Cultura
Relação entre líder judaico português e regime Nazi investigada em “O segredo da Rua d’O Século”
As relações entre o presidente da Comunidade Israelita de Lisboa e o Terceiro Reich e o apoio do jornal “O Século” ao regime nazi foram investigadas pelos historiadores António Louçã e Isabelle Paccaud. Fotografias que provam a proximidade são apresentadas no livro “O Segredo da Rua d’O Século”, que chega ao público terça-feira.
A “personagem” principal é o economista judeu Moses Bensabat Amzalak, que se coloca “do lado do sector mais anti-semita europeu – o nazismo alemão – que dura quatro anos”, explicou à RTP António Louçã. Amzalak, além de amigo de Salazar, era membro da direcção da Associação Comercial de Lisboa, proprietária de “O Século”, e quem mais influenciava a linha editorial do jornal. A publicação queria favorecer o golpe de Estado de 28 de Maio de 1926, que vem pôr termo à Primeira República.
A obra tem como fio condutor “o período de apoio à Alemanha Nazi, durante esses quatro anos (1935-1939), por uma figura pública e um jornal português”, declarou o historiador à RTP.
O ano de 1935 foi de viragem na orientação ideológica do jornal, que de pró-fascista passa para pró-nazi. “A saída de Amzalak d’O Século coincide com uma abordagem mais crítica relativamente à Alemanha”, afirma o autor. No entanto, os investigadores são cautelosos: “não podemos supor que a evolução do jornal é a evolução dele”.
Amzalak manteve, até 1939, contactos com o chefe da Legação alemã em Lisboa, o barão von Hoyningen-Huene. As ligações entre a Universidade de Lisboa e as suas congéneres alemãs foram estreitadas com a inauguração da Sala de Estudos Alemães, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, dirigido pelo próprio Amzalak. A troca de convites para eventos sociais entre ambos terá sido determinante para o que os investigadores chamam de “proximidade”.
Amzalak foi, afirma António Louçã, “o único dirigente judeu que os alemães condecoram no período nazi”. Em Julho de 1935, Amzalak foi agraciado com a Cruz de Mérito de Primeira Classe da Cruz Vermelha Alemã, tendo-lhe sido oferecida ainda uma miniatura da condecoração, para ostentar em eventos sociais.
O grau de importância das relações do também dirigente da Comunidade Israelita de Lisboa com a Legação alemã na capital portuguesa levou o regime nazi a ignorar o judaísmo da Amzalak. “Os editoriais não são assinados, mas os alemães sabem que ele foi determinante na orientação do jornal”, notou António Louçã.
Uma das principais ideias do livro, destacadas pelo seu autor, está relacionada com as diferentes posições seguidas pela comunidade judaica num contexto de crise. “Os membros de uma religião judaica tomam posições diferentes, no meio de uma crise como a que se viveu nos anos 30: são apoiantes do Partido Fascista Italiano, mas também existem judeus a combater pela República espanhola”, contextualiza António Louçã. O historiador adianta que a posição de Amzalak pode residir numa perspectiva da “Alemanha Nazi como o principal baluarte contra o Comunismo”.
Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Portugal foi a porta de saída da Europa para os refugiados judeus. Amzalak, enquanto líder da Comunidade Israelita era procurado para providenciar alojamento e alimentação aos que estavam em trânsito.
Fica em aberto o debate sobre a forma como Amzalak preparava a saída de judeus em colaboração com organizações internacionais de ajuda, que contribuíam com somas avultadas. Enviado pelo Congresso Mundial Judaico a Portugal, Isaac Weissman investigou e denunciou a colaboração. As relações com a comunidade judaica de Lisboa esmoreceram, mas o Congresso Judaico silenciou a questão.
As queixas do representante do Congresso Judaico, quanto à condecoração com a Cruz de Mérito alemã, haviam sido referidas por António Louçã na obra “Conspiradores e Traficantes”, de 2005. A Comunidade Israelita classificou a investigação de “falsa e caluniosa”. O Congresso Judaico não se pronunciou.
A obra, com documentos recolhidos em arquivos de Berlim, Londres, Jerusalém e Lisboa, assim como imagens reunidas no Arquivo Fotográfico de Lisboa, será apresentada pelo professor de Sociologia do ISCTE Alan Stoleroff.
“O segredo da Rua d’O Século – Ligações perigosas de um dirigente judeu com a Alemanha nazi (1935-1939)”, da autoria do historiador e jornalista da RTP António Louçã e da doutoranda e assistente de História na Universidade de Lausanne Isabelle Paccaud, numa edição da Edições Fim de Século, é apresentado na próxima terça-feira, às 18h, na Biblioteca-Museu República e Resistência, em Lisboa.
A obra tem como fio condutor “o período de apoio à Alemanha Nazi, durante esses quatro anos (1935-1939), por uma figura pública e um jornal português”, declarou o historiador à RTP.
O ano de 1935 foi de viragem na orientação ideológica do jornal, que de pró-fascista passa para pró-nazi. “A saída de Amzalak d’O Século coincide com uma abordagem mais crítica relativamente à Alemanha”, afirma o autor. No entanto, os investigadores são cautelosos: “não podemos supor que a evolução do jornal é a evolução dele”.
Amzalak manteve, até 1939, contactos com o chefe da Legação alemã em Lisboa, o barão von Hoyningen-Huene. As ligações entre a Universidade de Lisboa e as suas congéneres alemãs foram estreitadas com a inauguração da Sala de Estudos Alemães, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, dirigido pelo próprio Amzalak. A troca de convites para eventos sociais entre ambos terá sido determinante para o que os investigadores chamam de “proximidade”.
Amzalak foi, afirma António Louçã, “o único dirigente judeu que os alemães condecoram no período nazi”. Em Julho de 1935, Amzalak foi agraciado com a Cruz de Mérito de Primeira Classe da Cruz Vermelha Alemã, tendo-lhe sido oferecida ainda uma miniatura da condecoração, para ostentar em eventos sociais.
O grau de importância das relações do também dirigente da Comunidade Israelita de Lisboa com a Legação alemã na capital portuguesa levou o regime nazi a ignorar o judaísmo da Amzalak. “Os editoriais não são assinados, mas os alemães sabem que ele foi determinante na orientação do jornal”, notou António Louçã.
Uma das principais ideias do livro, destacadas pelo seu autor, está relacionada com as diferentes posições seguidas pela comunidade judaica num contexto de crise. “Os membros de uma religião judaica tomam posições diferentes, no meio de uma crise como a que se viveu nos anos 30: são apoiantes do Partido Fascista Italiano, mas também existem judeus a combater pela República espanhola”, contextualiza António Louçã. O historiador adianta que a posição de Amzalak pode residir numa perspectiva da “Alemanha Nazi como o principal baluarte contra o Comunismo”.
Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Portugal foi a porta de saída da Europa para os refugiados judeus. Amzalak, enquanto líder da Comunidade Israelita era procurado para providenciar alojamento e alimentação aos que estavam em trânsito.
Fica em aberto o debate sobre a forma como Amzalak preparava a saída de judeus em colaboração com organizações internacionais de ajuda, que contribuíam com somas avultadas. Enviado pelo Congresso Mundial Judaico a Portugal, Isaac Weissman investigou e denunciou a colaboração. As relações com a comunidade judaica de Lisboa esmoreceram, mas o Congresso Judaico silenciou a questão.
As queixas do representante do Congresso Judaico, quanto à condecoração com a Cruz de Mérito alemã, haviam sido referidas por António Louçã na obra “Conspiradores e Traficantes”, de 2005. A Comunidade Israelita classificou a investigação de “falsa e caluniosa”. O Congresso Judaico não se pronunciou.
A obra, com documentos recolhidos em arquivos de Berlim, Londres, Jerusalém e Lisboa, assim como imagens reunidas no Arquivo Fotográfico de Lisboa, será apresentada pelo professor de Sociologia do ISCTE Alan Stoleroff.
“O segredo da Rua d’O Século – Ligações perigosas de um dirigente judeu com a Alemanha nazi (1935-1939)”, da autoria do historiador e jornalista da RTP António Louçã e da doutoranda e assistente de História na Universidade de Lausanne Isabelle Paccaud, numa edição da Edições Fim de Século, é apresentado na próxima terça-feira, às 18h, na Biblioteca-Museu República e Resistência, em Lisboa.