"Já não existem ideias de esquerda" no mundo, diz José Saramago

O escritor português José Saramago, Prémio Nobel da Literatura 1998, considera, numa entrevista ao diário argentino "La Nácion" hoje publicada, que "já não existem ideias de esquerda" no mundo.

Agência LUSA /

Na entrevista, o escritor também comentou que a vaga de distúrbios que tem vindo a atingir a França desde o final de Outubro "não é um exclusivo de Paris".

"Os bairros das grandes cidades da Europa estão cheios de gente excluída que um dia se farta. Há que tomar medidas para que a vida humana tenha sentido", disse o autor.

Comentando a situação política da Argentina, considerou que "em geral", o presidente "está a fazer um bom trabalho" e que o país "vai em boa direcção".

"O facto de Néstor Kirchner ser de centro-esquerda não significa nada", acrescentou.

Segundo Saramago, "hoje já não existem ideias de esquerda".

"Estamos numa situação em que se combina o domínio do sistema capitalista de rosto neo-liberal com uma esquerda que não soube reorientar-se depois do colapso da União Soviética", observou.

Para o autor de "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", que é filiado no Partido Comunista Português, "até a China é hoje um dos países capitalistas mais duros que se podem encontrar sob a fachada do partido único" e "o momento não é o melhor para que possam nascer novas ideias capazes de mobilizar as pessoas".

"Por isso, o que a esquerda fez, ou pelo menos o que fizeram os partidos socialistas, foi aproximar-se do centro, esquecendo que, quando a esquerda se acerca do centro, aproxima-se da direita", opinou.

Na entrevista, Saramago fala ainda sobre o seu último livro, "As Intermitências da Morte", no qual as pessoas deixam de morrer porque a "grande ceifeira" interrompe as suas funções.

"Viver eternamente na Terra seria um castigo", comentou, sobre o romance, acrescentando, no entanto, que "se bem que nada pode tirar o medo da morte, escrever ou ler sobre ela é um bom exercício de simulação".

"Não temo a morte nem passo os dias com essa preocupação, mas sim, sou consciente dela. Tenho a idade suficiente para dizer que sou velho, 83 anos, mas vivo como se tivesse 75, que é uma idade maravilhosa", assegurou.

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