Singapura enfrenta segunda vaga de infeções por Covid-19

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Centenas de milhares de trabalhadores imigrantes estão em quarentena nos dormitórios onde ficam alojados Edgar Su - Reuters

Em Singapura, o novo coronavírus parecia estar sob controlo, mas na segunda-feira foi registado um número recorde de 1.426 novos casos de infeção, quando há um mês eram pouco mais de 300. O número de novos casos disparou após a realização de testes em alojamentos onde vivem trabalhadores imigrantes, geralmente em condições pouco higiénicas. Devido a esta multiplicação do número de casos, o país prolongou a quarentena até princípio de junho.

Singapura era um dos países que mostrava bons resultados na contenção da disseminação do novo coronavírus, em parte devido a uma estratégia elogiada de rigidez no controlo e rastreamento dos contactos com as pessoas contaminadas. As fronteiras foram encerradas quando existiam ainda poucos casos no país e os testes eram gratuitos para os residentes.

No entanto, desde o início de abril, o número de infetados disparou e Singapura está a enfrentar uma segunda vaga de infeções. Só nos últimos três dias foram identificados perto de três mil novos casos de Covid-19, elevando o total de infetados para 9.125. Há um mês, o país contava apenas com cerca de 300 infetados. O número de vítimas mortais mantém-se baixo, com apenas 11 mortes a registar.

Singapura é agora o país com maior número de casos de infeção por Covid-19 no sudeste asiático. Cerca de 60 por cento destes casos que deram origem a uma segunda onda de infeções provém, principalmente, de alojamentos onde estão acomodados trabalhadores imigrantes.

De acordo com The Guardian, mais de 200 mil trabalhadores do Bangladesh, Índia e outros países asiáticos mais pobres vivem em dormitórios de pequenas dimensões. Aqui, o distanciamento social é impossível, com 12 a 20 homens alojados num só quarto com cozinha e casas de banho partilhadas.

Centenas de milhares de trabalhadores imigrantes estão, por isso, em quarentena nestes dormitórios onde surgem centenas de novos casos a cada dia. Vários milhares de outros trabalhadores foram transferidos para outros locais para reduzir a aglomeração. Estes trabalhadores estrangeiros foram colocados de parte da rede de segurança do país, apesar de existirem regulamentos que garantem condições mínimas no local de trabalho e cobertura de assistência médica.

O ministro do Desenvolvimento Nacional, Lawrence Wong, afirmou no domingo que a grande maioria destes imigrantes trabalham no setor da construção. Singapura tem cerca de 200.000 trabalhadores imigrantes a trabalhar no setor da construção, provenientes principalmente do sul da Ásia.

“A partir dos resultados epidemiológicos, há evidências de que a transmissão [em vários dormitórios] poderá ter ocorrido em locais de trabalho ou em locais onde os trabalhadores se reúnem durante os seus dias de folga para fazerem compras e conviverem”, escreveu Wong na sua página de Facebook, acrescentando que foi ordenado a todos estes trabalhadores que vivem fora dos dormitórios que ficassem de quarentena em suas casas até 4 de maio.
Quarentena prolongada
Tendo em conta esta multiplicação do número de casos de infeção por Covid-19, as autoridades de Singapura anunciaram esta terça-feira o prolongamento do confinamento. Estava previsto que a quarentena terminasse no dia 4 de maio, mas foi prolongada até, pelo menos, 1 de junho.

"Muitos de vocês ficarão dececionados com a extensão", disse o primeiro-ministro, Lee Hsien Loong, num discurso transmitido pela televisão, reconhecendo que muitas empresas e trabalhadores foram "severamente afetados" pelas medidas.

"Mas espero que entendam que essa dor de curta duração tem como objetivo eliminar o vírus, proteger a saúde e a segurança de nossos entes queridos e nos permitir mudar nossa economia", complementou o primeiro-ministro de Singapura.

"São precisas apenas algumas pessoas que baixem a guarda e o vírus escapará”, alertou Loong. “Precisamos que todos façam a sua parte”, pediu o primeiro-ministro.

Esta terça-feira, Wong publicou no Facebook algumas das medidas que serão reforçadas. “Primeiro, pedimos a todos que reduzam as deslocações. Fiquem em casa o máximo possível”, solicitou o ministro do Desenvolvimento Nacional.

“Em segundo lugar, estreitaremos o acesso a áreas populares para onde as pessoas ainda se estão a deslocar, como mercados e supermercados, para que medidas de distanciamento possam ser mais bem implementadas”, acrescentou Long, concluindo que, em terceiro lugar, serão encerrados mais locais de trabalho e a lista de serviços essenciais será ainda mais restringida.

As escolas e empresas não essenciais permanecerão encerradas e o uso de máscara passou a ser obrigatório para toda a população em espaços públicos.

No fim-de-semana, Loong admitiu que levará tempo para quebrar a cadeia de transmissão do novo coronavírus nos dormitórios. Sublinhou, no entanto, que na sua maioria os casos são assintomáticos ou apresentam sintomas leves, o que talvez explique o facto de a transmissão entre trabalhadores imigrantes não ter sido detetada antes.

O primeiro-ministro anunciou que estão a ser preparadas instalações de atendimento médico e isolamento para responder ao número elevado de infeções. Lee Hsien Loong anunciou também mais recursos, inclusivamente médicos, que serão destinados aos imigrantes.
O risco real de uma segunda vaga
Esta multiplicação de casos na Singapura arruína a esperança de que um regresso à normalidade possa estar para breve. Mesmo que a curva de crescimento da Covid-19 tenha atingido o seu pico e pareça estar na fase de declínio, nada impede que ocorra uma segunda vaga de infeções, tal com se está a verificar na Singapura ou mesmo na China.

“A realidade é que os norte-americanos e europeus também irão enfrentar os mesmos problemas”, alerta Teo Yik Ying, reitor da Escola de Saúde Pública Saw Swee Hock da Universidade Nacional de Singapura, citado por The New York Times.

“Os meus amigos economistas podem não gostar disto, mas se o comércio e a atividade económica forem retomados e as pessoas começarem a deslocar-se sem medidas adequadas, haverá ondas subsequentes de infeção”, sublinha Yik Ying.

Em todo o mundo, a Covid-19 já infetou mais de 2,5 milhões de pessoas e fez mais de 171 mil vítimas mortais.
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