Quadros inéditos de Cunhal na Festa do Avante

A memória de Álvaro Cunhal tem dominado a 29ª Festa do Avante, com os seus quadros inéditos e várias evocações do antigo líder a atraírem a atenção dos milhares de visitantes.

Agência LUSA /
Álvaro Cunhal

Entre as obras de 107 artistas que responderam ao mote "Tempo Mau para Lirismos", um poema do alemão Bertholdt Brecht, pontuam duas obras do dirigente histórico do Partido Comunista Português, dois óleos sobre tela sem títulos.

Expostas costas com costas, as telas mostram o estilo conhecido da produção artística de Cunhal, com figuras de recorte popular, cheias de movimento.

Um dos quadros ilustra uma festa popular nocturna, com muitas cenas separadas a comporem um conjunto iluminado por uma luz cuja fonte não se vê no quadro.

A outra tela, de tom mais sombrio, mostra várias colunas de populares que avançam através de montes pela noite, como numa procissão. Álvaro Cunhal aplicou uma técnica pontilhista à composição, onde um olhar mais atento revela homens com ligaduras, desmaiados, levados em ombros ou com expressões de aflição e dor.

Esta pintura recolheu o espanto de alguns visitantes que passavam pela bienal e descobriram que os quadros, sem nenhuma sinalização especial que os identifique, foram pintados pela mão do ex- secretário-geral do PCP, que morreu em Junho deste ano.

A figura do antigo líder está também presente no "merchandising", com camisolas decoradas com alguns dos seus desenhos, artigos que têm tido bastante procura na loja da Festa, tal como livros sobre a vida e obra literária de Cunhal.

Além das frases de Cunhal pintadas por todo o espaço da Festa, no Espaço Central foi colocado um painel com fotografias e citações de Álvaro Cunhal, a poucos metros de outro painel em que se recorda Vasco Gonçalves, "general de Abril e amigo do povo", que morreu este ano.

O tom da bienal é sombrio, com quadros com títulos como "Iraque" e "Carta a Jorge W. II" a subscreverem o poema de Brecht que diz que este é um "mau tempo para lirismos".

Logo à entrada do percurso da Bienal, num quadro de Carlos Gabriel Silva chamado "Danos Colaterais", várias "aparições" do Rato Mickey fazem um contraponto surrealista a outros ratos, com camuflados semelhantes aos do exército norte-americano no Iraque que devoram um corpo ensanguentado.

Ao lado, uma fotografia do colectivo Dirty Cop mostra dois jovens com barretes que lhes cobrem a cara, que rodeiam numa pose ameaçadora uma caixa de metal com um retrato do presidente norte- americano, em que a boca foi substituída por um ralo.

Fotografias de fábricas têxteis abandonadas, referências à guerra no Iraque e ao negócio do petróleo, caras angustiadas e evocações de outros comunistas famosos, como o poeta Ary dos Santos, compõem outras peças em exposição.

As instalações, pelos seus formatos inusitados, atraem bastante a atenção, especialmente o trabalho "Ants", da associação de antigos alunos da Escola Universitária das Artes de Coimbra, que reproduz um formigueiro, completo com formigas, que permite espreitar lá para dentro e vê-las em poses e atitudes tão humanas quanto ler o jornal ou em quadros mais poéticos, como uma formiga a flutuar numa nuvem.

A atenção dos visitantes divide-se entre os espectáculos do Palco 25 de Abril, por onde já passaram Bunnyranch e Primitive Reason, pela festa do Disco ou pela festa do Livro, onde as filas nas caixas são constantes.

A Festa conta ainda com as actuações de Xutos & Pontapés, Clã, Brigada Vítor Jara e Da Weasel, que encerram no Domingo à noite os três dias da "rentreé" comunista.

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