Covid-19. Espanha incapaz de contar as vítimas mortais

por Cristina Sambado - RTP
Funeral de vítima de Covid-19 em Espanha Juan Medina - Reuters

A falta de exames e o colapso dos registos civis impedem o conhecimento exato do número de mortos. Um mês após o início da pandemia, Espanha ainda não encontrou uma forma segura para contar o número de vítimas mortais de Covid-19.

O jornal El País noticia esta quinta-feira que os dados divulgados diariamente pelo Ministério da Saúde revelam-se insuficientes para fornecer uma imagem, ainda que aproximada, da tragédia.
Espanha registava, na quarta-feira, 14.555 mortos e 149.690 casos de infeção.
A falta de testes de diagnóstico e a decisão de contar apenas os mortos que deram positivo para o SARS-Cov-2 deixaram milhares de pessoas mortas em lares, casas particulares e também nos hospitais mais colapsados.

O jornal recorda que o país tem um sistema projetado para detetar e medir episódios que possam causar um aumento na taxa de mortalidade, geralmente causados pela gripe ou por ondas de calor.

É o Sistema de Monitoramento Diário de Mortalidade (MoMo), gerido pelo Instituto de Saúde Carlos III e que, apesar de ter detetado o forte impacto do novo coronavírus em algumas comunidades – Castilla-La-Mancha, por exemplo, já triplicou a mortalidade esperada –, é incapaz de medir a pandemia face ao colapso dos sistemas de informação dos registos civis, a partir dos quais se baseiam os dados.

A plataforma está desatualizada desde que foi declarado o estado de emergência.

Já a ferramenta Inforeg, que permitia quase em tempo real conhecer o número de óbitos, está em serviços mínimos para limitar a presença física entre os trabalhadores. Em Madrid, passou de 180 para 14 funcionários. E em registos civis mais pequenos há apenas uma pessoa a trabalhar.

Além disso, a aplicação não está preparada para funcionar remotamente o que levou o Ministério da Justiça a ativar, nos últimos dias, o sistema para que alguns funcionários possam avançar em teletrabalho.

O Ministério da Justiça já assumiu a impossibilidade de atualizar o Inforeg e no passado sábado solicitou aos registos civis o envio diário da lista do número de mortos, licenças de funerais emitidas, local da morte e se o óbito ocorreu em instalação hospitalar ou na residência.

No entanto, o El País avança que a maioria dos registos não está a enviar essas informações. “Sabemos que é difícil porque é um trabalho adicional e estamos a ser compreensivos”, afirmou fonte do Ministério da Justiça ao jornal.

“É a única maneira de oferecer aos cidadãos informações verdadeiras, verificadas e objetivas. E também permitir que as autoridades de saúde se concentrem nos locais onde as taxas de mortalidade aumentaram”, acrescenta.

A fonte sustenta que, em qualquer caso, o objetivo não é fazer uma contagem de mortos de Covid-19 paralela à da Saúde, mas conhecer a carga de trabalho de cada registo e a lacuna que o Inforeg acumula, para verificar se é necessário aumentar os serviços mínimos.

Já a MoMo, que para já apenas oferece dados parciais, dá uma ideia de um grande aumento na mortalidade.

Entre 14 de março e 7 de abril, na comunidade de La Castilla e de La Mancha o aumento é de 205 por cento (mais do que o triplo), com quase quatro mil mortes registadas.
As comunidades com maiores aumentos de mortalidade são Castilla e Leão (164%), Navarra (160%) e Madrid (149%). Mas os números são provisórios.

Para já, esse aumento da taxa de mortalidade não podem ser atribuídos diretamente ao diagnóstico Covid-19.

O colapso do sistema de saúde, que impediu que algumas pessoas com outras patologias recebessem os cuidados adequados, os pacientes que não recorreram às urgências com medo de ser infetados, podem também ter contribuído para o aumento do número de mortos.

Nos últimos dias os tribunais superiores de Castilla-La-Mancha e de Madrid revelaram dados de licença de funerais.

Em Castilla-La-Mancha, as licenças para cremação das pessoas que morreram de Covid-19 ou são suspeitas, são quase o triplo dos dados oficiais. E em Madrid, os dados de funerais sugerem que os óbitos pelo novo coronavírus podem ser mais de três mil do que as estatísticas oficiais, que incluem apenas casos confirmados com testes.
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