Artistas entregam cartas a primeiro-ministro e pedem abertura ao diálogo

por Lusa

Lisboa, 18 out 2019 (Lusa) - Cerca de três dezenas de artistas entregaram hoje cartas de contestação dos resultados provisórios dos concursos de apoio às artes, na residência oficial do primeiro-ministro, e apelaram ao diálogo entre o Governo e o setor, para se encontrar solução conjunta.

Eram perto de 30, mas representavam as centenas de artistas que têm vindo a contestar os resultados provisórios dos concursos de apoio às artes, divulgados no dia 11 de outubro pela Direção-Geral das Artes (DGArtes), que deixaram sem apoio 75 das 177 candidaturas consideradas elegíveis pelos júris, "em qualidade e diversidade".

Para os artistas, não é só o resultado do concurso, nem a exigência de financiamento para todos os elegíveis que os move, é também a revisão do próprio modelo de apoio às artes que sistematicamente falha, e o apelo à abertura de uma via de diálogo entre o Ministério da Cultura e o setor artístico, para encontrarem alternativas e chegarem a uma solução.

Manifestando uma "profunda desilusão" com estes resultados, o ator Filipe Abreu foi um dos dinamizadores da iniciativa que hoje entregou uma carta subscrita por 1.131 pessoas, na qual propõe, "como solução provisória até se encontrar um novo modelo melhor", que "todas as estruturas consideradas elegíveis pelo júri externo sejam financiadas".

Questionado sobre uma possível proposta alternativa de modelo de apoio às artes que o setor tenha para apresentar, Filipe Abreu respondeu que "é um assunto complexíssimo que poderia ser discutido com técnicos da DGArtes e uma presença forte de representantes do setor e das diversas formas de trabalhar que existem dentro das artes".

"É bem possível que um novo governo possa finalmente dar resposta a esta pergunta que é `o que são as politicas culturais em Portugal`, clarificar o setor, relacionar-se com ele e poder criar um plano e uma execução de serviço público de cultura para os cidadãos", afirmou.

A produtora Tânia Guerreiro, que subscreveu uma das cartas a título individual, mas que tem duas estruturas artísticas -- uma de dança, Produções Independentes, e a ORG.I.A -- Organização, Investigação e Artes -- partilha da mesma opinião de Filipe Abreu.

"Se nos receberem, se trabalharem de facto connosco, penso que vamos encontrar soluções com muita rapidez. Queremos que se fale de uma política cultural que englobe uma série de ferramentas. Enquanto isso não acontecer vai haver muitos erros nestes concursos, e o que exigimos, porque é um direito dos artistas e cidadãos, é que exista um trabalho sério para dar resposta ao setor para que continue a crescer".

Tânia Guerreiro, que viu a sua estrutura, a Produções Independentes, ficar sem acesso a financiamento, apesar de ter sido considerada elegível, alerta para o facto de as entidades que ficam de fora serem "muito relevantes" no panorama artístico português.

"É muito importante pensar que existe um investimento por parte da DGArtes, e do Governo, a estas entidades, que se quebra de cada vez que há um resultado deste tipo, e só isso já nos dá uma dimensão do erro deste modelo", afirmou.

Nesta ação, os artistas, agrupados dois a dois, foram entregando maços de cartas à vez na residência oficial do primeiro-ministro, mas não foram recebidos por nenhum representante, e as cartas representativas de mais de 800 entidades, artistas e públicos tiveram de ser deixadas ao funcionário da receção.

Isto parece não preocupar nem desanimar os contestatários, porque, como diz Tânia Guerreiro, o "importante é o ato simbólico da entrega e assegurar uma resposta".

"O que queremos é abrir esta porta de diálogo e de resolução, e rápido, porque estas estruturas estão numa situação muito precária e não sabem o que vão fazer nos próximos tempos, ou no próximo ano, ou a partir de agora. E não são só as estruturas que ficam mal são uma data de artistas que colaboram com essas estruturas".

É o caso das Produções Independentes, que dirige, que vai ter de fechar por falta de financiamento, apesar de ter sido elegível.

Na sexta-feira passada, 11 de outubro, a DGArtes, responsável pela organização dos concursos a nível nacional, divulgou os resultados provisórios dos Concursos Sustentados Bienais 2020/2021, segundo os quais 177 candidaturas foram consideradas elegíveis, em "qualidade e diversidade", pelos júris de todas as áreas, de um total de 196 candidaturas apresentadas.

Das 177 candidaturas elegíveis, 102 vão receber financiamento, 75 consideradas elegíveis não receberão financiamento e 19 foram excluídas do concurso por terem sido consideradas não elegíveis pelos júris.

Sobre esta matéria, também na sexta-feira, o diretor-geral das Artes, Américo Rodrigues, contactado pela agência Lusa, disse que as entidades que não foram contempladas "podem e devem" contestar estes resultados provisórios, se deles discordarem.

A fase de audiência de interessados terminará no próximo dia 25 de outubro e os contratos com as estruturas apoiadas realizar-se-ão até ao final do corrente ano.

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