Necrópole da Idade do Ferro e descoberta há 37 anos em Odemira abre ao público 3/a feira

por © 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.

** Luís Miguel Lourenço, da agência Lusa **

Odemira, Beja, 05 Mai (Lusa) - Os curiosos por vestígios do passado vão poder visitar, a partir de terça-feira, as 10 sepulturas visíveis da Necrópole do Pardieiro, datada da Idade do Ferro e descoberta há 37 anos no concelho alentejano de Odemira (Beja).

O sítio arqueológico, onde foram achadas três lápides epigrafadas com Escrita do Sudoeste e duas estelas decoradas com marcas de pés, situa-se no antigo Monte do Pardieiro, a cerca de três quilómetros da localidade de Corte Malhão, na freguesia de São Martinho das Amoreiras.

A necrópole foi descoberta em 1971, através do achado "acidental", a poucos metros do local, de uma lápide epigrafada com Escrita do Sudoeste, a mais antiga escrita da Península Ibérica, lembrou hoje à agência Lusa o arqueólogo Virgílio Hipólito Correia, um dos responsáveis pelas escavações.

A lápide foi encontrada pelo então proprietário do Monte do Pardieiro, que decidiu "investigar" em que objecto o seu arado encalhava sempre que lavrava a terra no local, contou hoje à Lusa o arqueólogo Jorge Vilhena, responsável pelos trabalhos arqueológicos de restauro e de valorização da necrópole.

"Foi um achado acidental de uma pedra com letras. O achador nem sequer tinha consciência de que havia encontrado uma lápide epigrafada com Escrita do Sudoeste", contou Virgílio Hipólito Correia, lembrando que a lápide foi guardada na antiga associação cultural de Garvão, no concelho vizinho de Ourique.

A lápide só seria identificada mais tarde pelos arqueólogos Caetano de Mello Beirão e Mário Varela Gomes, que se dedicavam ao estudo da epigrafia da primeira Idade do Ferro do Sudoeste da Península Ibérica e que estavam a escavar em Garvão.

"Na altura da identificação, os arqueólogos verificaram que a lápide tinha sido achada a meia dúzia de metros do local original. Ficou claro que a necrópole à qual pertencia localizava-se nas imediações", explicou Virgílio Hipólito Correia.

A lápide tinha inscrito um signo "muito pouco conhecido" na Escrita do Sudoeste e que levantou dúvidas sobre a pertença da inscrição àquela epigrafia e sobre a cronologia da própria lápide e, por arrasto, da Escrita do Sudoeste no seu todo".

Para "esclarecer as dúvidas" e "conhecer com mais exactidão e pormenor o contexto arqueológico da lápide", actualmente em exposição no Museu da Escrita do Sudoeste, em Almodôvar, os arqueólogos Caetano de Mello Beirão e Virgílio Hipólito Correia escavaram o sítio, entre 1989 e 1990.

As escavações arqueológicas permitiram colocar a descoberto 10 sepulturas em forma de monumento e achar outras duas lápides fragmentadas e epigrafadas com Escrita do Sudoeste e duas estelas decoradas com gravuras em forma de pé, conhecidas como podomorfos.

Nas sepulturas foram também achadas oferendas funerárias votivas, como colares de contas de pasta vítrea e de âmbar, pingentes de cornalina (ágata pedra preciosa), peças de cerâmica e algumas armas de ferro, como facas e pontas e contos de lança.

Após as escavações, financiadas pelo Estado, seguiram-se intervenções de restauro e valorização da necrópole, suportadas pelo município de Odemira.

Aos trabalhos arqueológicos de restauro e conservação dos túmulos, em 2001, seguiu-se a valorização da envolvente da necrópole, em 2007, com a vedação do local, a criação de condições para o acesso pedonal e a instalação de sinalização e de painéis explicativos.

Além das 10 sepulturas escavadas, os arqueólogos identificaram outras duas sepulturas periféricas, que "não foram escavadas por estarem debaixo de um sobreiro", explicou Jorge Vilhena, referindo que, durante os trabalhos de vedação do sítio, em 2007, foi identificada uma 13ª sepultura, que deverá começar a ser escavada no final deste mês.

As duas lápides fragmentadas e epigrafadas com Escrita do Sudoeste achadas na necrópole estão em depósito no Museu Regional de Beja e os restantes achados estão guardados na Câmara Municipal de Odemira.

A abertura oficial da necrópole ao público, marcada para as 15:00 de terça-feira, inclui também uma palestra de Virgílio Hipólito Correia sobre a Necrópole do Pardieiro e a investigação da Escrita do Sudoeste, que vai decorrer, a partir das 21:30, na Biblioteca Municipal de Odemira.

A Escrita do Sudoeste ou Tartéssica, da I Idade do Ferro no Sul de Espanha e Portugal, foi desenvolvida pelos Tartessos, o nome pelo qual os gregos conheciam a primeira civilização do Ocidente, que se terá desenvolvido nas zonas das actuais regiões da Andaluzia espanhola e Baixo Alentejo e Algarve.

Com cerca de 2.500 anos, a escrita dos Tartessos, que tiveram influências culturais de Egípcios e Fenícios, terá entrado em desuso a partir do século V a.C., é distinta das dos povos vizinhos, complexa e permanece indecifrável até à actualidade.

pub