Saramago recorda momento difícil da doença no lançamento de "A Viagem do Elefante"
Lisboa, 03 Dez (lusa) - O escritor José Saramago, Prémio Nobel da Literatura, considerou hoje que "A Viagem do Elefante" é "um livro divertido", apesar dos momentos difíceis da doença que sofreu enquanto o escrevia.
"Este livro é divertido, muito mais divertido do que alguma coisa que eu tenha feito antes", afirmou o escritor, numa conversa no Centro Cultural de Belém com António Mega Ferreira e Manuel Maria Carrilho, e perante uma plateia quase cheia.
O escritor, distiguindo com o Prémio Nobel da Literatura em 1998, manifestou-se mesmo surpreendido por ter conseguido que a obra não tenha reflectido o momento difícil que passou.
"Durante uma semana ou duas estive entre cá e lá", disse, revelando que às vezes não estava nada consciente do que se passava à sua volta e que chegou a ver na sua mente um fundo negro, com quatro pontos brancos.
Saramago confessou ainda que disse à mulher, Pilar: "suspeito que não acabarei o livro".
E acrescentou com humor: "Porque é que uma pessoa que está à morte se preocupa em acabar ou não acabar o raio do livro?"
"Foi provavelmente este livro que o salvou", sugeriu Manuel Maria Carrilho, depois do escritor ter contado como durante o período de recuperação retomou com ânimo a obra que deixara quase um ano antes com apenas 40 páginas.
Saramago contou que a ideia para o livro lhe surgiu há uns anos, quando foi a Salzburgo para uma palestra e acabou num restaurante chamado "O Elefante". Soube então que houve um elefante que teve de fazer uma longa viagem pela Europa de Lisboa a Viena, depois de ter sido oferecido pelo rei D. João III ao arquiduque da Áustria Maximiliano II (seu primo).
"Os dados históricos cabem numa página, o resto é pura invenção", resumiu o Nobel da Literatura.
Para Saramago, o leitor é levado pelo enredo e também pela linguagem.
"É um livro bastante cervantino, como se eu fosse um aprendiz de Cervantes", referiu, apontando que conseguiu liberdade na escrita "quando estava reduzido a um farrrapo".
"Não sei como lá cheguei", disse o escritor, que logo no início da sessão ouviu Mega Ferreira elogiar um livro que o "surpreendeu, emocionou e comoveu".
"Este é um dos maiores livros da sua carreira literária", disse Mega Ferreira que indicou um "triângulo virtuoso" na obra de Saramago composto por "Memorial do Convento", "O Ano da Morte de Ricardo Reis" e "A Viagem do Elefante".
Saramago acabaria depois por afirmar que apesar de não gostar de classificações dos seus livros, tem um "carinho especial" por "Todos os Nomes" e adiantou que o seu próximo livro poderá ser bastante pessimista.
Ainda sobre "A Viagem do Elefante", que chegou às livrarias há cerca de um mês, o autor reiterou que pode ser visto como uma "metáfora da vida humana", mas sublinhou que nunca teve a tentação de dar ao animal sentimentos humanos ou de lhe atribuir frases.
Para José Saramago, "A Viagem do Elefante" "podia ser uma história das Mil e uma Noites".
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