Dois séculos de orientações dos bispos de Bragança-Miranda reunidos em livro

Bragança, 22 set (Lusa) -- Um historiador de Bragança reuniu em livro 142 documentos com orientações dos bispos dos primeiros dois séculos da Diocese de Bragança-Miranda que revelam a mentalidade da Igreja e da sociedade transmontanas na época.

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O livro foi hoje apresentado e reúne, em 250 páginas, as "Pastorais dos Bispos de Miranda do Douro e Bragança", desde a criação da diocese de Miranda do Douro, em 1545, até se tornar na Diocese de Bragança-Miranda, em 1780.

"É muito importante para a história das mentalidades e da Igreja. São as diretrizes que os bispos tinham de regulamentar o comportamento das pessoas. A Igreja controlava toda a vida das pessoas e aqui transparecem essas normas todas", resumiu Carlos Prada de Oliveira.

O autor quis "salvaguardar e juntar os documentos para não se perderem e como apoio para alguns investigadores que dificilmente teriam acesso" aos mesmos.

Carlos Prada dedica-se à história religiosa e descobriu nestas pastorais dos bispos algumas "particularidades transmontanas", nomeadamente a abertura da Igreja às condições específicas desta região.

Um exemplo está expresso na pastoral de um bispo em 1764 que, para "evitar o rigor" do jejum da Quaresma e da proibição de comer carne numa região longe do litoral, onde não chegava pescado, permitiu o consumo de ovos e leite.

"Era uma fuga às regras: não se pode comer mas, aqui como estamos longe de tudo, podemos comer ovos e leite", enfatizou.

Mas há também nestas pastorais a proibição de alguns festejos por provocarem excessos e de os padres habitarem com mulheres casadas e com menos de 50 anos.

"Naquele tempo tinham uma criada em casa que tinha de ter mais de 50 anos", contou.

A Câmara de Bragança, que apoia a publicação, decidiu associar o lançamento a uma homenagem de despedida ao atual bispo, D. António Moreira Montes que passará o testemunho, dentro de uma semana, ao sucessor José Cordeiro, o mais jovem bispo de Portugal, com 44 anos.

As pastorais do bispo cessante deverão constar do próximo volume deste trabalho, mas há preocupações dos antecessores comuns ao episcopado contemporâneo.

D. António Moreira Montes aponta o exemplo dos costumes populares "que nem sempre são ortodoxos", embora estejam associados a celebrações religiosas.

O caso mais evidente de há três séculos, e atual, é a romaria da Senhora da Serra, em Bragança. Há muita gente que passa, na serra, 18 dias num verdadeiro retiro pastoral, mas também há quem lá vai só para jantar a carne transmontana ou para um jogo da batota.

D. António não deixa de notar que as preocupações dos antecessores não eram apenas com os fiéis, pois algumas pastorais procuravam que os padres fossem exemplares no cumprimento das suas funções, apontando para aqueles que, à época, faziam contrabando na fronteira.

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