Nova equipa da OMS pode ser "última oportunidade" para descobrir origem do coronavírus

por Inês Moreira Santos - RTP
Denis Balibouse - Reuters

A Organização Mundial da Saúde anunciou, na quarta-feira, a composição da equipa que irá passar a investigar novos vírus infecciosos que possam provocar pandemias e que terá como uma das missões estudar a origem do SARS-CoV-2, que causa a covid-19. A investigação levada a cabo pelos 26 especialistas que formam o novo Grupo de Aconselhamento Científico para as Origens de novos patógenos pode ser, segundo a OMS, a "última oportunidade" para descobrir como surgiu o coronavírus.

Já passou mais de um ano e meio desde que o SARS-CoV-2 foi detetado pela primeira vez na cidade chinesa de Wuhan, mas a sua origem continua a ser uma incerteza. A nova equipa selecionada pela OMS vai retomar as investigações e perceber se, de facto, o novo coronavírus passou de animais para seres humanos nos mercados de Wuhan ou se se tratou de um acidente laboratorial.

A origem da Covid-19 começou a ser investigada em 2020 e no início deste ano foi revelado que a maior probabilidade seria de a doença ter surgido num animal. No entanto, um estudo paralelo, realizado nos Estados Unidos, apontou que o coronavírus poderá ter sido produzido num laboratório em Wuhan.

Desta forma, a OMS decidiu avançar com uma segunda fase do estudo sendo que alguns investigadores admitiram não lhes ter sido fornecida toda a informação necessária. Por sua vez, a China considerou que a OMS devia abrir o leque e investigar outros países, uma vez que um estudo demonstrou que já existiam casos da doença a circular no EUA antes de dezembro de 2019.

Para o diretor de emergências da OMS, Michael Ryan, esta pode ser a "última oportunidade de entender as origens deste vírus".

A equipa integra 26 especialistas de diversas áreas, como epidemiologia, saúde animal, ecologia, medicina clínica, virologia, biologia molecular, segurança alimentar ou biossegurança, sendo os seus membros de países tão diferentes como Estados Unidos, Brasil, Reino Unido, Rússia, França, Alemanha, China ou Japão. Escolhida entre 700 candidatos, esta equipa irá formar o Grupo Consultivo Científico para as Origens de Novos Patógenos (SAGO, na sigla em inglês) e visa aconselhar a Organização Mundial de Saúde (OMS) relativamente às origens de agentes infecciosos emergentes e reemergentes com potencial para provocarem epidemias ou pandemias.
"Não há tempo a perder"

Num artigo publicado como editorial da revista Science, Tedros Adhanom Ghebreyesus, Michael Ryan e Maria Van Kerkhove afirmam que uma das razões para criação do SAGO é conter a pressão política que se criou sobre a investigação da origem da Covid-19, e tentar manter os trabalhos de investigação no campo mais técnico.

"Os processos científicos foram afetados pela politização, razão pela qual a comunidade global de investigação precisa de redobrar os esforços para os impulsionar", lê-se no artigo.

A OMS já tinha anunciado, no início de 2021, que criaria um Grupo de Aconselhamento Científico para as Origens de Novos Patógenos. Maria Van Kerkhove, líder técnica da OMS para a Covid-19, garantiu que a Sago avaliará com urgência o que agora é conhecido, o que ainda permanece desconhecido e o que tem de ser feito rapidamente.

"Antecipo que o SAGO vai recomendar mais estudos na China e, provavelmente, em outros países", disse. "Não há tempo a perder nisso".

A urgência de se realizar uma investigação neste momento explica-se com a necessidade de realização de "mais de três dúzias" de testes, entre eles a de anticorpos nos residentes de Wuhan contaminados em 2019, segundo contou à CNN Maria van Kerkhove.

Segundo a OMS, é preciso analisar os exames de sangue colhidos em 2019 em Wuhan, realizar investigações retroativas em hospitais da região e investigar as primeiras mortes por Covid-19. Além disso, a equipa considera que os laboratórios da região chinesa devem ser também investigados e que são necessárias provas concretas para se poder descartar completamente a hipótese de que o SARS-CoV-2 foi produzido num laboratório.
OMS quer prevenir novas pandemias
Para o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, "o aparecimento de novos vírus com potencial para desencadear epidemias e pandemias é um facto da natureza e, apesar de o SARS-CoV-2 ser o vírus mais recente, não será o último".

Por isso, "entender de onde vêm os novos patógenos é essencial para prevenir futuros surtos com potencial epidémico e pandémico e requer um leque vasto de conhecimento".

"Estamos muito satisfeitos com o calibre de especialistas selecionados (...) e esperamos trabalhar com eles para tornar o mundo num lugar mais seguro", acrescentou.

Todavia, para embaixador da China na ONU em Genebra, Chen Xu, o trabalho de investigação do Sago não deve ser "politizado".

"Se vamos enviar equipas para qualquer outro lugar, acredito que não seja para a China, porque já recebemos equipas internacionais duas vezes", disse aos jornalistas numa conferência de imprensa.

"Está na hora de enviar equipas para outros sítios".

O anúncio da formação de uma nova equipa de investigação surge no momento em que, segundo a CNN, a China se preparar para testar dezenas de milhares de amostras de bancos de sangue que foram colhidas nos primeiros meses da pandemia.

Os 26 membros serão sujeitos a uma avaliação final, na qual a OMS também levará em consideração os resultados de uma consulta pública de duas semanas sobre os candidatos. O SAGO inclui cientistas de todas as regiões do mundo e de diversas áreas de especialização, por isso, a OMS espera que o novo painel tenha mais liberdade e autonomia para conduzir investigações e fazer avaliações de risco sobre novos vírus e bactérias.
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