PR de Cabo Verde diz que uma sociedade livre precisa de escritores mesmo em tempos de IA

O Presidente da República de Cabo Verde afirmou hoje que uma sociedade que ambiciona permanecer livre precisa de escritores que a questionem, mesmo nos tempos atuais de desafios para a criação literária, como os que provocam a inteligência artificial.

Lusa /

"A Inteligência Artificial inaugura um horizonte simultaneamente fascinante e inquietante, em que o engenho humano parece competir com o próprio mistério da criação", disse José Maria Neves, na abertura oficial do XIII Encontro de Escritores da Língua Portuguesa, que decorre até sábado na capital cabo-verdiana.

A inteligência artificial é precisamente um dos temas deste encontro, organizado pela União das Cidades Capitais da Língua Portuguesa (UCCLA) e a Câmara Municipal da Praia, a par da literatura e dos 50 anos da independência das ex-colónias portuguesas.

O chefe de Estado cabo-verdiano referiu que "uma sociedade que ambiciona permanecer livre precisa de escritores que a questionem, de leitores que se deixem comover e de bibliotecas que guardem a memória do efémero".

Para José Maria Neves, "a inteligência artificial não deve ser um sucedâneo da consciência, mas o reflexo da sua complexidade".

"A técnica, por si só, é cega, necessita da luz da ética, da cultura e da sabedoria para não se tornar instrumento de alienação. A literatura, guardiã da alma e da sensibilidade, tem aqui uma missão inadiável: A de preservar o mistério e a beleza que nenhuma máquina poderá traduzir. É nela que reside a memória do humano, o fôlego do imaginário e a transcendência que escapa a toda a codificação", disse.

José Maria Neves inaugurou depois um busto de Camões, oferecido pela UCCLA, e que será colocado posteriormente no Plateau da cidade da Praia.

Oficialmente aberto pelo chefe de Estado cabo-verdiano, o encontro prosseguiu com um debate com contou com a participação física do escritor cabo-verdiano Germano Almeida, que recordou a forma como as várias gerações apreciaram, ou não, Camões, que este ano assinala o V centenário.

O Prémio Camões (2018) sublinhou que coube ao poeta maior algumas das mais lindas frases, que incluiu nos seus sonetos.

O Prémio Camões na edição anterior (2017), Manuel Alegre, marcou presença através de um texto que foi lido no encontro, através do qual indicou que, "antes de ser Estado, Portugal foi língua, trova, cantar de amigo".

"Tal como antes de serem Estados independentes, os países colonizados foram os poemas dos poetas seus fundadores escritos em língua portuguesa", escreveu.

Nas palavras que enviou para a Praia, Alegre também recordou Camões, considerando que a escrita de Os Lusíadas foi um "momento único e irrepetível".

"Ninguém melhor e maior do que ele, a sua vida e a sua escrita para simbolizar a unidade e diversidade de uma língua que é inseparável do mar e da múltipla viagem afetiva e cultural dos encontros, desencontros e reencontros entre os povos que dela fizeram a sua fala", adiantou.

Hélia Correia, prémio Camões em 2015, também se representou através de uma mensagem, partilhando um lamento pela "falta de leitura, pelo antigo recurso às bibliotecas hoje substituído pelos livros intactos nas estantes".

"O meu lamento começa em D. Dinis, que passa por Camões e acaba em Agustina, torna-se, às vezes, infundamentado e então respiro intensamente o ar, como quem luta pela própria vida", referiu na mensagem lida no encontro.

Mais de 20 escritores lusófonos participam a partir de hoje num encontro na capital de Cabo Verde, Praia, que abordará temas como a inteligência artificial e os 50 anos da independência das ex-colónias portuguesas, além de homenagear Camões.

A maioria dos escritores que participam neste encontro esteve durante a manhã numa escola secundária e na Universidade de Cabo Verde.

Os jovens quiseram saber o que levou estes autores a enveredarem pela escrita, tendo recebido dos mesmos relatos da sua trajetória pessoal que passou por um desejo persistente, em certos casos, ou num simples acaso, em outros.

Na sexta-feira será apresentado o Prémio de Revelação Literária UCCLA-CML, com o premiado Cláudio da Silva.

 

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