Diretor do Palácio de Mafra: "Temos muito pouco espírito de conservação preventiva"

por Andreia Martins, Nuno Patrício – RTP
Nuno Patrício - RTP

O diretor do Palácio Nacional de Mafra falou à RTP sobre o estado de degradação dos dois carrilhões do monumento. Devido ao desgaste das estruturas que sustentam os dois conjuntos sineiros, alguns sinos correm risco de cair, o que levou a Direção Geral do Património, em conjunto com a Proteção Civil, a acionar um plano de contingência. Mário Pereira, responsável pelo Palácio, alerta que este é um problema que “se arrasta há bastante tempo”.

O agravamento do estado do tempo na última semana obrigou as autoridades a ativar um plano de contingência junto à entrada para o Palácio Nacional de Mafra. Desde sexta-feira da semana passada que o monumento tem um conjunto de baias que interditam o espaço à volta das duas torres sineiras devido ao risco de queda de alguns dos 119 sinos que compõem os dois carrilhões que datam do século XVIII.

Este plano de prevenção e mitigação foi levado a cabo pela Direção-Geral do Património Cultural, em colaboração com a Proteção Civil, com vista à proteção de pessoas e bens em caso de queda de algum objeto dos carrilhões, que aguardam intervenção há pelo menos 14 anos. Na quarta-feira, o presidente da Câmara de Mafra denunciava, em declarações à RTP, o estado de degradação avançada dos conjuntos sineiros.

Já esta quinta-feira, Mário Pereira, diretor do Palácio Nacional de Mafra, confirma que o processo de restauro “se arrasta há bastante tempo” e que o “primeiro sinal da cedência das estruturas é de 2004”.

“Desde 2004 que tem havido naturalmente um agravamento da situação, devido à cedência das madeiras e à corrosão dos metais”, diz o diretor, referindo-se à estrutura em volta dos sinos que sustenta e faz o escoramento dos carrilhões.

Ainda assim, considera que os conjuntos sineiros estão neste momento “devidamente escorados, devidamente monitorizados e com um plano de contingência caso exista um agravamento de situações atmosféricas”.

Mário Pereira critica a falta de prevenção nas questões de preservação do património. “Temos muito pouco espírito de conservação preventiva”, aponta.
Dois carrilhões históricos
O diretor salienta que a situação dos carrilhões não é nova e que uma operação imediata, logo em 2004, com o início da cedência das estruturas, teria sido “uma intervenção menor”. No entanto, nada foi feito e a situação foi-se agravando, apesar dos vários alertas, desde logo a nível internacional. Em 2014, a organização Europa Nostra declarou os carrilhões como Património em risco.

Os dois conjuntos históricos, agora em avançado estado de degradação, foram fundidos no ano de 1730 por alguns dos mais respeitados construtores de carrilhões da Europa, nas oficinas de Guillelmus Witlockx e Nicolau Levanche.

“O carrilhão da torre sul, o carrilhão Witlockx, é considerado um dos melhores carrilhões do mundo. Foi intervencionado em 1985, depois tocou até 2004 e posso dizer que era um carrilhão conceituado em termos mundiais. Não havia carrilhanista no mundo que não gostasse de ter no seu portefólio que tinha tocado no carrilhão Witlockx do Palácio de Mafra”, salienta.

Mário Pereira, diretor do Palácio, confirma que o contrato para a intervenção dos carrilhões já foi assinado no ano passado, tal como foi avançado na quarta-feira à RTP pela diretora-geral do Património Cultural. “Consideramos que a assinatura do contrato de intervenção nos carrilhões em 2017 como tendo sido um brinde aos nossos 300 anos”, refere o responsável do monumento, em referência ao tricentenário da colocação da primeira pedra, assinalado no ano passado.

Enquanto responsável pelo Palácio, Mário Pereira diz que foi alertando “sucessivamente” as várias entidades para a situação de agravamento ao longo dos anos. Reconhece que a Direção Geral do Património se mostrou “mais sensível a esta realidade” e que a própria diretora-geral, Paula Silva, tomou a intervenção nos carrilhões “como prioridade”.
Problemas com infiltrações e nas acessibilidades
Para além do problema dos carrilhões, o diretor do Palácio destaca também o problema das acessibilidades ao monumento nacional, para o qual também já existe um projeto em andamento.

Reconhece que “é muito complexo conseguir encontrar um espaço para um elevador” mas que já foram garantidas as “condições físicas e arquitetónicas” para poder construir o elevador. Mário Pereira espera que a questão da acessibilidade esteja resolvida antes do final do ano.

O diretor reconhece ainda que tem havido infiltrações de água no monumento e que essa é uma situação normal. “Temos algumas (infiltrações) que temos controladas. Estamos a falar de um monumento com uma área de implantação de cerca de 39.000 metros quadrados. Tudo aquilo que podemos fazer, que é limpar os algerozes, fazemo-lo, deixando as saídas de água devidamente desobstruídas para evitar infiltrações”, garante.

“Mesmo assim, depois há elementos da cobertura que precisam naturalmente de uma intervenção permanente. (…) Vamos fazendo aquilo que depende de nós, o que não depende de nós fica sujeito a projetos, a financiamentos e vai se fazendo na medida das possibilidades”, refere Mário Pereira.

Sobre a candidatura do Palácio Nacional de Mafra a Património Mundial, o diretor explica que o próprio projeto de candidatura “prevê um plano de gestão” que contempla as intervenções necessárias no edifício. Mário Pereira considera, no entanto, que estes problemas não deverão prejudicar a candidatura. “São problemas que temos devidamente detetados, que temos, sabemos o que fazer. e estamos a fazer aquilo que é possível fazer.

No final do ano passado, a Câmara Municipal de Mafra confirmou a receção do dossier de candidatura do Palácio Nacional de Mafra e da Tapada de Mafra pela UNESCO. A organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura deverá decidir sobre esta candidatura em 2019.
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