Arte digital é um conceito sem consenso e à procura de visibilidade em Portugal

As fronteiras entre a tecnologia e a arte não preocupam os criadores da denominada `arte digital`, uma forma de expressão que, podendo ou não interagir com o público, é, seguramente, distinta dos trabalhos convencionais.

Agência LUSA /

"Os artistas sempre foram pioneiros em explorar as tecnologias, como o provam a fotografia ou o vídeo, e isso é evidente também agora, em que a nossa e xperiência é constantemente mediada pelo digital", afirmou Luís Silva, da galeri a Lisboa 20, à agência Lusa.

Comissário, em 2005, da mostra "Online Portuguese Netart 1997-2004", Lu ís Silva prefere a designação "media art" a "arte digital" e diferencia "o uso d as tecnologias apenas para a execução da obra" das criações que "integram a tecn ologia em si próprias".

No segundo caso, a obra de arte pode interagir com o público, "que tem um papel activo, sendo utilizador e não apenas espectador", afirmou, indicando c omo exemplos de artistas digitais André Sier, Patrícia Gouveia, Victor Silva, Mi guel Leal ou André Gonçalves.

Músico de electrónica e designer, André Gonçalves iniciou-se nas artes digitais em 1999 e, por proposta de Luís Silva, entre Junho e Julho de 2006 part icipou na exposição "Sound Visions", na Sala do Risco, em Lisboa, com "Living Ro om".

"Em `Living Room` recorri a três gira-discos que foram modificados de m odo a reagirem ao som, à luz e aos movimentos das pessoas que entravam no espaço da exposição", explicou o artista à Lusa, revelando alguns segredos da sua cria ção.

"Cada gira-discos tinha sensores e microprocessadores que detectavam as alterações na sala e enviavam essas informações para um motor que controlava o braço do gira-discos, sendo possível criar um histograma da presença dos visitan tes", explicou.

André Gonçalves apenas lamenta que "ainda sejam poucos os espaços a div ulgar este tipo de arte, o que lhe concede pouca visibilidade".

No mesmo sentido se pronunciou Susana Mendes Silva, formada em escultur a, que opta por não estabelecer uma fronteira entre a arte tradicional e a que r ecorre aos novos meios: "Tudo faz parte da arte contemporânea" - afirmou à Lusa.

Na opinião desta artista digital, que usa os programas informáticos par a "dar uma continuidade" ao seu trabalho, "há iniciativas a decorrer em Portugal que têm muito impacto lá fora, enquanto aqui...".

Uma queixa partilhada por Leonel Moura, que a partir do ano 2000 se com eçou a interessar pelas aplicações da robótica às artes plásticas, tendo criado robots que acciona para que pintem telas.

"Faço exposições por todo o mundo num circuito paralelo ao instituciona l", referiu, explicando que ainda há resistência da arte estabelecida "a esta gr ande mudança que se está a operar no campo das artes visuais".

"Estas novas formas de arte são muito mais excitantes, porque a experiê ncia do espectador não é contemplativa: ele torna-se co-autor", afirmou Leonel M oura, para quem a arte digital "é mais democrática, precisamente por convidar à participação de quem vê".

Considerando que "a arte convencional está esgotada e repetitiva" e que "o pincel é obsoleto e antiquado", estando associado a um "conceito europeu de artista romântico", Leonel Moura sublinhou que a "arte tecnológica" - designação que prefere para o seu trabalho - "é feita mais com a inteligência do que com a s emoções".

E exemplificou com as suas criações: "Os robots que criei são autónomos , pois pintam por si mesmos, não estão a reproduzir o que sinto ou penso".

Um género de criações que, para Luís Silva, da Lisboa 20, não pode ser incluído nas "media arts", pois, "neste caso, a tecnologia é apenas um recurso, não faz parte da composição final da obra".

Num meio aparentemente tão fragmentado, qual é, afinal, a charneira ent re os criadores? "O que une os trabalhos destes artistas é o facto de serem inspirados e m estruturas tecnológicas ou terem na sua base ideias inspiradas pela tecnologia " - definiu Sofia Oliveira, da associação cultural Atmosferas, dando forma a um conceito em busca de consenso.

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