar os resultados da CDU.

Maurício Rodrigues é o rosto do CDS para estas Autárquicas. É um “filho da terra”, que ocupou vários cargos em associações do concelho. Atualmente é vereador na câmara, mas esse lugar foi conseguido quando o partido concorreu coligado com o PSD. Agora o CDS avança sozinho depois de divergências com o candidato Marco Almeida. “É um projeto pessoal, antigo, que não acrescenta nada a Sintra” defende Maurício Rodrigues, explica que explica que centristas não se identificam com o projeto atual do PSD e muito menos com parceiros como o PAN.

Tânia Russo é a candidato do Bloco de Esquerda a Sintra. Médica, vive e trabalha no concelho. Nestas Autárquicas o Bloco tentou avançar com uma coligação de Esquerda, à semelhança do que acontece em Lisboa, mas não foi bem sucedido. Tânia Russo considera que “foi uma oportunidade perdida para lutar pela Democracia e para combater a extrema-direita ”. O Bloco avança sozinho e quer crescer no concelho.

Júlio Ferreira avança na corrida a Sintra com a Nova Direita. É a primeira vez que o partido concorre em Eleições Autárquicas, mas o candidato garante que estão prontos para o desafio e trazem ideias novas. Júlio Ferreira vive em Queluz desde que nasceu. Afirma que conhece bem o concelho e por isso merece a confiança dos sintrenses.
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