Salazar "não usou fado como instrumento de propaganda"
"O regime de Salazar não usou o fado como instrumento de propaganda", mas teve de aceitá-lo como "parte do repertório oficial nacional", afirma o historiador Michael Colvin num artigo hoje publicado pelo jornal britânico The Guardian.
Num longo artigo intitulado "Tainted Love", sobre a relação entre o fado e o Estado Novo o jornal refere a ligação do fado ao regime de Salazar e explica como fadistas do pós-25 de Abril vêem essa associação.
No artigo, o jornal cita Michael Colvin, historiador de um instituto superior de Manhattan, nos Estados Unidos, sobre a popularidade do fado no tempo de governação de Oliveira Salazar.
Apesar de não ter usado este género musical como ferramenta propagandística, "a popularidade do fado era tal que o governo não teve outra hipótese que incluí-lo no repertório oficial nacional", refere o historiador.
Numa explicação histórica sobre o fado, The Guardian dá como exemplo a carreira de Amália Rodrigues e a coincidência entre a sua ascensão internacional na década de 1940 e o período forte da governação de Salazar.
Amália Rodrigues é referida no artigo como uma cantora conservadora que terá, involuntariamente, encorajado uma associação entre fado e o regime de Salazar, mas também como uma artista que interpretou autores censurados, como Alexandre O`Neill, Manuel Alegre e José Carlos Ary dos Santos.
Apesar desse "conservadorismo", as interpretações de Amália Rodrigues soavam "estranhamente futuristas e absolutamente internacionais", elogia o jornal, dando como referências a música sefardita, brasileira, cubana, andaluz e grega.
Passados trinta anos sobre o anterior regime, a fadista Mariza afirma ao jornal que só agora é que os intérpretes revisitam o fado.
"Os jovens portugueses abandonaram o fado nos anos 70", assinala a intérprete de "Fado Curvo".
A "inovação musical" de Amália Rodrigues inspirou uma nova geração de fadistas e grupos musicais, incluindo, segundo o jornal britânico, os Madredeus e as fadistas Kátia Guerreiro, Margarida Bessa, Cristina Branco, Joana Amendoeira e Mariza.
Em complemento ao artigo, o jornal publica ainda um guia para quem se quer iniciar na audição do fado, com uma lista de oito discos que inclui Amália Rodrigues, Mariza, Mísia e Zeca Afonso.