Pesquisas arqueológicas em Moçambique desvendam 30 a 50 mil anos da evolução humana
As pesquisas arqueológicas em Moçambique realizadas pelo arqueólogo Nuno Bicho, que mapeou várias áreas do país, identificaram 600 jazidas e nove grutas, ajudando a desvendar 30 a 50 mil anos da evolução humana, disse à Lusa o investigador.
O arqueólogo, que foca as suas pesquisas em aspetos que se relacionam com o aparecimento da espécie `Homo Sapiens` e a sua evolução, afirmou que as suas descobertas são difíceis de caracterizar de uma forma clara e que tenham visibilidade para o público.
Nuno Bicho contou à Lusa que fizeram um "mapeamento muito grande de várias áreas" de Moçambique, o que permite à sua equipa "ter alguma confiança nos conhecimentos".
Quando começou a trabalhar em Moçambique, entre 2010 e 2011, o investigador "não tinha praticamente informação", daí querer efetuar as pesquisas neste país lusófono, sendo que pela mesma razão foi trabalhar para o Sudão, país que tem como foco principal no futuro.
Recorda que existiam cerca de 250 jazidas - locais onde são encontrados vestígios de ocupação humana antiga, incluindo objetos, estruturas e outros vestígios - da Idade da Pedra localizadas, "principalmente pelos trabalhos das missões antes da independência de Moçambique", e que, com a sua investigação, passaram a 600 jazidas, que podem ter durado entre 20 a 40 mil anos.
Estes locais "permitem ter uma visão evolutiva e de transformação daquilo que foram as adaptações dos caçadores-recoletores de há 30, 40 e 50 mil anos atrás", acrescentou.
O professor da Universidade do Algarve (UAlg) deu dois exemplos de jazidas que exploraram, como a jazida de Txina-txina, na zona de Massingir, no rio dos Elefantes, e a jazida de Chessungalane, junto ao rio Save, onde encontraram muitos materiais arqueológicos, "desde ferramentas em pedra, pequenas contas feitas de casca de ovo de avestruz" a "uma profusão alargada de ossos e de conchas".
"Escavei duas grutas na zona de Inhassoro, que têm ocupações que vão desde os 30 mil anos até à Idade do Ferro", relata o arqueólogo, acrescentando que "são ocupações muito intensas e com muitos materiais", e que com tudo isso permite "perceber como é que foi a vida dessas ocupações e desses (...) antepassados em vários pontos de Moçambique".
Estas grutas foram identificadas por profissionais da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo, capital de Moçambique, que coopera e está associada ao Centro Interdisciplinar de Arqueologia e Evolução do Comportamento Humano, da UAlg, sendo que o arqueólogo Nuno Bicho identificou nove grutas.
Já no Gabão, arqueólogos tentam reconstruir a pré-história da África Central, explorando e analisando cavernas, o que é muito parecido com os trabalhos arqueológicos desenvolvidos nas grutas em Moçambique, apesar de estarem localizadas em regiões diferentes, sendo que a nível cronológico são muito semelhantes, aponta o especialista.
Acrescenta ainda que "há regiões de África desconhecidas e, portanto, tudo o que se faça de novo, como em Moçambique e no Gabão é informação que vai trazer aspetos novos ou complementar", o que permite perceber "melhor aquilo que foi o nosso passado, a (...) evolução e adaptação neste espaço".
Em entrevista, o investigador destacou a complexidade dos processos de restituição de peças históricas aos seus países de origem, afirmando que é fundamental que o estudo dos materiais possa ser realizado de forma eficaz, independentemente de onde estejam.
Apesar da complexidade, Nuno Bicho defende que o ideal é que o depósito dessas peças ocorra "nas melhores condições possíveis e de preferência nos países de origem".
O especialista contou que a sua equipa trouxe materiais de Moçambique para Portugal com autorização das autoridades do país africano para estudá-los e, no final, eles serão devolvidos à Universidade Eduardo Mondlane, uma atitude que Nuno Bicho considera ser a mais correta.
A investigação, que está a ser feita pelo professor da UAlg, insere-se no projeto `Dispersals, resilience, and innovation in Late Pleistocene SE Africa`, financiado pelo Conselho Europeu de Investigação.