"Spartacus" completou 100 anos

Completa hoje um século de existência o lendário Kirk Douglas, celebrizado pelo desempenho de papéis como o de Spartacus ou o de Vincent van Gogh. Na vida real, Douglas foi decisivo para derrotar a "lista negra" que o macartismo tinha imposto em Hollywood.

RTP /
DR

Issur Danielovitch, de seu nome, nasceu numa família de imigrantes judeus russos muito pobres. Em Nova Iorque, desde cedo teve de arcar com parte das responsabilidades pelo sustento próprio e das suas seis irmãs. Trabalhou nos biscates mais diversos, desde ardina a lutador de greco-romana, passando depois ao Exército, mobilizado durante a Segunda Guerra Mundial.

Mais tarde começou a estudar para actor, mas em toda a fase inicial continuava a debater-se com dificuldades materiais a tal ponto que chegou a provocar a sua própria detenção pela polícia, para não ter de dormir ao relento.

Estreou-se em 1949, interpretando a personagem de um pugilista em "O ídolo de barro", que foi grande sucesso de bilheteira e lhe valeu uma nomeação para o Óscar. Na carreira artística adoptou o nome Kirk Douglas.

Em 1956 interpretou o papel de Vincent van Gogh num filme de Vincent Minelli. A tal ponto se identificou com a personagem do genial pintor que assimilou parte da sua loucura e viu ameaçado o seu próprio equilíbrio psicológico.

Nos anos seguintes actuou em vários westerns, com grande sucesso. A autoconfiança de Douglas fez dele um dos interlocutores mais difíceis da indústria cinematográfica. Recusou-se a assinar um dos contratos-tipo de Hollywood, que colocava o ou a artista na dependência da produtora durante sete anos. Ao recusar fazê-lo, ficou colocado perante a necessidade de criar a sua própria produtora e não recuou diante desse salto num vazio que assustava a maioria dos seus contemporâneos.

Como produtor, contratou realizadores que toda a gente considerava um tiro no escuro, mas que vieram a revelar-se escolhas altamente judiciosas. Com um deles, Stanley Kubrick, teve conflitos no limite da violência física.

Mas, já depois desses conflitos, continuou a confiar-lhe projectos que considerava decisivos, como foi, em 1960, o caso de "Spartacus". Como produtor, Douglas contratou Kubrick; como actor e protagonista do filme, colocou-se sob a direcção de Kubrick.
Citação de Kirk Douglas

"Fiz mais de 85 filmes, mas Spartacus é aquele em que tenho mais orgulho"

Além disso, fez deste filme clássico o cenário para um braço de ferro com o senador Joseph McCarthy, que tinha incluído na sua famigerada lista negra o guionista Dalton Trumbo. Este encontrava-se havia quase uma década sem poder assinar com o seu nome.

Foi contratado por Douglas para escrever o guião de Spartacus e voltou a assinar, desafiando assim a "caça às bruxas" anticomunista. Para a vitória ser mais completa, o guião foi universalmente aplaudido como uma obra prima. Entre as cenas clássicas do filme inclui-se aquela em que os escravos capturados pelas legiões romanas se recusam a identificar o gladiador Spartacus, chefe da sua rebelião, e gritam, um após outro: "Spartacus sou eu".

A vitória de Douglas sobre a lista negra foi o toque de finados para o macartismo em Hollywood.

Em 1974, a produtora de Douglas lançou o também clássico "Voando sobre um ninho de cucos", com Jack Nicholson no protagonista. O filme foi distinguido com cinco óscares.

Em 1991, despenhou-se um helicóptero em que seguia com sua mulher, Anne Buydens, e morreram vários passageiros. O casal, contudo, sobreviveu, apesar das graves queimaduras que sofreu Kirk. No ano passado, já com 99 anos, fez uma doação de 37 milhões de dólares a uma fundação que se propõe apoiar artistas atingidos por Alzheimer.
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