Café Santa Cruz festeja 90 anos determinado a vencer nova crise
Coimbra, 07 mai (Lusa) -- Concebido como café-restaurante no conturbado rescaldo da I Guerra Mundial, o Santa Cruz de Coimbra assinala 90 anos, na quarta-feira, com os atuais donos determinados em contrariar mais uma crise económica.
O café Santa Cruz abriu ao público em 1923, após adaptação de uma antiga igreja paroquial, na Baixa da cidade, contígua à igreja e ao mosteiro que acolheram os frades crúzios até 1834.
"Numa época de crise, algumas pessoas criaram aqui um café-restaurante que seria uma referência nacional", afirma à agência Lusa Vítor Marques, um dos gerentes.
Realçando que o empreendimento "começou a ser pensado logo após a I Guerra, numa altura conturbada da nossa vida social", aposta agora em "novos desafios" que contrariem a atual situação económica de Portugal.
Licenciado em Economia pela Universidade de Coimbra, Vítor Marques é filho de um dos antigos donos do Santa Cruz, Alexandre Marques, falecido no ano passado.
"É uma responsabilidade acrescida estar a gerir um espaço com toda esta dimensão histórica", refere.
Vítor Marques salienta que o café está inserido na área urbana que integra a candidatura de Coimbra a Património Mundial.
Joaquim Santana, professor do ensino básico aposentado, tem 84 anos, quase tantos como o café onde todas as manhãs se encontra com amigos, um espaço outrora frequentado pelos adeptos do União de Coimbra.
Clube de futebol das camadas populares da cidade, os `futricas`, o União tinha na Académica, apoiada sobretudo pelos `doutores`, o seu principal adversário.
Os adeptos da Briosa reuniam-se a escassas centenas de metros, no Arcádia.
Mas essas rivalidades, que chegavam a redundar em pancadaria, pertencem ao passado.
Desde que o café Arcádia encerrou, o academista Santana, pai de João Santana, que escreveu a história da Briosa em coautoria com o jornalista João Mesquita, passou a ir ao Santa Cruz.
"Tenho cá amigos. E os empregados tratam-me `muito mal`!", afirma com graça, desafiando o homem que lhe serve o café todos os dias.
Aos 78 anos, Francisco Simões, a quem os amigos chamam afetuosamente Chico Lua, também procura os companheiros unionistas naquela esplanada, onde "todos se sentem bem".
"Ó Lua, sente-se aqui", convida o academista Santana.
José Manuel Viseu, antigo dirigente do União, lê atentamente o jornal, partilhando a mesa com o amigo Carlos Alberto.
Jovens leem livros ou trabalham com o computador. Turistas de vários países demandam uma réstia de sol nas mesas em redor.
"Este era o café dos unionistas, onde se construía e destruía muita coisa!", sublinha o bem-humorado José Viseu, de 72 anos.
Um estudante universitário, geralmente adepto da Académica, "raramente entrava aqui", recorda, enquanto o engraxador Pinto dá lustro aos sapatos de mais um freguês.
Construído em 1530, como igreja, o edifício teve depois outras utilizações, como esquadra de polícia e sede de bombeiros.
O imóvel da Baixa foi classificado como monumento nacional, em 1921, tendo sido depois transformado em café-restaurante.
A inauguração ocorreu em 8 de maio de 1923, pelo facto de o antigo largo de Sansão, onde está situado, ter passado a designar-se praça 8 de Maio, no século XIX.
Este rossio foi escolhido pelo exército liberal, comandado pelo Duque da Terceira, para assinalar a sua "entrada vitoriosa" em Coimbra, em 08 de maio de 1874.
Ao lado, na igreja de Santa Cruz, está sepultado D. Afonso Henriques, fundador da nacionalidade.
Como há 90 anos, o Santa Cruz organiza hoje um jantar comemorativo para as entidades oficiais.
Na quarta-feira, acolhe a tertúlia "Liberdade na Praça 8 de Maio", promovida pela Pró Associação 8 de Maio.
No dia seguinte, o grupo de Teatro Viv`Arte apresenta o espetáculo "Cabaresque d`Ville", com música, dança e teatro.