Fortaleza construída pelos portugueses em Malaca está a ser recuperada

A Fortaleza de Malaca, uma construção portuguesa do ano 1511 e destruída pelos britânicos em 1807, está a ser reconstruída pelo governo da Malásia, que quer dar ao monumento o seu traço original.

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"A Famosa" DR

A colaborar na reconstrução do Forte, também conhecido como "A Famosa", está Rui Loureiro, especialista na história da presença portuguesa na Ásia.

"Fui contactado pelo Ministério do Património malaio, que está interessado em reconstruir, não toda, mas tudo o que for possível da Fortaleza de Malaca", disse o historiador à agência Lusa.

De acordo com Rui Loureiro, as autoridades malaias estão a contactar com pessoas que lhes possam dar informações sobre os diferentes períodos do Forte de Malaca: o português, o holandês e o britânico.

O historiador português esteve recentemente em Malaca em reuniões com equipas de arqueólogos e arquitectos.

"Eles têm uma equipa muito bem formada e a par das questões do património", afirmou.

A colaboração de Rui Loureiro passou por fazer uma pesquisa de toda a documentação que existe da parte portuguesa, nomeadamente desenhos feitos do Forte em várias épocas e por diferentes autores.

"A fortaleza foi construída a pouco e pouco. A primeira fase demorou entre seis a sete meses. Mas foi sendo acrescentada ao longo dos anos. Há informações de que teve obras de reconstrução até à saída dos portugueses", contou à Lusa.

A principal causa dessas obras de reconstrução eram os constantes ataques dos inimigos.

Da antiga fortaleza com cerca de um quilómetro de perímetro, hoje resta apenas a porta de Santiago, de origem portuguesa.

Neste momento, a equipa de arqueólogos está a fazer escavações no local onde foi construída a fortaleza, tendo encontrado já dois bastiões, disse Rui Loureiro.

"Um deles foi construído pelos holandeses e vai ser o primeiro a ser reconstruído. É o bastião de Middleburgh", indicou.

"O segundo, que também já estão a escavar, é português. O Bastião de Santiago", acrescentou.

O historiador disse ainda que vão "tentar também reconstruir a muralha" da fortaleza.

Contudo, os malaios não vão conseguir reconstruir a fortaleza na sua totalidade porque, hoje em dia, existem casas que foram construídas em cima das antigas muralhas.

"O objectivo deste investimento é o turismo cultural", indicou Rui Loureiro, acrescentando que a reconstrução está a ser feita com todo o rigor.

"É um trabalho muito interessante. Estão a fazer todo o trabalho arqueológico e depois vão reconstruir os bastiões. Vão reconstruir tal e qual, usando os materiais idênticos", afirmou.

O material utilizada na construção de "A Famosa" foi a laterite (uma pedra avermelhada), pelo que os malaios vão importar uma pedra muito semelhante que há na Indonésia, indicou o historiador.

De acordo com Rui Loureiro, os malaios querem iniciar a reconstrução do bastião de Middleburgh ainda este ano.

Apesar disso, o especialista considera que a reconstrução total da fortaleza "deverá demorar 10 anos".

"Originalmente tinha 10 ou 11 bastiões. Era uma coisa enorme", afirmou.

Por agora, Rui Loureiro está a tentar encontrar mais material sobre a construção, o aspecto e a vida dos portugueses na Fortaleza de Malaca e deverá regressar àquele país para colaborar na reconstrução do bastião de Santiago.

O Forte de Malaca foi construído em 1511 por Afonso de Albuquerque, o conquistador de Malaca e principal arquitecto do império marítimo português no Oriente.

Numa carta, um italiano que trabalhava com os portugueses, disse que os homens "com grande celeridade, de dia e de noite, construíram uma fortaleza com barrotes de madeira e num mês fizeram-na forte".

"Assim que estava suficientemente forte, começámos a fazer uma de pedra, que construímos deitando abaixo casas, mesquitas e outras construções dos locais. Foi uma tarefa difícil transportar as pedras às costas", disse o italiano.

Numa outra parte da carta, pode ainda ler-se: "quase todos os dias éramos atacados pelo inimigo. O forte foi construído com as armas ao nosso lado".

A Fortaleza era constituída por grandes muralhas e quatro torres principais: uma era o suporte da feitoria e as outras albergavam o paiol de munições, a residência do capitão e os quartos de alguns oficiais.

Uma ilustração datada de 1604 e da autoria de Manuel Godinho de Erédia, um português nascido em Malaca, mostra como o espaço estava dividido dentro do Forte.

Além de indicar pormenores como a existência de um poço de água para ser utilizado apenas "em caso de distúrbios ou guerra", Manuel Godinho de Erédia dá conta de edifícios como uma Igreja Matriz, uma Câmara Municipal, uma Misericórdia, o Hospital dos Pobres, o Hospital Real, o Colégio e Igreja Jesuíta, um palácio, uma prisão e dois conventos.

O Forte, que teve o duplo objectivo de garantir a segurança de Malaca e de impulsionar as trocas comerciais, esteve sob domínio dos portugueses até 1641, ano em que foi conquistado pelos holandeses.

Em 1795, "A Famosa" ficou sob poder britânico, que decidiu, doze anos depois, mandar destruí-la para evitar que caísse em mãos inimigas.

A Fortaleza foi demolida na sua quase totalidade, valendo-lhe a intervenção de Stamford Raffles, fundador de Singapura, que visitou Malaca em 1810 e impediu a destruição da Porta de Santiago.

No século XX, em 1946, Malaca foi integrada na Federação Malaia.

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